Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade

Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 15, 1-26, e021012, jan./dez. 2021 • ISSN 1984-9834

Artigo original • Revisão por pares • Acesso aberto

Ocupações de Terra e Políticas Agrárias no Estado do Rio de Janeiro: a trajetória do assentamento de Campo Alegre (Nova Iguaçu e Queimados)

Land Occupations and Agrarian Policies in the State of Rio de Janeiro: the trajectory of the rural settlement of Campo Alegre (Nova Iguaçu and Queimados)

Álvaro Mendes Ferreira[1]

Resumo

Durante meados da década de 1980, o assentamento de Campo Alegre, hoje repartido entre os municípios de Queimados e Nova Iguaçu, foi promovido pelo estado do Rio de Janeiro como projeto-piloto de reforma agrária. Apesar de sucessos iniciais, esse projeto ambicioso logo se desarticulou tanto no âmbito comunitário quanto no estatal. Este artigo pretende entender por que não se concretizaram as grandes ambições para Campo Alegre, traçando um histórico microrregional denso a partir do estudo sistemático das fontes documentais existentes, sobretudo as produzidas pelos órgãos burocráticos especializados. Do lado da organização popular, enfatizamos a pouca articulação com outros movimentos sociais, dificuldade de gerir bens coletivos, dependência de lideranças personalistas e falta de tradição agrícola dos assentados. Do lado do estado, situação fundiária cartorialmente complexa, leitura voluntarista que equacionava os ocupantes em Campo Alegre aos movimentos de posseiros anteriores ao Golpe de 1964, inconsistência nas políticas públicas agrárias e cooptação de lideranças populares.

Palavras-chave: Reforma Agrária; Regularização fundiária; Assentamento rural; Rio de Janeiro; Comissão de Assuntos Fundiários; Igreja católica; mutirões; sem terra.

Abstract

During the mid-1980s, the rural settlement of Campo Alegre was promoted by the State of Rio de Janeiro as a springboard to land reform. After striking initial results, the ambitious project stalled at both community and state levels. This article tries to understand why that happened, establishing a dense microregional historic approach from the analysis of the documental sources, especially those written by state agencies. On the community side, we highlight poor articulation with other mass organizations, bad management of common goods, dependence on personalistic leaders and lack of peasant traditions. On the state side, complex issues with previous land deeds, wishful thinking by bureaucrats who saw the occupants under the lights of prior rural conflicts, unclear agrarian policies and co-optation of popular leaders.

Keywords: Land reform; land regularization; land settlement; Rio de Janeiro; Comissão de Assuntos Fundiários; Catholic Church; communal work groups; landless peasants.


Submissão:
23 nov. 2020

Aceite:
06 ago.. 2021

Publicação:
17 set.. 2021

Citação sugerida

FERREIRA, Álvaro Mendes. Ocupações de Terra e Políticas Agrárias no Estado do Rio de Janeiro: a trajetória do assentamento de Campo Alegre (Nova Iguaçu e Queimados). Revista IDeAS, Rio de Janeiro, v. 15, p. 1-26, e021012, jan./dez. 2021.

Licença: Creative Commons - Atribuição/Attribution 4.0 International (CC BY 4.0).


Introdução, fontes e metodologia

Campo Alegre abarca aproximadamente 2.000 hectares nos municípios de Queimados e de Nova Iguaçu. Predominam lotes agrícolas de três hectares, de baixa produtividade, embora se veja estrutura fundiária mais fragmentada e perfil mais urbano nos trechos onde se apresentam aglomerados de casas e pequenos comércios. A atual configuração do território de Campo Alegre deriva em boa medida dum movimento popular organizado para ocupação de terras improdutivas que se endereçou àquela região em 1984. Poucos meses após a ocupação, em meio a graves conflitos com grileiros, o Governo do Estado do Rio de Janeiro passou a tutelar Campo Alegre a fim de regularizar a situação fundiária dos ocupantes e a promover o assentamento como modelo para um programa de reforma agrária fluminense. Contudo, o estado nunca foi capaz de cumprir nenhuma das promessas: em fins da década de 1980, o declínio da produção agrícola em Campo Alegre era flagrante, e até hoje os moradores esperam ter os lotes regularizados. Entender as razões dessa reversão de expectativas é a principal intenção analítica deste artigo.

A trajetória de Campo Alegre presta-se, ademais, ao debate sobre quatro grandes problemáticas: 1) o loteamento periférico, que esteve na raiz das dificuldades de se sanar a questão fundiária; 2) a retomada dos movimentos sociais e das ocupações rurais em começos da década de 1980; 3) a tendência à desmobilização comunitária e à cooptação política tão logo se suprime a ameaça de despejo; e 4) sobretudo a incapacidade do estado fluminense, mesmo nos órgãos especializados, para implantar de forma eficiente e eficaz uma política fundiária, agrária e habitacional.

Embora a ocupação de Campo Alegre e seus desdobramentos tenham sido aflorados em trabalhos acadêmicos (p. ex.: NOVICKI, 1992; NOVICKI, 1995; MACEDO, 2009), persiste ainda a carência dum histórico mais sistemático e abrangente. Por chocante que possa parecer, há deficiência muito grande nos estudos sobre a história da Baixada Fluminense, ou seja, da periferia da segunda metrópole do país. Ainda se depende muito dos excelentes artigos escritos por geógrafos durante as décadas de 1950 e 1960. Pela exaustiva pesquisa em fontes primárias, cremos que o artigo supre essa lacuna no âmbito da história regional, ou antes, microrregional. Nesse sentido, este trabalho pretende servir, sobretudo, como apoio a estudos mais aprofundados. Há no texto um teor antes factual e cronológico do que analítico e diacrônico, mas o leitor perceberá algumas linhas condutoras na história do assentamento de Campo Alegre: organização popular muito dependente das lideranças e do estado além de pouco articulada com outros movimentos sociais, dificuldades na gestão dos bens coletivos e na lida agrícola, políticas públicas que oscilam do entusiasmo triunfalista ao pleno descrédito dos assentados, incapacidade burocrática em superar os impasses fundiários e tendência a cooptar politicamente as lideranças populares. Essas linhas condutoras costumam ser observadas noutros assentamentos rurais e, mutatis mutandis, urbanos, de forma que os estudos históricos poderão ajudar na construção ou na complementação de modelos (p. ex.: SANTOS, 1981) que expliquem a recorrência tanto da desmobilização popular após a atração do estado quanto de políticas fundiárias fracassadas.

Como se perderam os arquivos do Mutirão de Campo Alegre, as principais fontes documentais encontram-se no Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro (Iterj), órgão sucessor da Comissão de Assuntos Fundiários (CAF), e no Arquivo da Mitra Diocesana de Nova Iguaçu. Há, portanto, um forte viés para discursos institucionais como relatórios técnicos e planos de ação, mas tanto o Iterj quanto a Mitra conservam documentos produzidos pelo próprio Mutirão como volantes, informativos e estatutos. O grosso da documentação reporta-se à década de 1980 e possui clara correlação com o nível de participação institucional: assim, os arquivos da Mitra minguam de chofre após meados de 1984 quando a Igreja perde o lugar de principal parceira dos sem-terra em favor do Estado, o qual, por sua vez, deixa de produzir e recolher documentos sobre Campo Alegre em fins da década de 1980 conforme o assentamento vai saindo da pauta das políticas públicas. Nenhum dos dois arquivos possui inventários ou catálogos, mas me esforcei em identificar, até onde possível, os documentos por sua tipologia, título, data, autoria e localização. Durante as décadas de 1980 e 1990, a Mitra recolheu também diversos recortes de jornais que noticiavam sobre Campo Alegre. Muitos desses jornais, como O Pontual e O Jornal de Hoje, por sua circulação meramente municipal, não se encontram disponíveis sequer na hemeroteca da Biblioteca Nacional. Para a história fundiária da gleba, lancei mão de estatutos das Fazendas Reunidas Normandia, registrados na Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro (Jucerja), bem como de mapas do seu loteamento guardados no Arquivo Nacional,[2] certidões imobiliárias, prospectos, anúncios de jornal, opúsculos, os processos administrativos, além de literatura especializada.

De grande valia foi a consulta às entrevistas que o Curso de Pós-graduação de Desenvolvimento Agrário da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA) realizou em 1991 com lideranças, técnicos e burocratas envolvidos com o assentamento de Campo Alegre.[3] Nessas entrevistas, é perceptível uma forte crítica (e, às vezes, autocrítica) às políticas adotadas na década anterior, algo que se manifesta só muito rara e tardiamente nos relatórios técnicos. Após meros sete anos, o contraste entre uma visão otimista inicial e uma memória pessimista pelos mesmos agentes levou-me a qualificar a política pública para Campo Alegre como voluntarista, uma vez que diversos entraves ao sucesso do assentamento se podiam detectar desde o início (e, em certos casos, de fato foram detectados, como a baixa fertilidade do solo ou o minifundismo). Embora este artigo não pretenda resolver a questão, o voluntarismo é um dos traços recorrentes das políticas fundiárias fluminenses (o clientelismo eleitoral, sobretudo no âmbito urbano, é outro), portanto a multiplicação de estudos de caso minuciosos permitirá entender melhor por que o Estado tem dificuldade em traçar objetivos e ações mais realistas, aperfeiçoando talvez sua participação.

Este artigo originou-se do laudo histórico escrito em 2018 como um dos produtos do mais recente processo de regularização fundiária. Suplementando a pesquisa documental, estive por diversas vezes em Campo Alegre, estabeleci contatos com moradores e com instituições que os apoiam e, em maio, junho e setembro de 2018, em colaboração com a antropóloga Hermínia Castro, entrevistei uma agrônoma, uma funcionária ligada à Comissão Pastoral da Terra nova-iguaçuana, três casais de lavradores e duas moradoras, todos envolvidos com Campo Alegre desde os primórdios do assentamento (tais entrevistas estão disponíveis dentro do âmbito do Projeto Memórias do Iterj).

As fontes foram submetidas ao método crítico tradicional na historiografia (TOPOLSKI, 1976, p. 220-226; p. 431-432): como alguns documentos não são datados, tive de aplicar a crítica externa (p. ex.: referências a eventos ou a governos, timbres, instrumento de grafia etc.); quanto à crítica interna, isto é, a de testemunhos, guiei-me pela hierarquia de intencionalidade das fontes – assim as atas de reunião do Mutirão na diocese nova-iguaçuana refletem melhor as dissensões internas sobre a ocupação do que os discursos externos ou programáticos como declarações à imprensa ou estatutos, nos quais tende a prevalecer o consenso ou a opinião das frações vitoriosas. Onde não pude decidir-me pela versão histórica mais acertada, optei por registrar as diversas perspectivas, o que, em certos casos, é bastante revelador da dinâmica social. Algumas meadas – sobretudo, a tentativa de deslegitimação de Laerte Bastos como liderança imputando-lhe crime – pareceram-me tão confusas e, ademais, registradas apenas por uma impressa local claramente a serviço dum jogo político bem rasteiro que sequer me aventurei a explorá-las a despeito do seu grande interesse para os processos de construção e desconstrução de lideranças populares na transição para a democracia. Para não carregar o texto, referências às fontes, ao contrário da literatura secundária, serão feitas em notas de rodapé.

Breve histórico fundiário de Campo Alegre

A área hoje ocupada por Campo Alegre remonta à formação do vasto Morgado de Marapicu em 1772 (MACHADO, 2016; MACHADO, 2019). Em 1911, o conde Modesto Leal, uma das maiores fortunas da República Velha, adquiriu essas terras, que já então conheciam uma fazenda denominada Campo Alegre. Em 1927, Modesto Leal incorporou as terras com seu rebanho de 3.500 bovinos e vendeu-as às Fazendas Reunidas Normandia, dirigida por outro plutocrata, Guilherme Guinle, presidente das Docas de Santos[4].

As Fazendas Reunidas Normandia operavam como sociedade anônima e visavam não só à agricultura e à pecuária, mas também ao loteamento agrícola.[5] A parte imobiliária passou logo a ser gerida pela Companhia de Expansão Territorial, que todos os domingos punha à disposição dos interessados um trem de luxo especial partindo da estação terminal da Central e, de Queimados, um ônibus.[6]

Apesar dos loteamentos da Normandia, a área de Campo Alegre permanecia pouco ocupada, pois essa zona não fora tocada pelo ciclo das laranjas que dinamizou a agricultura de Nova Iguaçu entre cerca de 1920 e 1940. Na região mais oriental do município, portanto, as grandes propriedades não se retalharam em chácaras citricultoras. À crise da laranja, porém, sucedeu-se a partir da década de 1950 um grande movimento de loteamento suburbano em Nova Iguaçu, favorecido por ampliação da malha rodoviária e por interesses dos próprios municípios da Baixada Fluminense em aumentar receitas (SOUSA, 1993; SEGADAS SOARES, 1962). Já em 1954 dois geógrafos exprimiam o loteamento suburbano como “certamente a atividade mais lucrativa na esfera rural da Baixada da Guanabara” (GEIGER; SANTOS, 1954, p. 304).

Em 1952, Ernesto Moreira, grande fazendeiro e dono de açougues e postos de gasolina, lança o Bairro Campo Alegre sob auspícios da Corretora de Operações Imobiliárias (Coper).[7] Tratava-se de titânico loteamento suburbano, cujo número de unidades nas fontes é variável, embora o mais corrente sejam 23.333 lotes. Nas propagandas veiculadas em jornais, enfatizavam-se facilidades viárias (“40 minutos da Praça Mauá”, isto é, do Centro carioca), instalações elétricas e até telefônicas, rios retificados e dragados e, muito significativo para os hesitantes, “4 tratores com Scrapers e 5 plainas (tudo próprio)” que “garantem a pronta abertura do restante das ruas ainda não terminadas e a sua conservação futura.”[8] Dispunha-se de dois ônibus próprios para transporte de possíveis compradores.[9] A própria prefeitura nova-iguaçuana incentivou a supressão do espaço rural ao editar em 1957 um Decreto-Lei mudando o zoneamento local para urbano. Em Campo Alegre, como alhures, um grande chamariz era a compra do lote como investimento, sobretudo pelos prazos curtos e sem juros.[10] Um bordão explicitava as possibilidades especulativas: “Se na Coper um terreno comprou, o seu capital dobrou.”[11]  O investimento em imóveis, mesmo terra nua, foi durante muito tempo estratégia válida, mesmo entre os remediados, para se proteger da depreciação inflacionária. A tirar pelas escrituras, muitos compradores viviam em bairros cariocas bem estruturados como Cachambi, Laranjeiras, Catete e Ipanema, portanto visavam aos lotes decerto como investimento puro e simples, não como local de moradia. A modicidade favorecia essa estratégia. Por volta de 1954, o lote de 420 m² custava 20.000 cruzeiros e, o de 360 m², 16.000 cruzeiros.[12] A essa altura, o salário mínimo mensal era de 2.400 cruzeiros. Apesar de diversos lotes vendidos, o empreendimento malogrou, provavelmente por sua posição por demais periférica: a Coper faliu, os compradores edificaram poucas casas ou mesmo nenhuma, as poucas ruas abertas, geralmente sem asfalto, ficaram por se ocupar.[13]

Essa situação fundiária nevoenta favoreceu a grilagem por pecuaristas.[14] Donos dos pequenos lotes comprados da Coper que efetivamente se instalaram teriam sido hostilizados pelos grileiros, que dessa forma puderam mais folgadamente expandir seus pastos.[15] Em certo caso, o pecuarista comprara vinte lotes mas passou a ocupar área cinquenta vezes superior.[16] A opção pela pecuária extensiva, menos que determinada por vantagens locacionais, atendia mais a uma estratégia fundiária barata para proteger terras improdutivas contra intrusos, preservando-as para futuras especulações imobiliárias (SMRACZÁNYI, 1990, p. 79). Os poucos dados de que dispomos para a relação entre reses e área para começos da década de 1980 confirmam a impressão geral do predomínio da pecuária extensiva, mesmo se atentando para as pastagens ruins: nos 70 hectares da Fazenda Santa Bárbara, que veio a se ocupada, pastavam 200 cabeças de gado, ou seja, uma relação de 2,8 bois por hectare;[17] os 250 hectares dum fazendeiro das imediações comportavam mais de 500 bovinos, logo, 2 bois por hectare.[18] Os índices talvez fossem até mais baixos, pois os pecuaristas poderiam estar inflando o rebanho. Além da pecuária extensiva, havia atividades extrativistas como retirada de grama em placas, areia de emboço e lenha em metro.[19]  Outra estratégia, embora em menor escala, para reduzir chances de intrusão foi o plantio de eucalipto, como ainda hoje se pode ver na Fazenda Cabuçu ao longo da estrada Mato Grosso. Durante a Ditadura Militar, sobretudo após o Código Florestal de 1967, o Governo Federal deu incentivos ao plantio de eucaliptais como meio de contornar a classificação dos latifúndios como improdutivos.

A ocupação de Campo Alegre 

Com a Abertura política a partir de 1979, diversos conflitos fundiários latentes durante a Ditadura Militar voltaram a emergir. A grave crise econômica, que perdurou ao longo de toda a década de 1980, e a expectativa de eleições diretas para governador em 1982 promoveram ocupações de terra como tática de pressão para demandas fundiárias (SIGAUD, 2008: 107). Embora tivessem ocorrido esporadicamente nos anos anteriores ao Golpe de 1964, sobretudo no noroeste gaúcho e na Baixada Fluminense, as ocupações de terra difundem-se como ato politicamente organizado apenas nos anos 1980 a partir do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro (GRYNSZPAN, 2009, p. 39; ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 1992, p. 97). No caso fluminense, pelo seu perfil marcadamente citadino, as primeiras ocupações sob a Abertura são de natureza urbana.

No âmbito rural, um importante marco no movimento de ocupações de terra ocorreu em agosto de 1983, nos terrenos da Companhia América Fabril, em Xerém, distrito de Duque de Caxias. Embora se tratasse dum complexo industrial, inclusive com vila operária, a gleba possuía tamanha área que conservava setores baldios. A ocupação criou enormes contratempos ao governo de Leonel Brizola, do Partido Democrático Trabalhista (PDT), que começara meses antes. Com a empresa têxtil falimentar e o principal credor o Banco do Brasil, a área ingressaria no patrimônio federal e, portanto, se temia no Palácio Guanabara que Brasília tomasse o ato como provocação, indispondo ainda mais o poder central contra o opositor estado do Rio.[20]  Parte dos ocupantes foi remanejada para Italva, onde o estado possuía fazenda experimental.

Contudo a ocupação em Xerém empalideceu diante dos eventos que se sucederam em Campo Alegre. Desde meados de 1983, discutia-se entre lavradores de Parque Estoril, uma tentativa de ocupação malsucedida, a legitimidade de tomada de terras improdutivas e buscavam-se áreas propícias.[21] Na noite de 9 janeiro de 1984, diversas famílias, vindas de ônibus e caminhões, ocuparam Campo Alegre, os homens instalando-se sob barracas de lona esticadas entre árvores, mulheres e crianças numa dilapidada sede de fazenda como medida de segurança.[22] A quantidade de famílias é difícil de se estimar. O número mais frequentemente citado de 300 famílias às vezes dobrava ou, como se criticava numa discussão interna a lideranças contra a inflação populacional deliberada, descia a 100;[23] ora se falava mesmo em apenas 300 pessoas, ora em mais de 700 lavradores.[24] O mais provável é que os números tenham flutuado, decrescendo a partir da ocupação conforme as dificuldades se assomavam e, após a melhoria das condições em meados do ano, expandindo-se.

Entre as primeiras medidas dos ocupantes em Campo Alegre, estiveram roçados, poços d’água, sumidouros para esgoto e um loteamento preliminar entre dois e três hectares.[25] Rusgas e tensões com os pecuaristas foram frequentes desde o começo, com queimas de barracos, ameaças de morte, intimidação por capangas armados e mesmo tiros como os disparados por um coronel reformado da Polícia Militar e seus jagunços. Quando não ameaçados diretamente, os lavradores sofriam com as devastações nos cultivos pelo gado que andava solto, procedimento que se tornou mais usual após os grileiros se aperceberam do malogro da violência mais explícita.[26] Na 55a Delegacia Policial de Queimados, as queixas só encontravam escárnio, a ponto de os lavradores acusarem a Polícia Civil de dar “cobertura às violências dos grileiros” enquanto a Polícia Militar estorvava a entrada de posseiros e alimentos no acampamento.[27] Também se mencionam o pouso dum helicóptero do Exército, do qual saíram dois soldados, e a aparição dum carro verde-oliva.[28] Numa Baixada assolada por esquadrões da morte e “polícia mineira”, não surpreende o conluio de policiais nessas manobras intimidatórias. Um dossiê registrou nada menos que 22 ameaças e violências contra os lavradores entre janeiro e junho de 1984.[29] As lideranças protegiam-se camuflando os nomes sob números, truque provavelmente aprendido na experiência de Partido Comunista que alguns tinham, como Bráulio Rodrigues. Ante as condições drásticas de vida nos primeiros dias, mulheres e crianças foram enviadas para casas de amigos e alguns ocupantes até mesmo desistiram de todo.[30] A fim de se gerir a imensidão de terras, a ocupação dividiu-se em seis regionais, que viriam mais tarde, cada qual, a dispor de sede e diretorias próprias eleitas localmente.

Sob a égide da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da diocese de Nova Iguaçu, o apoio da Igreja Católica foi vital para a sobrevivência nesses primeiros momentos da ocupação, quer por fornecer alimentos, colchões, cobertores, foices, enxadas e sementes; quer por implantar uma cozinha industrial; quer por denunciar abusos de grileiros e jagunços; quer por ajudar na organização coletiva.[31] A Igreja Católica nova-iguaçuana destacava-se desde a década de 1960 como bastante alinhada às preocupações sociais propugnadas pela Teologia da Libertação, em parte graças ao bispo D. Adriano Hipólito, que chegou a sofrer represálias físicas pela linha dura (MAINWARING, 1986). Outro apoio importante foi dado pela prefeitura de Nova Iguaçu que, entre 1983 e 1988, era então também capitaneada pelo PDT, o que deve ter favorecido o envolvimento do Executivo estadual.[32]

Apesar de o governo do estado ter sido contatado poucos dias após a ocupação, o discurso oficial enfatizou apenas o compromisso em evitar o despejo e a violência contra os ocupantes. Essa orientação, aliás, já vinha sido adotada pelo governo Brizola em favelas. O próprio secretário executivo da Comissão de Assuntos Fundiários (CAF) entre fevereiro de 1984 e fevereiro de 1986, Edgar Ribeiro de Sousa, admite que inicialmente inexistia qualquer diretriz senão “evitar o despejo” e lembra que a própria CAF só foi criada um ano após o começo do governo.[33] Documentos contemporâneos ratificam a evasão inicial da CAF no caso de Campo Alegre, limitada a questões de segurança: “Em reunião com a Comissão de Assuntos Fundiários, ficou evidenciado o interesse do Governo Estadual em somente conter a violência ficando a responsabilidade de manutenção ou não dos camponeses em Campo Alegre para a Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu.”[34] Outra diretriz governamental era “prestigiar a autonomia do movimento”, isto é, chancelar decisões tomadas pelos próprios ocupantes, mesmo quando colidissem com pareceres técnicos.[35] Embora notificada da iminência duma ocupação, os burocratas que viriam a integrar a CAF ignoravam o lugar e, portanto, sequer em tese poderia dirigir os trabalhadores para região com mais aptidões agrícolas ou menos fontes de complicações jurídicas.[36]

O melhor exemplo da nula interferência estatal nesses primeiros meses de 1984 vemos no loteamento, planejado e executado pelos próprios ocupantes. Os lotes restringiram-se a 3 hectares (cem metros de testada por trezentos de fundos). Num primeiro momento, pensou-se em superfícies de 4,5 hectares, mas pesou a favor de lotes menores a perspectiva de se beneficiar mais gente, cuja manifestação extrema foi a proposta de lotes com cem metros por cinquenta – meio hectare.[37] Esse minifundismo exagerado pode ser entendido também como tática para assegurar a posse da terra pelo adensamento demográfico.[38] Não está claro acaso se vislumbrava que o assentamento rural poderia fracassar ao se promover empresas agrícolas inviáveis. As medições eram feitas de forma rudimentar, com uma corda de náilon de cem metros. Não se ateve ao solo nem à topografia de forma que certos lotes ou ocuparam solos degradados pela retirada de areola ou tiveram áreas reduzidas pelas declividades.[39] Um técnico viria a observar que lotes nessa dimensão numa região como Campo Alegre são inviáveis para qualquer coisa além da subsistência e que, em vez de atender a reivindicação do Mutirão, o estado deveria ter planejado o loteamento e remanejado o excedente demográfico.[40]

A intervenção do estado

Pressionando em junho de 1984 com passeata da Central do Brasil até o Palácio Guanabara, os ocupantes obrigaram o governo a tomar uma resolução sobre o conflito em Campo Alegre. Entre as três opções oferecidas inicialmente – remanejá-los para Italva, no Norte Fluminense; para outra propriedade estadual; ou mantê-los em Campo Alegre – prevaleceu a permanência na zona ocupada.[41] No mesmo dia da passeata, em gesto teatral, foi sobre uma batata-doce de monstruosos sete quilos, colhida em Campo Alegre, que Brizola assinou o Decreto no 7.351. Como a reforma agrária cabia exclusivamente ao Governo Federal, o estado teve de se valer do subterfúgio da desapropriação para criação de centros urbanos ou de fazendas experimentais conforme lhe facultava o Decreto-Lei no 3.365, de 1941. Expedientes assim – além arrecadação de terras públicas e compras – foram usuais durante a década de 1980 quando os estados assumem sobre o Governo Federal o protagonismo nas problemáticas fundiárias rurais sem, contudo, dispor ainda do arcabouço legal (MEDEIROS; LEITE, 2009, p. 10).

A partir do Decreto no 7.351, Campo Alegre torna-se durante certo tempo a menina dos olhos da política agrária fluminense. Dentro da ambição de Brizola em se afirmar como a principal liderança da esquerda brasileira, Campo Alegre também pode ser visto como peça de propaganda para realçar o comprometimento brizolista com a reforma agrária. Antes de tudo, retomava o papel destacado que Brizola, em começos dos anos 1960 como governador do Rio Grande do Sul, encarnou nessa frente ao apoiar os agricultores que ocuparam Nonoai e ao criar o Instituto Gaúcho de Reforma Agrária (Igra). Em segundo lugar, pelo gigantismo e pela localização sensível de Campo Alegre, às margens da segunda metrópole nacional. É bastante ilustrativo mencionar que de 1970 a 1997 no Rio Grande do Sul, onde a agricultura desempenhava papel muitíssimo mais relevante do que em terras fluminenses, apenas dois entre 132 assentamentos superaram Campo Alegre em área ou em famílias (NAVARRO; MORAIS; MENESES, 2009). A insistência dos relatórios na afirmação do assentamento como “modelo” vai no sentido da sua instrumentalização política como possível alavanca para uma disputa presidencial (NOVICKI, 1992, p. 12). Relatórios governamentais explicitam essa intenção de transformar Campo Alegre em assentamento modelar: “O ponto de partida (‘despegue’) do processo de desenvolvimento agrícola, no Estado do Rio de Janeiro, está intimamente ligado ao sucesso do Projeto Campo Alegre, como instrumento de Reforma Agrária.”[42] Outros objetivos subsidiários eram a criação dum cinturão verde para abastecer o Grande Rio e a contenção da favelização retornando o imigrante ao campo (mote este, aliás, presente já no Plano Agrário fluminense de 1959).[43]

Realmente grande quantidade de projetos e de recursos foi destinada a Campo Alegre nos primeiros anos, alguns com vistas a atividades de maior valor agregado que suplantasse as restrições dos pequenos lotes como criação de abelhas e de cabras leiteiras e beneficiamento de fitoterápicos.[44] Em 1985, reproduzindo a experiência em Nova Aurora, ocupação urbana capitaneada por Laerte Bastos em 1981, prometeu-se um projeto-piloto para construir 20 casas, pagas em 48 prestações de 10% do salário mínimo. Ao cabo, pretendia-se atender todos os lavradores com 500 moradias.[45] Financiaram-se adubos e maquinário, a se quitar com a entrega de parte da produção naquilo que se conhece como “sistema troca-troca”.

Por outro lado, a participação da Igreja Católica declina abruptamente a partir da atração oficial do estado para Campo Alegre. Se, em janeiro de 1984, a diocese nova-iguçuana fez-se presente no acampamento treze vezes e outras três vezes em órgãos estatais, em agosto, o mês seguinte ao decreto desapropriatório, só se teve na pauta uma reunião com os lavradores, cancelada aliás. De setembro a dezembro, apenas se registram visitas.[46] O afastamento tampouco foi evitado pela Igreja, uma vez que o próprio bispo D. Adriano Hipólito defendia a autonomização dos movimentos sociais após os apoios iniciais (MAINWARING, 1986, p. 85-86). Ainda assim, a diocese enveredou em parcerias menos ostensivas, pois a presença significativa dum clero italiano em Nova Iguaçu parece ter sido instrumental em contatar a Acra (Associazione di Cooperazione Rurale in Africa e America Latina), organização não governamental peninsular que atuava já em Nova Aurora e que viria a desenvolver projetos e cooperativa em Campo Alegre.[47]

O entusiasmo estatal distorceu a interpretação mais realista sobre a dinâmica social por trás da ocupação em Campo Alegre. Ao contrário dos conflitos fundiários da Baixada Fluminense durante as décadas de 1950 e 1960, quando a ocupação de terras era promovida por camponeses posseiros sob ameaça de despejo, em Campo Alegre predominavam citadinos, muitos oriundos mesmo de Nova Aurora, em Belford Roxo. É significativo que na própria diretoria do mutirão, eleita nos primórdios da ocupação, entre os nove membros quatro não se declarassem lavradores (um alfaiate, um técnico químico e dois pedreiros).[48] A experiência agrícola, quando existia, muitas vezes remontava à infância – portanto sem que se fechasse o ciclo completo de sociogênese para a árdua lida rural – e, como muitos provinham do Nordeste, a contextos diversos: o verão era às vezes chamado de inverno, pois tal conceito lá correspondia à estação chuvosa; e perseverou-se em lavouras de subsistência pela recordação da agricultura nordestina, que, todavia, operava em superfícies muito mais generosas que os meros três hectares, a exigir cultivos e técnicas mais intensivas. No contexto de crise agudíssima por que passava o Brasil e o Rio em particular, da qual a onda de saques em setembro de 1983 foi apenas um dos sintomas, a vinda para o campo desses trabalhadores urbanos – ou antes, desempregados, biscateiros e aposentados – apontava para expectativas de melhor alicerçar a precária subsistência que não encontravam mais na cidade. Alguns inclusive fugiam da violência que campeava pelas cidades baixadenses.[49] Como regra, não tinham o propósito, pois, “de recriar um ‘modo camponês’ de vida, mas de alcançar alternativas de sobrevivência mais estáveis” (MEDEIROS; BENEDETTI; SOUSA, ALENTEJANO, 2009, p. 141). A própria escolha duma área dentro da região metropolitana – preferência que se repetiu em ocupações posteriores –, próxima a vias expressas que a punham em contato com os centros urbanos, em vez de latifúndios em zonas marcadamente rurais do interior fluminense, caminha bem no sentido dum projeto de vida rurbano, no qual o trabalho agrícola, limitado ao fim de semana, complementaria a renda obtida em atividades citadinas ao mesmo tempo que a moradia campestre proporcionaria amenidades inacessíveis em meio ao caos urbano das periferias. Num volante sem data, mas que pelo teor se presume dos começos da ocupação, o que se enfatiza como chamariz é a moradia: “VENHA FAZER UMA CASA PARA VOCÊ.”[50] A inadequação para a lida agrícola transparece em ocupações similares: das 33 famílias remanejadas de Xerém para Italva em 1985 apenas três permaneceram após alguns anos.[51] O perfil e as metas divergentes das encontradas em suas experiências de origem no Sul fizeram com que o MST qualificasse os ocupantes como lúmpens, inaptos para a agricultura, e sustasse por alguns anos sua militância pelo Rio (MEDEIROS; BENEDETTI; SOUSA; ALENTEJANO, 2009, p. 141). Só tardiamente, em fins da década de 1980, é que emerge ocasionalmente nos relatórios burocráticos a percepção de que os agricultores de Campo Alegre apresentavam características bem peculiares e que o fenômeno da ocupação era mais complexo. Esse é um ponto importante, pois concorda com a impressão que emerge doutros documentos contemporâneos à fase mais ativa do apoio estatal em Campo Alegre: a máquina burocrática fez uma leitura irrealista sobre a natureza da ocupação e, por conseguinte, não aplicou as melhores políticas.

Mesmo a rápida resolução do conflito fundiário pela intervenção estadual revelou-se mera aparência. O decreto desapropriatório, que abarcava 3.500 hectares, continha não só alagadiços, morros íngremes e outros terrenos impróprios à agricultura como também a área demarcada desde 1975 para o Distrito Industrial de Nova Iguaçu.[52] Esse seria pormenor de retificação, mas a imissão de posse em favor do estado, segundo passo rumo à regularização fundiária, foi complicada pelo malogrado loteamento da Coper. Conforme vimos, havia a previsão de nada menos que 23.333 lotes e a desapropriação integral só teria efeitos legais após o estado identificar todos os proprietários dentro da área do decreto e indenizar-lhes um a um. Grandes proprietários, quase sempre empresas como a Companhia Siderúrgica Nacional, entraram com ações judiciais de indenização por apossamento administrativo; aos pequenos só restou esperar a resolução pela lenta via burocrática.[53]

A produção agrícola e a organização do assentamento

A incorporação de Campo Alegre como assentamento estadual teve o efeito positivo de eliminar as violências dos grileiros. A pacificação favoreceu o incremento da lavoura com arroz, feijão, maxixe, quiabo, feijão, milho, aipim, batata-doce e, em pequenos trechos, olerícolas.[54] Em outubro de 1984, colhiam-se semanalmente 10 sacas de arroz, 120 quilos de quiabo, 50 de milho, 60 de feijão e cultivavam-se 120 hectares de aipim.[55] Ao fim de 1984, a área efetivamente explorada era de 204 hectares, estando 100 arados.[56] Como se vê, enfatizaram-se gêneros de subsistência, sobretudo o aipim que responderia por mais da metade da superfície cultivada. A essa altura, um levantamento computava 300 famílias em lotes de três hectares, 100 em “terras de emergência” com 1 hectare, bem como a existência de cinco áreas coletivas (50 hectares ao todo), logo uma ocupação efetiva de 1.050 hectares.[57] Após quase um ano, o fato de menos de 25% de a área estar cultivada aponta certa deficiência de meios.

Diversos contratempos ambientais e sanitários assolaram os lavradores. Por conta do relevo plano predominante, bem como dos diversos rios e riachos, houve inundações. Desconhecia-se a influência que as comportas da Cedae na contígua adutora do Rio Guandu poderiam provocar nas enchentes. Os recursos hídricos estavam poluídos com dejetos orgânicos e industriais, inclusive metais pesados como chumbo e cromo.[58] Todos os oitos poços que abasteciam as residências, as escolas e os postos de saúde apresentavam alta contaminação por coliformes fecais.[59] O solo era medíocre, empobrecido e acidificado pela pecuária, do que o predomínio do capim-rabo-de-burro era um sintoma.[60]

Experimentou-se com a agricultura coletiva. Grupos de dez lavradores exploravam áreas de 10 hectares, devendo-se dar pelo menos três dias de trabalho semanal. Havia cinco desses lotes coletivos.[61] A participação nos coletivos não estava atrelada à posse dum lote privado, do qual se excluíam os solteiros, mas sim apenas à filiação como sócio do Mutirão de Campo Alegre. Feita a colheita, o coletivo escolhia o vendedor conforme preços previamente determinados e rateavam-se os ganhos, sendo proibida a venda individual. O colaborador podia ser expulso do coletivo por maioria simples de votos.[62] Laudos governamentais apontavam que a exploração coletiva seria capaz de comportar 10.000 pessoas, ao passo que a individual abarcaria a metade desse número ou mesmo só 2.000 pessoas, caso os lotes fossem expandidos a dimensões mais adequadas.[63] É difícil avaliar acaso se trata duma avaliação realista. Lideranças e movimentos rurais durante a década de 1980 enfatizavam a exploração coletiva, muitas vezes em colisão com os desejos campesinos, não raro ideando uma chocadeira alternativa ao individualismo capitalista. O próprio MST, a partir de 1988, tendeu a superestimar a produção coletiva sobre a familiar (NAVARRO; MORAIS; MENESES, 2009, p. 51-52). Certos relatórios governamentais encamparam a perspectiva coletivista, pressupondo tal nível de conscientização de classe a ponto de inexistir o risco de os lavradores reproduzirem relações de assalariamento e mesmo vislumbrarem a chance de lucros com a venda da terra: “Sendo fundamentalmente um grupo antiespoliação, promotor da eliminação da exploração do homem do campo, é evidente que aos camponeses de Campo Alegre não interessará se transformarem em exploradores e especuladores em substituição à classe dos ‘terratenientes’ que ocupavam a Fazenda.”[64] A melhor prova de que tal visão tinha pouco fundamento sociológico foi o cabo de guerra que se travou pelos assentamentos rurais na década de 1980 acerca do tipo de título fundiário a ser outorgado, o estado favorecendo a cessão de posse enquanto os lavradores desejavam a propriedade (NOVIKCI, 1995, p. 66, 71).

O fato é que relatórios de 1986 dão as explorações coletivas como fracassadas.[65] O ideal coletivista, refletido na própria insistência com que as associações reivindicavam para si o nome de “mutirões”, não logrou sobreviver às tarefas mais imediatas da ocupação. Para Vítor Novicki (1992, p, 52-153), tratam-se muito mais de “‘mutirões de ocupação’ e não para a exploração da terra”. Nesse mesmo sentido também vai Marcelo Ernandez Macedo para quem a palavra “mutirão” no Rio de Janeiro dos anos 1980 se traduz como “forma acampamento”, ou seja, uma estratégia de apossamento da terra (2007, p. 473-474). Tão logo desaparecem as violências e as ameaças de despejo, começa um paulatino processo de desmobilização comunitária, modelo que encontra sua contraparte nos estudos sobre lutas contra as remoções urbanas (SANTOS, 1981).

O desconforto com a pauta coletivista deve explicar a incomum abertura do estatuto da Associação de Produtores Agrícolas de Campo Alegre, escrito em 1986: “uma sociedade em que são capitalistas [grifei] os associados e cuja finalidade é o benefício de todos eles, quer pela redução de preços, objetos de consumo, quer pela facilitação de empréstimos”.[66] Tão cedo quanto julho de 1984 transpiravam na cúpula dirigente do Mutirão sugestões de reduzir o trabalho obrigatório nas terras coletivas a um só dia por mês, o que equivalia na prática a abandonar essa alternativa.[67] Seja por erro, seja por má-fé, reclamou-se de mutirões tocados em áreas particulares, o que obviamente constituía uma forma de apropriação do trabalho alheio.[68] Malograram mesmo tentativas posteriores de colaboração mais frouxas, como cooperativas. Havia dificuldade em se admitir a lógica dos bens coletivos: não se contentavam que o caminhão da cooperativa, que todo sábado partia para feira, custasse menos que o carreto de atravessadores, pois se queria que o frete fosse grátis;[69] um trator arruinou-se por se desconsiderar a depreciação.[70]

Nesse quadro, não espantaria o papel relevantíssimo que lideranças locais assumiram na condução da política interna do assentamento. A chefia do movimento prendia-se mais a figuras com tradição em lutas fundiárias, algumas anteriores mesmo a 1964, do que propriamente a sindicatos ou a organizações mais estruturadas como a Federação dos Trabalhadores Agrícolas (Fetag) e o Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), embora houvesse certo contato com o Núcleo Agrícola Fluminense. O apoio sindical parece ter sido quase nulo e talvez não tenha passado do encorajamento por escrito.[71] Pequenas doações monetárias foram feitas por diretórios regionais de entidades católicas.[72] Duas lideranças destacam-se: Laerte Resende Bastos e João Bastos, sobretudo o primeiro (Bráulio Rodrigues ajudou na ocupação como membro da CPT, embora admita não ter liderado) (SILVA, 2008, p. 66).

Laerte Bastos, antigo militante do Partido Comunista Brasileiro, tinha histórico que remontava aos anos anteriores à Ditadura Militar, quando presidiu o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Duque de Caxias. Mais recentemente, a partir de 1981, havia sido figura de proa na ocupação urbana de Nova Aurora e nos projetos locais de mutirões para moradia. Numa sociedade como a brasileira, em que tradicionalmente o grau de organização popular é baixíssimo, sobretudo após a experiência cerceadora da Ditadura Militar, uma vivência de militância predispunha à liderança, ainda mais numa figura carismática. E o fato de ter franqueado em maio de 1983 as portas do Palácio Guanabara, para discutir com Brizola, outra figura carismática, as demandas de Nova Aurora, favorecia-o ainda mais como o canal elementar entre Campo Alegre e o estado. Contudo, justamente pelo limitado número de pessoas aptas a comandar, a cooptação política e a cultura do mandonismo produziram distorções. Já em 1986, Laerte Bastos disputou, sem êxito, vaga na Constituinte pelo PDT e, em 1988, elegeu-se vice-prefeito de Nova Iguaçu. Bem mais grave que a absorção da principal liderança dentro da máquina partidária governamental, foi sua atuação como cabecilha em Campo Alegre, que um técnico italiano qualificou como “política típica de coronel”.[73] Entre tais práticas estariam a convocação arbitrária de reuniões em Acampamento ao contrário doutras regionais que se reuniam no primeiro sábado de cada mês; o loteamento duma área coletiva de 60 hectares sob alegação de que certo projeto não vingara; e mesmo a remoção para sua própria casa dos equipamentos do posto de saúde após perder eleição na regional de Acampamento.[74] Bem cedo, em meados de 1984, se ouviam críticas internas de que a comissão organizada pela diocese nova-iguaçuana seguia demais as diretrizes de Laerte Bastos.[75] Sociólogos holandeses já haviam identificado traços clientelísticos na ocupação de Nova Aurora (GILHUIS; VOLBEDA, 1992, p. 135).

De João Bastos louvava-se a competência como administrador rural, mas se lhe censurava certo poder intimidatório.[76] Ao perder eleição na sua regional, teria criado associação paralela. Teria exercido controle draconiano sobre a posse dos lotes ao banir todo aquele que dele se ausentasse por meros três dias para o ceder aos inscritos numa lista de espera (que poderia ser obviada mediante suborno).[77] Aliás é difícil discernir quanto nessas acusações há de incompreensão pelos lavradores sobre a gestão do patrimônio coletivo. Acusou-se, por exemplo, os presidentes regionais de açambarcarem cada um dos sete tratores ainda funcionais, que passaram a ser guardados em suas casas e a ter o uso condicionado ao pagamento duma taxa.[78] Ora, a cobrança visaria cobrir a depreciação do maquinário e a guarda na casa dos presidentes poderia ser mero expediente de segurança. Aqui, outra vez, se percebe que a míngua de experiências em gestões coletivas favorecia quer a apropriação dos bens públicos pelas lideranças, quer a desconfiança generalizada entre os camponeses sobre as intenções das lideranças.[79] Em suma, pouca coisa propiciava gestões democráticas e transparentes. A isso se acrescente o ar viciado pela violência, que, já no primeiro ano, ceifou vidas de lideranças, oficiais de cartório e grileiros, tecendo enredos sinistros onde se cheira intriga política.[80]

O abandono pelo estado e a desmobilização comunitária

Em março de 1985 a área de Campo Alegre foi expandida pela ocupação dos cerca de 350 hectares da Fazenda Boa Vista em Marapicu. Sem fazer parte do loteamento da Coper, a fazenda não deixou de estar no alvo de empreendimentos imobiliários, pois em 1981, por meio de convênio, a prefeitura de Nova Iguaçu apresentou ao Banco Nacional de Habitação (BNH) áreas que entendia adequadas a projetos habitacionais.[81] Uma das justificativas para a ocupação estaria em que “sendo o mesmo de propriedade do BNH, era também do povo e, portanto, deles”.[82] Diferentemente da ocupação de 1984, aqui o apoio de igrejas protestantes (neopetencostais?) predominou. Ao se tornar a sétima regional de Campo Alegre, Marapicu, pela posição excêntrica, sofreu menos influência das lideranças dominantes no resto do assentamento e teve evolução mais autônoma.

Ante os novos desdobramentos em Marapicu e as inconveniências de se incluir zonas impróprias à agricultura, em fevereiro de 1987, nas últimas semanas do primeiro governo Brizola, editou-se o Decreto no 9.635 reduzindo a área exproprianda de 3.500 para 2.059 hectares. A posse de Moreira Franco como governador em março de 1987 não beneficiou o assentamento. Como se enfraquecera a organização do movimento pelo assistencialismo estatal e houvera forte identificação com o brizolismo, Campo Alegre submergia das atenções governamentais pouco a pouco. De fato, entre 1987 e 1991, as ocupações, urbanas e rurais, pelo estado teriam diminuído, senão mesmo cessado. A própria papelada burocrática referente a Campo Alegre reduz-se bastante (ressalvadas as dificuldades de datação). Um zootecnista vergastou: “ações paternalistas do Estado, desenvolvidas, até então, por governos passados, junto aos Assentamentos Rurais no Estado do Rio de Janeiro, criaram um dependência das comunidades em relação aos seus meios de desenvolvimento.”[83] Que a relação das lideranças com a gestão de Moreira Franco não deve ter sido das melhores transpira numa carta endereçada a Brizola nas vésperas de assumir o segundo mandato em 1991 na qual se fala que: “Depois de longo e tenebroso inverno que passamos sob a égide do desgoverno passado, nossas carências aumentaram.”[84] Em princípio, poder-se-ia tratar de mera estratégia pragmática de lisonjear os poderes constituídos, ainda por cima demonizando o governo anterior, mas há bastantes indícios de vínculos e simpatias pelo brizolismo.

Em todo o caso, mesmo entre apoiadores dentro do primeiro governo Brizola acabou surgindo o entendimento de cooptação involuntária, cujo principal reflexo teria sido o ensimesmamento do movimento. Como avalia Osvaldo de Oliveira, “as lideranças de Campo Alegre estavam preocupadas com os de Campo Alegre, mas não com os sem-terra do Estado [...]. Não aglutinava os sem-terra, discutia com eles e daí analisava uma fazenda e ia ocupar. Foi totalmente o inverso”.[85] Ou ainda, segundo o então secretário executivo da CAF, “o nível de organização e de politização do movimento não aumentou, não cresceu e isso submeteu esse movimento a uma dependência relativamente grande do governo.”[86] Assim, paradoxalmente, ao prestigiar a “autonomia do movimento” cumprindo-lhes liberalmente as vontades, inclusive contra orientações técnicas, o estado escureceu o horizonte de lutas. De fato, desde as origens, o movimento de ocupação em Campo Alegre tendia a lutas setorizadas, desvinculadas de organizações classistas ou políticas, quer pela organização em torno de lideranças carismáticas, quer pela dependência inicial perante a CPT, organismo que o sociólogo Cândido Gryzbowski julgava demasiado “basista” (1987, p. 69). Assim, o estado representou apenas mais um aliado que inconscientemente contribuiu para que os assentados em Campo Alegre afrouxassem ligações com frentes de luta mais amplas, compostas por atores com interesses organicamente confluentes. Embora estudiosos vejam as ocupações de terra de começos da década de 1980 como parte dum movimento reivindicatório mais amplo (MACEDO, 2009, p. 11), é bem claro que em Campo Alegre rapidamente se desarticulou qualquer perspectiva de lutas para além do âmbito local.

Por volta de 1989, cinco anos após o início do assentamento, o cenário era desolador. Promessas de energia elétrica para começos de 1986 eram repetidas. Estimava-se que apenas 20% dos posseiros fossem originários. As escolas e o posto de saúde foram fechados. Tampouco se aplicaram projetos de irrigação, o que teria viabilizado lavouras de mercado na estação seca que suprissem a entressafra da Região Serrana.[87] Um técnico lastimou que a própria capacidade organizativa dos lavradores estivesse esvaindo-se: “As reuniões são vazias e improdutivas, não há ata, o acerto de contas é feito por alto. Nessas reuniões os problemas discutidos são poucos.”[88] O próprio Vicente Loureiro, subsecretário da Seaf, resumiu o desconsolo: “Campo Alegre é um exemplo de como não se deve fazer um assentamento. Não basta oferecer terras e tratores. É preciso orientar os lavradores. Eles não sabem usar nem o caminhão que cedemos para o escoamento dos produtos, que, quase sempre, é desviado para fazer mudanças fora da área ou transportar pessoas para o futebol de domingo.”[89]

Alguns problemas vinham desde os primórdios da ocupação, muitos provocados pela inação do estado. Um ótimo exemplo foi o colapso do financiamento troca-troca. Não foram os lavradores os inadimplentes, antes o estado não foi cobrar o seu quinhão nas colheitas: os alimentos estocados pelos camponeses apodreceram à espera de que alguém os viesse recolher. Sequer houve notificação para dispensar os agricultores da dívida.[90] Isso ocorreu logo nos primeiros meses, no primeiro prazo de pagamento. Entretanto, na ótica do estado, o fracasso do sistema troca-troca parece ter sido atribuído menos à desídia estatal que à falta de tradição agrícola dos assentados (NOVICKI, 1992, 154).

A alta rotatividade dos posseiros e a existência de várias ocupações derivadas de Campo Alegre – Guandu, Sol da Manhã, Mutirão da Fé e Vila Cláudia, por exemplo[91] – apontam que parte do problema que se apresentava como agrário provavelmente tinha mais a ver com uma estratégia alternativa a contornar o problema da habitação popular, no mais resolvido pela favelização. A grande mobilidade estaria assim vinculada menos à “busca de terra fértil”, como colocou em meados de 1985 certa liderança duma ocupação em Sepetiba (cerca de 130 famílias ou 500 pessoas, a maioria vinda de Campo Alegre), do que às diversas conjugações possíveis na região metropolitana entre emprego–moradia–transporte.[92] Noutros termos, encarou-se como agrário um problema basicamente urbano que buscou escapatória no meio rural. Uma análise muito perspicaz nesse sentido foi feita na Seaf apenas em 1987: “O sucesso de uma política agrária passa necessariamente pela consolidação de uma estrutura produtiva das comunidades, sem o que estaremos tão somente transferindo para área rural um problema típico do contexto urbano, a busca de espaço para abrigo de populações carentes, incapazes de serem integradas ao mercado de trabalho formal.”[93] A única ressalva a se fazer aí é que o estado não estava “transferindo para área rural um problema típico do contexto urbano”; o problema é que se transferiu por conta própria e o estado teve dificuldades em destrinchá-lo e adotar as políticas adequadas.

Naturalmente havia gente com aptidões agrícolas como bem o demonstra a farta produção dos tempos iniciais e como ainda hoje o demonstram certos camponeses, muitos deles idosos e surpreendentemente vigorosos. Até meados da década de 1990, sem dúvida o impasse na regularização fundiária foi importante fator de declínio agrícola, pois, sem um título válido, o crédito rural era vedado aos lavradores. A inoperância de projetos de assistência contribuiu no declínio do potencial produtivo. Em pleno ano 2000 ainda se carecia de irrigação, situação que não mudou até hoje.[94] Provavelmente o minifundismo impediu a aplicação de certos projetos, como o de caprinocultura leiteira, que pressupunha lotes entre 10 e 15 hectares, ou seja, o triplo ou quíntuplo do usual em Campo Alegre.[95] Por outro lado, ignorou-se quão costumeiro é o abandono dos lotes em projetos de reforma agrária, mesmo em contextos em que os beneficiários possuem sólida tradição agrícola. Na reforma tocada no sul da Itália após a Segunda Guerra Mundial, apenas 20% dos jornaleiros (braccianti) que receberam terras conseguiram estabelecer-se como agricultores plenos (WARRINER, 1969, p. 9-413). Em Campo Alegre, portanto, de partida era de se esperar taxas mais altas ainda de abandono não como sintoma dum fracasso em si, mas como consequência inexorável do próprio processo de reforma agrária.

Em 25 de fevereiro de 1991, no apagar das luzes do governo Moreira Franco, editou-se o Decreto no 16.326, que, pela terceira vez, versava sobre desapropriação. A lentidão não é exclusiva de Campo Alegre. Entre os 15 decretos estaduais desapropriatórios de áreas rurais a partir de 1984, só dois chegaram a termo até 1991, isto é, indenizou-se o proprietário e o estado imitiu-se na posse (NOVICKI, 1992, p. 134). Em 1996, na iminência da caducidade do decreto de 1991 pelo decurso de cinco anos, outro decreto, o quarto, de no 22.016, anulou o anterior e exigiu novo levantamento, pois haveria áreas já incorporadas ao patrimônio estadual por aquisição onerosa.[96] A confusão na qual se metera o estado aparece não só nessa sucessão de decretos, mas no fracasso das tentativas de desapropriação amigável que, em 1987 haviam produzido 342 processos administrativos indenizatórios. Em 1994, subiriam para 464 e, em 2002, contavam-se 607 num total de 9.779 lotes[97].

Durante quase todo esse período os agricultores estiveram bastante desmobilizados. Embora haja registros de participações de Campo Alegre em passeatas pela reforma agrária, elas parecem restringir-se aos anos iniciais de ocupação.[98] Somente a iminência da caducidade do Decreto no 16.326 parece ter estimulado maior combatividade entre os lavradores, que, em setembro de 1996, emulando tática do MST, ocuparam os escritórios da Seaf, situada então no Palácio Guabanara, o que rendeu audiência com o governador Marcelo Alencar. Na semana seguinte, o dignitário visitou Campo Alegre, com mais promessas de desapropriação. Os lavradores ouviram com ceticismo, pois já haviam sido advertidos pelo próprio governador sobre os magros recursos. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Japeri foi mais direto ainda ao fulminar: “O discurso do governador é igual ao de todo político. Ele não definiu uma política agrícola para o estado e está empurrando com a barriga as nossas reivindicações.” Para o diretor do Mutirão de Campo Alegre, Alencar só estaria “‘cozinhando’ os sem-terras.”[99] Ainda assim, aproveitaram o ensejo para entregar lista de demandas.[100] Quais demandas eram essas não sabemos, pois o documento não veio parar no arquivo do Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro (Iterj), o órgão sucessor da Seaf: provavelmente se perdeu pelo labirinto burocrático.

Em 1990, Queimados emancipou-se e Campo Alegre ficou repartida entre esse novo município e Nova Iguaçu. Isso propiciou a elaboração de políticas municipais discrepantes perante o agro local. Os órgãos estaduais vinham, desde fins da década de 1980, trabalhando junto à prefeitura nova-iguaçuana pela reversão de Campo Alegre ao enquadramento como zona rural.[101] Mas, se em Queimados a Lei no  135 de 1/8/1994 isentou e remiu os assentamentos quanto ao Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), o plano-diretor de Nova Iguaçu em 1997 simplesmente suprimia todo o zoneamento rural, que só foi restabelecido em 2008. Por conta das dívidas com o município, a Caixa Econômica Federal, proprietária de Marapicu como sucessora do BNH, cedeu as terras para que a prefeitura nova-iguaçuana assumisse a regularização fundiária, criando assim em 2009 o primeiro assentamento rural municipal do país.

Como em muitas regiões agrícolas da Baixada Fluminense, cada vez mais, o lote se restringe à moradia ou mesmo é transacionado para veraneio. Em 1998, nada menos que 29,6% dos 631 lotes foram tidos como inaptos à titulação pelo estado, isto é, estavam abandonados ou ocupados por gente sem perfil agrário de baixa renda. As superfícies agricultadas oscilavam então de 63% na regional de Fazendinha a meros 15% na de Mato Grosso.[102]

A drástica diminuição de material referente a Campo Alegre nos arquivos do Iterj testemunha que o estado decidiu resolver a questão pela inação. Hoje, além da insuficiente agricultura, aqueles que fugiram do caos urbano também são afetados pelos mesmos problemas. Em Mato Grosso, a proximidade de bandidos instalados no Conjunto da Marinha, levou certos moradores a abandonarem os lotes. Em Marapicu, a situação seria até mais crítica. Céticos em relação aos canais estatais convencionais, algumas lideranças e moradores têm buscado mais recentemente parcerias com outras instituições, entre elas a faculdade de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Por força do Inquérito Civil no 1.774/2008 e do Processo no 2008.00158050, o Ministério Público intimou o Iterj a concluir a regularização fundiária de Campo Alegre. Para tal, celebrou-se em 2017 o contrato com uma empresa paulista de aerolevantamento no valor de R$ 2.400.000 envolvendo serviços topográficos, cadastrais, diagnósticos ambientais e socioeconômicos, pesquisa fundiária entre outras tarefas necessárias à regularização. Em face do longo período de posse mansa e pacífica, o instrumento previsto é a usucapião. Em visitas a campo em 2018, contudo, muitos moradores nos demonstraram ceticismo e mesmo desconfiança quanto a essa nova promessa de regularização fundiária. De fato, em meados de 2019 o contrato com a empresa, que já executara alguns serviços, foi suspenso por inadimplência do estado. Alguns moradores temem que o título de propriedade permita a implantação de loteamentos urbanos, para os quais haveria poderosos interesses da prefeitura de Queimados. Desses interesses ouvimos ecos quando certos moradores nos perguntaram se realmente era a prefeitura quiemadense a responsável pela nova iniciativa de regularização fundiária. Desnecessário dizer que é difícil vislumbrar os loteamentos orientados por diretrizes de bom urbanismo. O loteamento suburbano periférico na década de 1950 parece enfim próximo a se concretizar.

Conclusões

O caso de Campo Alegre – com quatro decretos desapropriatórios, nenhum deles levados a termo, e agora com um contrato de licitação suspenso – é exemplar das dificuldades de o estado brasileiro e o fluminense em particular em implementar uma política agrária e fundiária consistente. A bem dizer, a regularização fundiária nem deveria ser considerada por si como política social, uma vez o poder estatal pressupõe o controle registral sobre os imóveis que compõem o seu território. A incapacidade em definir uma política de regularização fundiária global permite, portanto, que a regularização seja acenada a grupos mais vulneráveis conforme o jogo de interesses políticos. Pode ser assim instrumentalizada como grande conquista (ainda mais por operar com as ideias de casa própria e de propriedade tão caras às classes populares brasileiras), quando concretamente nada se oferece além dum papel, o registro imobiliário. Isso se torna mais óbvio quando não se atrela a regularização fundiária a nenhum projeto mais amplo de política agrária ou habitacional. A trajetória de Campo Alegre é bastante ilustrativa nesse ponto.

Fica claro que as ações do estado não se pautaram numa política pública, consistente e plurianual, mas sim segundo as conveniências tópicas dos diversos governos. Mesmo quando o estado se comprometia como parceiro, tal qual sob o primeiro governo Brizola, a chancela acrítica das decisões tomadas pelos ocupantes em Campo Alegre não deixava de mascarar paradoxalmente uma relação assimétrica. Ora, se o estado dispunha de instâncias técnicas e se pretendia colaborar na construção do assentamento e, mais ainda, dum projeto-piloto de reforma agrária, era de se esperar diálogo e negociações constantes entre as aspirações locais dos ocupantes e as diretrizes públicas gerais. A isso se soma certo voluntarismo por técnicos e agentes políticos sobre Campo Alegre, cuja raiz, aliás, começa pela própria incapacidade de se identificar que, menos que uma luta por terra agrícola, a ocupação de 1984 representava uma luta por moradia e por estratégias alternativas à vida nas degradadas cidades baixadenses. Por voluntarismo estamos chamando aqui talvez impropriamente um fenômeno mais complexo, cujas implicações pretendemos explorar noutro trabalho sobre as políticas públicas agrárias no estado do Rio durante a década de 1980. Aparentemente persistiram nos burocratas e nos quadros técnicos lugares-comuns sobre a questão agrária cujos fundamentos, embora em certo nível pertinentes ao contexto da década de 1950 e de começos da seguinte, haviam sido radicalmente alterados, ao menos para o estado fluminense, no processo de modernização conservadora promovido pela Ditadura Militar. A persistência desse imaginário anterior ao Golpe de 1964 tem seu emblema máximo na figura de Brizola, que significativamente lutou em vão para se apossar da sigla do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e escolheu o Rio de Janeiro, que já não era mais a principal metrópole, como palanque político para um projeto de âmbito nacional.

Quando Campo Alegre deixou de ser interessante para o discurso do poder – sob Moreira Franco pelo vínculo com o brizolismo, sob o segundo Governo Brizola pelo reconhecimento de que a questão agrária no Rio se havia tornado bastante secundária perante a urbana –, o assentamento submerge das atenções estaduais senão quando, esporadicamente, se fazem esforços para resolver a mais elementar das questões: a fundiária. Se, para o estado, a incapacidade de construir e suster uma visão sobre políticas fundiárias, agrárias e habitacionais no máximo produz constrangimentos aos altos burocratas quando confrontados com os resultados de sua gestão, para aqueles que participam da luta como principais interessados uma perspectiva pouco ampla e consistente costuma se reverter, cedo ou tarde, apenas em vitórias parciais.

Agradecimentos

Agradecemos aos funcionários do Arquivo da Mitra Diocesana de Nova Iguaçu, em especial a Antônio Lacerda, e, no CPDA, à Lúcia, que nos ajudaram muitíssimo com as consultas. Para as entrevistas, foi vital a colaboração de Hermínia Castro, antropóloga do Iterj.

Referências bibliográficas

Fontes primárias

Arquivo do Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro (AI)

Curso de Pós-graduação de Desenvolvimento Agrário da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA)

Arquivo Nacional (AN)

Arquivo da Mitra Diocesana de Nova Iguaçu (AMNI)

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Periódicos

A Batalha, Rio de Janeiro; Beira-mar, Rio de Janeiro; Correio da Lavoura, Nova Iguaçu; Correio da Manhã, Rio de Janeiro; O Dia, Rio de Janeiro; Diário Oficial da União, Rio de Janeiro; Jornal de Hoje, Nova Iguaçu; Jornal do Brasil, Rio de Janeiro; Jornal do País; O Jornal, Rio de Janeiro; O Pontual, Nova Iguaçu.

Bibliografia secundária

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Álvaro Mendes Ferreira

Historiador pela Universidade Federal Fluminense (UFF) (2007). Mestre em História pela UFF (2010). Doutor em História pela UFF (2017). Analista de Desenv. Agrário / Historiador do Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro.

E-mail: alvarofigueiro@yahoo.com.br

ID Lattes: http://lattes.cnpq.br/8781725954149004

Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 15, 1-26, e021012, jan./dez. 2021 • ISSN 1984-9834


[1]Historiador, Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro (Iterj). Membro do INCT Proprietas. Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Contato: alvarofigueiro@yahoo.com.br

[2] O Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS) recolheu plantas dos loteamentos das Fazendas Reunidas Normandia. De particular interesse é o cotado como BR.RJ.AN.RIO.04.0.MAP.0217.

[3] Exceto pelas entrevistas com Maurizio Ortu, de 1998, e com Mariela, de 1999.

[4] Diário Oficial da União, 27/0/1927, p. 135. Sobre problemas fundiários, cf. DANTAS, Luís Ascendino. A Normandia de Guinle Irmãos. Niterói: Vasconcelos Estabelecimentos Gráficos, [1935].

[5] Arquivo da Jucera, Escritura pública preliminar de constituição da sociedade denominada Companhia Fazendas Reunidas Normandia, 13/0/1927, fls. 3, verso: “O objetivo da Companhia é a exploração da propriedade Normandia para fins agrícolas e pastoris em todas as suas modalidades e compreenderá também a venda parcelada de glebas, lotes ou sítios bem como a exploração de qualquer indústria conexa com esses objetivos”.

[6] Beira-mar, 31/01/1931.

[7] Correio da Manhã, “Esclarecido o latrocínio da Rodovia Pres. Dutra”, 27/09/1961, p. 5. Essa matéria traz informações biográficas sobre Ernesto Moreira.

[8] Correio da Manhã, 23/11/1952, p. 5.

[9] O Jornal, 04/11/1953, p. 8.

[10] AI, cx. 37, Prospecto da Coper sobre o Bairro Campo Alegre.

[11] Correio da Manhã, 23/11/1952, p. 5.

[12] AI, Processo Administrativo E-25/000.074/99, Seaf, fls. 193-225.

[13] AI, cx. 28, Intervento agricolo nella zona di Campo Alegre, Associazione di Cooperazione Rurale in Africa e America Latina.

[14] Jornal do Brasil, “Vivaldo anuncia em Queimados: Fazenda será dos posseiros”, 20/07/1984. Jornal do Brasil, “Secretários se reúnem com posseiros instalados há 6 meses em Queimados”, p. 8. Noutras reportagens, nove ou doze é o número dos grileiros. Jornal do Brasil, “Brizola atende invasor de terra em Queimados”, 21/06/1984, p. 5; Jornal do Brasil, “Queimados faz reforma agrária com regras especiais”, 02/12/1984, p. 12.

[15] AI, cx. 25, Parecer jurídico, Benedito Rodrigues de Carvalho, assessor, Departamento Geral de Assuntos Jurídicos, Seaf, 08/04/1987.

[16] Jornal do Brasil, “Queimados faz reforma agrária com regras especiais”, 02/12/1984, p. 12.

[17] O Dia, “Fazendeiro diz que homens armados invadem suas terras”, 26/02/1984, p. 3.

[18] O Pontual, “Lixo em Campo Alegre continua ameaçando a represa do Guandu”, 21/01/1984.

[19] AI, cx. 28, Programa de Desenvolvimento Rural Integrado (PDRI), 2a Aproximação, 1986.

[20] CPDA, Rodolfo Pimenta Veloso Neto, ficha 7.

[21] Jornal do País, “Decreto de Brizola abre campo a lavrador”, 28/06-04/07/1984, p. 18 sgg; Jornal do Brasil, “Queimados faz reforma agrária com regras especiais”, 02/12/1984, p. 12.

[22] AI, cx. 28, Progetto Campo Alegre, 1985, “Alicerce” (Consolidamento); AI, Carta de Antônio Veiga de Freitas (Altântica, Proc. E-28/000.91/99), José do Vale Nunes (Cifra S/A, Proc. E-28/000.392/99) e Haroldo Ferreira de Azevedo (advogado agrário) a Fernando Lopes, Secretário Estadual de Urbanização, Habitação e Assentamentos Humanos, 09/10/1991; Jornal do Brasil “Famílias de lavradores invadem fazenda em Queimados”, 18/01/1984, p. 5.

[23] AMNI, Ata de reunião na Diocese, 27/06/1984

[24] Jornal de Hoje, “300 pessoas em desespero”, 21/01-23/01/1984, p. 4; Jornal do País, Yacy Nunes, “Decreto de Brizola abre campo a lavrador”, 28/06-04/07/1984, p. 18 sgg.

[25] Jornal do Brasil, “Famílias de lavradores invadem fazenda em Queimados”, 18/01/1984, p. 5; Jornal do Brasil, “Estado encampa problema dos invasores de Queimados”, 19/01/1984, p. 5.

[26] AMNI, Circular da Comissão de Campo Alegre, No 3, 07/06/1984.

[27] AMNI, Ata da reunião na Diocese, 04/07/1984.

[28] AMNI, Ata de reunião na Caritas Diocesana, 12/04/1984.

[29] Jornal do Brasil, “Queimados faz reforma agrária com regras especiais”, 02/12/1984, p. 12.

[30] Jornal do Brasil, “Estado encampa problema dos invasores de Queimados”, 19/01/1984, p. 5.

[31] AMNI, “As comunidades assumem o MCA”, circular da Caritas Diocesana, CPT etc., [janeiro ou fevereiro de 1984].

[32] AI, cx. 28, Intervento agricolo nella zona di Campo Alegre, Associazione di Cooperazione Rurale in Africa e America Latina.

[33] CPDA, Edgar Ribeiro de Sousa, p. 9.

[34] AMNI, Ofício 27/84, Secretaria Municipal de Serviço Público, Núcleo Santa Rosa, 07/05/1984 para o Mutirão Campo Alegre e Cáritas.

[35] CPDA, Edgar Ribeiro de Sousa, p. 7.

[36] CPDA, Almir Paulo de Lima, p. 6, 23.

[37] AMNI, Reunião na Caritas Diocesana, 12/04/1984. Também se sugeriram aí lotes de 110 por 100 metros. Dadas as dificuldades de medição, presumo que houve erro de digitação e as dimensões seriam de 100 por 100 metros, ou seja, um hectare.

[38] AMNI, Reunião diocesana, 30/05/1984. É posição de Bráulio Rodrigues da Silva.

[39] CPDA, Mariela, p. 5-6.

[40] CPDA, Osvaldo de Oliveira, p. 9-11.

[41] Jornal do Brasil, “Secretário anuncia três saídas para invasores de fazenda em Queimados”, 20/01/1984, p. 5;  Jornal do Brasil, “Brizola atende invasor de terra em Queimados”, 21/06/1984, p. 5.

[42] AI, cx. 28, Antônio Edno Amorim Magalhães, Linhas básicas para o Planejamento Global da Fazenda Campo Alegre: Análises Preliminares sujeitas à discussão, Caf, junho de 1985.

[43] Cf. o art. 1oº I, da Lei Estadual no N.951 de 24/06/1959.

[44] AI, cx. 28, Materiais diversos sobre o galpão de secagem de ervas medicinais e depósito de ferramentas.

[45] Correio da Lavoura, Mutirão de Campo Alegre recebe 100 milhões para construir casas”, 12-13/10/1985.

[46] AMNI, Compromissos da Diocese, dez. 1984.

[47] AI, cx. 28, Carta de D. Matteo Vivaldi, vigário-geral da Diocese de Nova Iguaçu, à Acra, 14/06/1985; Carta de Laerte Resende Bastos à Acra, 10/01/1986.

[48] AI, cx. 28, Relação da diretoria eleita do Mutirão de Campo Alegre em 22/02/1984.

[49] CPDA, Almir Paulo de Lima, fita 1, pp 20-21; fita 2, p. 1-2.

[50] AMNI, Volante.

[51] AI, cx. 6, Relatório final sobre Italva.

[52] Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu, Decreto noN1.413, 27/08/1975

[53] AI, cx. 27, Comissão PGE/SEAF (Processo E-14/36.168/87), Laudo técnico referente à identificação de áreas a serem desapropriadas; Cf. Ação de indenização por apossamento administrativo (desapropriação indireta), 07/12/1992.

[54] AI,  cx. 28, Programa de Desenvolvimento Rural Integrado de Campo Alegre: Plano Emergencial, 1986; AMNI, cx. Reforma Agrária ano 1983 a 1988, Circular da Comissão de Campo Alegre, noN3, 07/06/1984.

[55] Jornal de Hoje, “Secretários visitam Campo Alegre e firmam plano de emergência”, 11/10/1984, p. 3.

[56] Jornal de Hoje, “Projeto dará mais assistência aos lavradores de Campo Alegre”, 19/12/1984.

[57] AMNI, Circular da Comissão de Campo Alegre, no N, dez. de 1984.

[58] AI, cx. 28, Relatório, Fátima de F. Lopes, Soares Vieira Pereira, 29/0/1985; Feema, boletim de análise, 12/0/1985.

[59] AI, cx. 28, Secplan, notas de reunião, 21/0/1985.

[60] AI, cx. 28, Assentamento de Campo Alegre, Seaf; Empresa Brasileira de Pesquisa agropecuária, análise de solo, Regional Fazendinha, 22/0/1986.

[61] AMNI, Circular da Comissão de Campo Alegre, noN4, dez. de 1984.

[62] AMNI, Regimento interno dos coletivos, [1984].

[63] AI, cx. 28, Antônio Edno Amorim Magalhães, Linhas básicas para o Planejamento Global da Fazenda Campo Alegre: Análises Preliminares sujeitas à discussão, Caf, junho de 1985.

[64] AI, cx. 28, Antônio Edno Amorim Magalhães, Linhas básicas para o Planejamento Global da Fazenda Campo Alegre: Análises Preliminares sujeitas à discussão, Caf, junho de 1985, p. 29.

[65] AI, cx. 28, Programa de Desenvolvimento Rural Integrado de Campo Alegre: Plano Emergencial, 1986.

[66] AI, cx. 26, Estatuto da Associação de Produtores Agrícolas de Campo Alegre, 0/0/1986

[67] AMNI, Ata da reunião na Diocese, 0/0/1984.

[68] AMNI, Ata da reunião na Diocese, 0/0/1984.

[69] CPDA, Maurizio Ortu, p. 12.

[70] CPDA, Mariela, p. 10.

[71] AMNI, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Vassouras, 20/0/1984.

[72] AMNI, Carta de Adilar Daloté, secretário da CPT Regional Araguaia-Tocantisns, 18/06/1984; Carta do Centro de Estudos e Ação Social, 11/06/1984.

[73] CPDA, Maurizio Ortu, p. 2.

[74] CPDA, Maurizio Ortu, p. 2-4, 8.

[75] AMNI, Ata da reunião na Diocese, 04/07/1984.

[76] CPDA, Pedro de Oliveira.

[77] CPDA, Mariela, p. 2-3.

[78]  Jornal do Brasil, “Conflito de terra na Baixada”, 05/03/1989, p. 16.

[79] AI, cx. 25, Relação de patrimônio, Associação dos Camponeses e Produtores de Mato Grosso, 23/04/2000. Entre eles, uma grade de arrasto com?32 discos, um arado com 4 discos, um arado de tração animal, uma bomba de irrigação, um trator “que se encontra em poder do Sr. José da Silva Bastos”.

[80] Jornal de Hoje, “Líder camponês pode ter fim de prisão preventiva”, 19/01/1985; Jornal de Hoje,  “Advogada vê política em crime de Campo Alegre”, 17/01/1985; Jornal de Hoje, “Misteriosa morte de corretor”, 30/11/1984, p. 7.

[81] AI, cx. 35, Ofício de Mário Castorino Fontes Brito, diretor do Banco Nacional de Habitação, ao seu presidente, 26/04/1982.

[82] AI, cx. 35, Relatório de vistoria, 02/04/1985.

[83] AI, cx. 28, Eduardo Olivieri, zootecnista, Programa de Assentamentos Rurais do Governo do Estado do Rio de Janeiro (Pear), p. 2.

[84] AI, cx. 28, Propostas dos camponeses de Nova Iguaçu, 12/03/1991.

[85] CPDA, Osvaldo de Oliveira, p. 4.

[86] CPDA, Edgar Ribeiro de Sousa, p. 24.

[87] AI, cx. 28, Assentamento de Campo Alegre, Seaf.

[88] AI, cx. 35, Relatório, 03/01/1990.

[89] CPDA, Maurizio Ortu, p. 12.

[90] Comunicação pessoal com a agrônoma Mariela em 12/06/2018.

[91] CPDA, Pedro de Oliveira.

[92] Jornal do Brasil, “Posseiros brigam em Sepetiba”, 16/08/1985, p. 8.

[93] AI, cx. 28, Projeto de apoio aos assentamentos rurais, Seaf, 1987.

[94] AI, cx. 35, “Uso da água subterrânea na viabilização do abastecimento do assentamento rural de Marapicu, Nova Iguaçu, RJ”, geólogos Kátia Leite Mansur e Anderson Marques Martins, Departamento de Recursos Minerais, janeiro de 2000.

[95] AI, cx 28, Introdução da caprinocultura leiteira na Fazenda Campo Alegre, agosto de 1985.

[96] AI, Projeto de Legalização Assentamento Campo Alegre, junho de 1998.

[97] AI, Processo Administrativo E-25/000.074/99, Resolução Seaf no N de 0/0/1999, fls. 117.

[98] Jornal do Brasil, “Lavradores pedem terra em passeata”, 0/0/1985, p. 7; Jornal do Brasil, “Camponeses cobra do Incra e do Estado as terras que prometeram”, 23/0/1986, p. 24.

[99] Jornal de Hoje,  “Sonhando com a terra”, 15/10/1995, caderno Município, p. 1.

[100] Jornal de Hoje, “Produtores lutam pela terra”, 0/10/1995, caderno Município, p. 1.

[101] AI, cx. 25, parecer jurídico, Benedito Rodrigues de Carvalho, assessor, Departamento geral de Assuntos Jurídicos, Seaf, 0/0/1987.

[102] AI, cx. 37, Relatório.