Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade
Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 16, 1-24, e022002, jan./dez. 2022 • ISSN 1984-9834
Artigo original • Revisão por pares • Acesso aberto
Reflexões críticas acerca do desenvolvimento (in)sustentável
Critical reflexions on (un)sustainable development
Bárbara Cristina Kruse[1], Luiz Alexandre Gonçalves Cunha[2]
Resumo O conceito de desenvolvimento sustentável, munido da ideia de conciliar a economia e as aspirações humanas com a sustentabilidade, irradiou-se pelo mundo após 1987, com o relatório “Nosso Futuro Comum”. Ocorre que, desde então, nenhum avanço ambiental vislumbrou-se, muito ao contrário. A divulgação de que estamos na vivência de uma crise ambiental pela ultrapassagem da pegada ecológica do planeta é o que se propaga nos documentos científicos contemporâneos. Assim, este artigo objetiva analisar criticamente os pressupostos do desenvolvimento sustentável. Roga-se, então, por um novo paradigma que respeite a sustentabilidade do planeta. A metodologia de pesquisa utilizada é a exploratória qualitativa baseada na revisão de literatura e, também, nos documentos científicos ambientais recentes. A importância do escrito se dá para cientistas como um todo, eis que viver-se num ambiente ecologicamente equilibrado não ultrapassa tão somente uma projeção legal, mas como também interfere na qualidade de vida de todos os seres humanos. Palavras-chave: crise ambiental; pegada ecológica; recursos naturais; sustentabilidade; ecossocialismo. Abstract The concept of sustainable development, armed with the idea of reconciling the economy and human aspirations with sustainability, spread around the world after 1987, with the report “Our Common Future”. It so happens that, since then, no environmental advances have been glimpsed, quite the opposite. The disclosure that we are experiencing an environmental crisis due to the surpassing of the planet's ecological footprint is what is propagated in contemporary scientific documents. Therefore, this article aims to critically analyze the assumptions of sustainable development. Therefore, a new paradigm that respects the sustainability of the planet is requested. The research methodology used is qualitative exploratory based on literature review and also on recent environmental scientific documents. The importance of writing is given to scientists as a whole, as living in an ecologically balanced environment not only surpasses a legal projection, but also interferes with the quality of life of all human beings. Keywords: environmental crisis; ecological footprint; natural resources; sustainability; ecosocialism. | Submissão: Aceite: Publicação: |
Citação sugerida KRUSE, Bárbara Cristina; CUNHA, Luiz Alexandre Gonçalves. Reflexões críticas acerca do desenvolvimento (in)sustentável. Revista IDeAS, Rio de Janeiro, v. 16, p. 1-24, e022002, jan./dez. 2022. Licença: Creative Commons - Atribuição/Attribution 4.0 International (CC BY 4.0). |
Introdução
O presente artigo é pessimista quanto às questões ambientais. E, tal pessimismo se faz a partir da análise dos relatórios científicos mais recentes, como é o caso do Global Environment Outlook (GEO-6), lançado em 2019, e o Relatório Especial do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), de 2018. No site do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, de antemão menciona-se acerca do GEO-6:[3]
O relatório, produzido por 250 cientistas de mais de 70 países, afirma que se não ampliarmos drasticamente a proteção ambiental, cidades e regiões na Ásia, Oriente Médio e África poderão testemunhar milhões de mortes prematuras até a metade do século. A publicação também alerta que os poluentes em nossos sistemas de água potável farão com que a resistência antimicrobiana se torne a maior causa de mortes até 2050 e com que disruptores endócrinos afetem a fertilidade masculina e feminina, bem como o desenvolvimento neurológico infantil (2021, s.p).
Ainda há mais. O que se prescreve é que a “saúde humana ficará em apuros se ações urgentes não forem tomadas para proteger o meio ambiente, alerta o Relatório global da ONU” (PNMA, 2021, s.p). No aprofundamento do Relatório, dados negativos ficam ainda mais desesperadores e, em conjunto com o exposto no IPCC vislumbra-se o aumento entre 1,2 a 1,5º C da temperatura global. Tais projeções negativas, infelizmente, tendem a afetar não apenas os padrões ambientais (como o antropocentrismo imagina), mas também as áreas sociais e econômicas.
As projeções negativas ambientais interferem nos mecanismos metabólicos que garantem a subsistência humana, como é o caso do meio físico, da saúde humana, da água potável e da segurança alimentar. Além disso, afetam expressivamente o aprofundamento da situação de pobreza, eis que as populações mais prejudicadas são aquelas vulneráveis. É deste modo que este artigo pende para o pessimismo que se extrai do realismo quanto à situação que estamos vivenciando.
O fato é que há muito tempo já ultrapassamos a pegada ecológica terrestre, pegada esta que consiste numa forma de contabilizar a biocapacidade humana no planeta, ou seja, no cálculo do uso humano quanto aos recursos naturais da Terra, em face da sua capacidade de regeneração. Estudos científicos demonstram que precisaríamos de aproximadamente 1,7 planeta para recompor anualmente tudo o que é consumido (SCARPA. 2012). Em outras palavras, já se atingiu e se ultrapassou a capacidade regenerativa da Terra e em um horizonte próximo vislumbra-se a escassez dos recursos.
Diante da escancarada situação de crise ambiental vivenciada na contemporaneidade, o objetivo deste artigo é fazer uma análise crítica do conceito de desenvolvimento sustentável. Por tal desenvolvimento, pressupõe-se que o planeta conseguirá, de modo efetivo, atingir um ponto de equilíbrio desenvolvimentista com foco no social e no ecológico. Segundo Oliveira (2018, p. 190), o desenvolvimento “encontra-se muito bem associado às pessoas (capital humano), bem como na preservação de ecossistemas e da biodiversidade (capital natural)”.
Em que pese o ideal de desenvolvimento sustentável ser comovente, o que se analisa é a falta de tempo hábil para se chegar ao equilíbrio, eis que se apresenta no horizonte próximo a iminência do colapso. Isto posto, este artigo, a fim de ponderar sobre o objetivo proposto, reflete sobre os ideais desenvolvimentistas, em especial aquele sugerido pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) aos países da América Latina e o desenvolvimento sustentável propriamente dito, para depois, sob a vertente de oposição ao conceito analisar criticamente um paradigma ecológico necessário para a sobrevivência da espécie humana.
Por intermédio da revisão de literatura, a metodologia utilizada é a de abordagem qualitativa e da dialética. O escrito se faz importante para a reflexão da questão ambiental no século XXI, sobretudo em razão da experiência durante uma crise sanitária de grandes proporções. Por consequência, a compreensão do tempo vivenciado, se põe como crucial para os cientistas humanos, sociais e políticos, particularmente para as contradições e articulações do sistema atual.
Desenvolvimentismo e Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL)
A CEPAL é uma das comissões da Organização das Nações Unidas, criada em 1948, com sede em Santigo, no Chile. Com o objetivo de “contribuir ao desenvolvimento econômico da América Latina, coordenar as ações encaminhadas à sua promoção e reforçar as relações econômicas dos países entre si e com as outras nações do mundo” (CEPAL, 2021, s.p). Durante o período de 1949 a 1957, Celso Furtado foi o diretor da Cepal (TENÓRIO; WANDERLEY, 2018). Pondera-se, ainda, que ao longo da história as ideias e diretrizes da CEPAL foram se modificando e, atualmente, a comissão estabelece nas suas diretrizes também o desenvolvimento social e o sustentável. Entretanto, nas décadas de 1980 e 1990, seu foco baseava-se no “ajuste do crescimento” e na produtividade (CEPAL, 2021, s.p).
Em 1958, Furtado deixa o cargo da Comissão, mas continua a pertencer ao “Clube de Economistas”, sendo um dos editores da Revista Econômica Brasileira e com posição de influência nos cargos em órgãos do governo. Na sequência (1958-59), o economista foi nomeado diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) e elaborou o Plano de Desenvolvimento do Nordeste, cargo que ocupou como gestor público até 1964. É oportuno mencionar, ainda, que Furtado foi um dos grandes intelectuais do país, dotado de pensamento crítico, assertividade de planejamento e grande capacidade técnica (TENÓRIO, WANDERLEY, 2018).
O livro de Celso Furtado “O mito do desenvolvimento econômico”, lançado em (1974), inicia mencionando que a aparência guia o cientista social, a partir de valorações que encaminham para um reflexo da realidade objetiva. O mito configura hipóteses que não podem ser testadas, mas que iluminam e orientam a percepção intelectual. Ainda na década de 1970, Furtado apontou o desenvolvimento econômico como uma ilusão, na medida em que pregava a universalização do consumo da minoria da humanidade, na expansão para as periferias e as massas de população.
No livro, lançado na década de 1970, Furtado menciona o não aprofundamento das consequências culturais que a busca pelo desenvolvimento proposto pela CEPAL acarretaria ao meio físico. Nesta continuidade, o relatório “Os Limites do Crescimento”, em 1972, por pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology, convenceu economista de que era a primeira vez que se projetavam dados e consequências econômicas no âmbito planetário, principalmente para a sustentabilidade futura dos países subdesenvolvidos (FURTADO, 1974).
Assim, o autor escreveu que “a criação de valor econômico, provoca na grande maioria dos casos, processos irreversíveis de degradação do mundo físico” (FURTADO, 1974, p. 15). Logo, a fábula proposta em seu livro, é a de que o desenvolvimento econômico conseguiria reverter os cenários alarmantes dos recursos ecológicos, principalmente dos naturais não renováveis. Para tanto, o pensador pontua a pressuposição ingênua de que o desenvolvimento econômico e o progresso tecnológico conseguiriam solucionar as consequências que o próprio ser humano criou ao mundo físico.
Analisa ainda, que a formatação do sistema econômico internacional e a concentração do excedente em poucas mãos e o controle do processo produtivo a um pequeno grupo fazem com que o desenvolvimento econômico não consiga atingir resultados satisfatórios (FURTADO, 1974). Na contextualização de Furtado, quanto ao conceito de desenvolvimento, o que eclode de pensamento hegemônico nos próximos anos, sobretudo nos anos 1990 para o caso da América Latina é o neoliberalismo, a ideologia econômica e a política que atingiram na década anterior o Reino Unido e os Estados Unidos.
Por tal vertente econômica, os pressupostos macroeconômicos se baseiam na estabilização de preços. Norteados por uma política econômica resumida nos ajustes de mercado, o desenvolvimentismo proposto pela CEPAL desconsiderou qualquer particularidade histórica e geográfica dos países, ao purgar um modelo econômico padronizado que se aplicasse a toda e qualquer esfera do globo (SOARES, 2013). Tal proposição forasteira voltada ao crescimento econômico, serviu como sustentáculo da associação desenvolvimentista de que quanto mais o PIB (Produto Interno Bruto) crescesse, mais desenvolvido o país conseguiria ficar (SOUZA, 1996).
A tese Cepalina baseava-se na hipótese que “de que a indústria seria capaz de se tornar o núcleo gerador e difusor de progresso técnico e produtividade” (COLISTETE, 2001, p. 4), além de que absorveria o excedente populacional, reduziria as pressões sobre salários e interferiria nos preços do setor exportador. Tal industrialização dos países periféricos, deste modo, seria importante pois “seria possível a reversão dos efeitos negativos da especialização primário-exportadora na América Latina” (Ibid.). A diversidade industrial da periferia, portanto, superaria a condição destes rumo ao centro e supriria a insuficiência de poupança interna.
A manutenção da dependência aos países centrais, derivaria, assim, da condição primário-exportadora dos países latinos. Neste raciocínio, a periferia destinaria produtos relativos apenas a bens primários, enquanto o centro produziria produtos manufaturados. Essa relação, segundo a CEPAL, transferia os “ganhos de produtividade no setor primário-exportador para os países industrializados” (COLISTETE, 2001, p. 3).
O consenso adotado nas teorias tradicionais de desenvolvimento seria o de não ser possível o crescimento sem a industrialização, assumindo como hipótese “a impossibilidade de aumento sistemático em valor agregado e de efeitos de encadeamento dinâmicos como características da produção primário-exportadora” (COLISTETE, 2001, p. 5). O desenvolvimento, portanto, seria visto como sinônimo de industrialização e modernização das sociedades, ou seja, dos avanços materiais e das transformações sociais (MALUF, 2000). Assim:
A modernização (e o crescimento), como ‘paradigma’, se assemelha a um paciente em coma, mantido vivo com a ajuda de aparelhos, diante das contradições do capitalismo e da contínua e crescente exclusão de contingentes populacionais e partes do globo dos benefícios da globalização econômica (SOUZA, 1996, p. 14).
Apesar da interligação dos conceitos de modernização e desenvolvimento, a concepção visualizada era a de que a humanidade evoluía progressiva e socialmente do atrasado (sociedades agrárias) para o moderno (industrialização) o que ocasionava “a incapacidade do modelo (neo)liberal de sustentar uma taxa de crescimento econômico” (SOARES, 2013, p. 8). Por certo, tal modelo econômico foi incapaz de superar as contradições estruturais e sociais do sistema. Em vista disso, os pressupostos hegemônicos não foram suficientes para que os países periféricos atingissem o centro.
De modo efetivo, portanto, o oposto do desenvolvimento se encontrava no subdesenvolvimento, ou seja, naqueles países que não conseguiram resultados expressivos no PIB ou não se industrializaram ou modernizaram tal qual o modelo propunha. A ideia disseminada era a de que o crescimento econômico geraria vantagens para todas as camadas da população. Entrementes, no resultado prático, nem um único país da América Latina conseguiu êxito em superar as “taxas significativas de crescimento econômico (superiores à metade da taxa média dos países avançados no mesmo período) com níveis aceitáveis de equidade de renda (iguais à metade do nível médio daqueles mesmos países), (MALUF, 2000, p. 56)”. O fato é que:
(...) à ocidentalização do mundo, à exploração capitalista em escala mundial, à destruição da etnodiversidade em nome de uma pasteurização cultural; falar em desenvolvimento significa defender os interesses capitalistas ou, mais amplamente, os valores do Ocidente e do modelo civilizatório capitalista (SOUZA, 1996, p. 7).
A abundância de petrodólares[4] na década de 1970 para os países latinos facilitou o endividamento dos países periféricos com taxa de juros flutuantes (prime rate). Em especial pela conjuntura de transição do sistema fordista para o de acumulação flexível do capital, na qual tal abundância demonstrou uma inaptidão do sistema em manter a economia estável. O período de 1965 a 1973, segundo Harvey (2008, p. 135), foi o que sobressaiu a “incapacidade do fordismo e do keynesianismo de conter as contradições inerentes ao capitalismo”. Além disso, a rigidez dos mercados e dos contratos de trabalho, a alta inflação e os elevados compromissos do Estado desencadearam uma crise civilizatória e pluridimensional. Trata-se, pois, de uma crise com desequilíbrios macroeconômicos dos países centrais e que culminaria no neoliberalismo.
Essa crise soma-se ao choque do petróleo, no ano de 1973, a partir da decisão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) em aumentar o preço do barril para o Ocidente. A esplendecência da instabilidade financeira mundial emergira. No pensamento de Harvey (2008, p. 137): “A forte deflação de 1973-1975 indicou que as finanças do Estado estavam muito além dos recursos, criando uma profunda crise fiscal e de legitimação” e para Mészáros (2011) em 1973 iniciou-se uma monumental reestruturação produtiva do capital. Assoma-se, ainda, nesta circunstância a crise ambiental, crise no trabalho e uma nova crise do petróleo, em 1979, que elevou unilateralmente os juros da dívida pelo mercado financeiro. Tal elevação iníqua dos juros da dívida golpeou os países latinos, provocando a crise do endividamento na década de 1980.
Consta-se, assim, que a dívida externa brasileira entre os anos de 1964 e 1988 multiplicou-se quarenta vezes, ou seja, saltou de US$ 2,9 bilhões para US$ 118,3 bilhões. Tal ciclo de endividamento somente acentuou a deficiência estruturaria regional brasileira e latina (PETRY, 2008). Os modelos neoliberal e desenvolvimentista subsequentes impostos por critérios dos países do Norte, foram extremamente letais para os países do Sul, ao passo que priorizaram o adimplemento da dívida externa. Como resultado, as décadas de 1980 e 1990 foram consideradas por especialistas trágicas para os países periféricos pois o endividamento colossal não acompanhou suas capacidades produtivas - que continuaram insuficientes. Deste modo, a situação desencadeada refletia a carência de fluxos de financiamento e na ausência de mecanismos autônomos e capazes de financiar o desenvolvimento interno desses países (PETRY, 2008).
Tal conjuntura acarretaria, neste horizonte, a ininterrupta necessidade de os países considerados subdesenvolvidos buscarem financiamentos externos, o que na concretude decorre da dependência destes daqueles desenvolvidos (SOARES, 2013). A reunião no mês de outubro de 1989, que ficou conhecida como Consenso de Washington, propunha saídas possíveis para aqueles países golpeados na crise de endividamento. As formulações do economista inglês John Williamson envolviam ajustes fiscais e redução de gastos públicos, liberdade comercial e ausência de regulação, flexibilização nas taxas de juros e incentivação do câmbio competitivo, privatizações, abertura para investimento externos e respeito aos direitos de propriedade intelectual (VAZ, MERLO, 2020; GENNARI, 2001).
Várias reformas estatais irradiaram-se para os cânones latinos em 1990, a partir da hegemonia neoliberal. A narrativa de demonizar o crescimento do Estado e as políticas de regulação foram justificadas pelos cortes aos investimentos públicos, em especial em setores sociais como a saúde e a educação, assim como nos projetos de privatizações, que somente beneficiam instituições financeiras transnacionais (VAZ, MERLO, 2020; PETRY, 2008)[5].
Discorre Soares (2013) que, segundo os dados da CEPAL (2011), o crescimento do PIB da América Latina foi muito aquém das necessidades daquelas regiões, sendo que de 1991 a 2010 oscilou entre 1,2% e 3,3%. Neste sentido, “o problema da falta de financiamento para o desenvolvimento e seus impactos no processo de integração da América Latina não é nenhuma novidade” (SOARES, 2013, p. 10).
Como já era esperado na análise social, as concepções tradicionais de desenvolvimento não conseguiram fazer com que os países subdesenvolvidos chegassem ao centro. A perspectiva de desenvolvimento baseada somente no modelo econômico e global não foi suficiente para atender as necessidades básicas da população vulnerável, marginalizada, do sistema capitalista, tampouco para superar seu passado exploratório.
Por outro ângulo, há de se mencionar ainda, que muitos países latinos se não foram colônias de exploração em um passado não muito distante, a chance de terem sido explorados em processos imperialistas que somente usurparam suas riquezas é uma realidade a ser dita. O denominado atraso dos países (“sub”) desenvolvidos resultaram de forte resquício pretérito que somente os debilitou. Deste modo, aplicar teorias de desenvolvimento que não consideram o legado histórico e geográfico regional tenderia, e tende, ao fracasso (KRUSE, 2021).
Há de se mencionar também que o modelo de desenvolvimento econômico global se baseia em determinantes exógenos de reprodução do capital. Assim, esse modelo desterritorializado, que não se prende às necessidades locais e regionais, composto por grandes indústrias internacionais detentoras de tecnologia de ponta e alta produção (máquinas), por certo, não consegue ser suficiente para suprir as carências locais e, tampouco, as demandas de desemprego (eis que tais empresas utilizam pouca mão-de-obra). A fixação dessas empresas desterritorializadas em países periféricos, portanto, ocorre pela maior possibilidade de lucro e não por sua benevolência[6].
Essa ideologia desenvolvimentista disseminada mundo afora tem forte influência no conceito de desenvolvimento sustentável, até mesmo pela data que o conceito foi proposto pelo Relatório Brundtland, no ano de 1987. É por isso, então, que este artigo analisa o desenvolvimento sustentável sob o viés crítico, ou conforme avalia Latouche (2009) ao partir do conceito de que enfatiza o “desenvolver” designa o dinamismo econômico do crescimento que resulta no fim em si mesmo. Portanto, falar em “outro” desenvolvimento é continuar a transcrever um conceito etnocêntrico, imposto misticamente como eufemismo dos detentores do capital.
Assim, o consumidor, ou a ideologia consumerista, evidentemente que também é responsável por parte do desequilíbrio ambiental (ou conforme o entendimento de Latouche, somos cúmplices das engrenagens do frenesi humano), no entanto, não é o consumidor – com certeza – suas molas propulsoras. É por esta razão que o conceito de desenvolvimento sustentável pode ser visto como uma tentativa de apaziguar as demandas ambientais, mas que na prática (e já passado mais de 30 anos do seu surgimento) não se vislumbrou melhorias ou progressos, muito ao contrário.
Críticas ao conceito de Desenvolvimento Sustentável
O conceito de desenvolvimento sustentável, surgiu no Relatório de Brundtland (assim denominado porque foi coordenado pela primeira-ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland), ou Relatório “Nosso Futuro Comum”. Tal documento foi elaborado em 1987, para ser o aporte da Conferência Internacional Rio 92. A partir de então, surgiu o conceito, pontuando que “o desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades” (BRUNDTLAND, 1991, p. 46).
O ressurgimento da ideologia neoliberalista na sequência, teria o condão de analisar o ambiente sob a ótica do desenvolvimentismo e do crescimento econômico e, o resultado não poderia ser outro a não ser o de tentar conciliar a economia com a exploração dos recursos da natureza. A visão predominante era de que o próprio sistema reverteria a situação ambiental a partir d mecanismos “limpos” e, assim, evitar-se-ia um colapso ambiental. A proposição de substituir os combustíveis fósseis e inovar as indústrias e as tecnologias por mecanismos mais limpos visava conter as projeções negativas.
Antes de 1987, a questão ambiental analisada pelo Relatório “Os Limites do Crescimento”, proposto em 1972, se mostrava cética quanto à manutenção do crescimento econômico. Desse modo, conceitualmente, crescimento econômico e desenvolvimento econômico, são distintos. Segundo Oliveira (2018) enquanto crescer significa somente o giro do financeiro, o desenvolvimento econômico analisa também a questão social e a ideologia de condições materiais. No entanto, o que é certo é que não existe desenvolvimento sem crescimento, eis que, desenvolver envolve conjuntamente o crescer economicamente.
De outra sorte, em 1972, ainda na vigência do Estado de Bem-Estar social (ao menos no Ocidente), a proposição foi a de crescimento zero. Ou seja, sugerindo que os limites ambientais estavam à beira de uma catástrofe e a preocupação era com “o ritmo acelerado de industrialização, o rápido crescimento demográfico, a desnutrição generalizada, o esgotamento dos recursos naturais não-renováveis e a deterioração ambiental” (MEADOWS et al, 1978, p. 17).
A projeção do Relatório era de que o rápido crescimento humano em um futuro próximo ocasionaria a escassez de recursos naturais não renováveis, haja vista que haveria muita poluição e pouco alimento (dada a limitação de terras férteis para plantar alimento para tanta gente, em conjunto com a erosão e a desertificação dos solos). Deste modo, o crescimento exponencial da população levaria ao colapso sistêmico planetário. Tais proposições foram feitas pelo Clube de Roma. Dessarte, a conjuntura analítica do ano de 1987 era diversa e na égide do pensamento econômico neoliberal. Essa situação é apresentada sob forma de quadro analítico:
Tabela 1 - Comparações entre os relatórios de 1972 E 1987
| Os limites do crescimento | Nosso futuro comum |
Ano de publicação | 1972 | 1987 |
Sistema econômico | Estado de Bem-estar social | Neoliberalismo e desenvolvimentismo pela Cepal |
Nomenclatura | Ecodesenvolvimento[7] | Desenvolvimento sustentável |
Ênfase | Preocupa-se com os limites físicos da Terra. Expõe o aumento populacional e o esgotamento de terras férteis para alimentar todos nos próximos anos, a utilização dos recursos naturais não renováveis, a industrialização e a poluição como nocivos ao ambiente. Proposição de crescimento zero. | Preocupa-se com os efeitos nocivos das ações humanas na Terra. Analisa o consumismo exacerbado como problema contemporâneo, em especial dos países ricos. Porém enfatiza a pobreza e o subdesenvolvimento como alvo a ser superado. Não veta o crescimento econômico e a industrialização, somente estabelece limites para a exploração da natureza. |
Projeções | Colapso econômico e ambiental. Projeções negativas se o crescimento a todo custo não fosse interrompido. Possibilidade de reverter o cenário negativo dos próximos anos com a proposição de frear o crescimento econômico, ou crescimento zero. | Projeta a superação da pobreza pelo desenvolvimento e a possibilidade de reverter os danos da natureza com a estipulação de limites e a utilização de mecanismos de tecnologias limpas. |
Equipe que confeccionou | Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) a partir do programa computacional World3 | Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ONU) |
Fonte: autoria própria (2021). Dados obtidos nos respectivos relatórios.
A proposta de crescimento zero no ano de 1972 não foi bem aceita na comunidade internacional (como já era esperado), em especial pelos países periféricos que tinham como modelo desenvolvimentista chegar ao centro, ou melhor, ao desenvolvimento. A ideia de que os países desenvolvidos já haviam desmatado e poluído seus territórios era evidente, e a desculpa era de que o ônus ambiental não poderia recair sobre aqueles que ainda não tinham realizado a destruição requerida para se chegar ao mundo desenvolvido. Deste modo, “Os Limites do Crescimento” foi alvo de grandes polêmicas e críticas.
A nova roupagem da proposição ambiental se daria no conceito de desenvolvimento sustentável, em 1987. Por este motivo, as necessidades básicas não atendidas nos países periféricos deveriam, pelo exposto no Relatório de Brundtland, receber máxima prioridade internacional, haja vista suas carências de empregos, alimentos, vestuário e habitação. O Relatório analisa, ainda que “as necessidades e as aspirações humanas são o principal objetivo do desenvolvimento” (BRUNDTLAND, 1991, p. 46), e finaliza o parágrafo expondo que:
Num mundo onde a pobreza e a injustiça são endêmicas, sempre poderão ocorrer crises ecológicas e de outros tipos. Para que haja um desenvolvimento sustentável, é preciso que todos tenham atendidas as suas necessidades básicas e lhes sejam proporcionadas oportunidades de concretizar suas aspirações a uma vida melhor. (p. 47).
Ora, o que se percebe é um conceito que engloba outras questões e não somente a seara ambiental. No entanto, não há como tratar a questão ambiental e a desigualdade social de forma equivalente, na medida em que uma não deriva necessária ou automaticamente da outra. Ou seja, não foi pela questão ambiental que a desigualdade social despontou e tão pouco pela crise ambiental que a miserabilidade surgiu. O verdadeiro problema da miserabilidade – que é a reprodução incessante e frenética do capital – não é desmascarado no Relatório, tampouco no conceito de desenvolvimento sustentável.
O Relatório, por conseguinte, atribuiu o problema da miserabilidade econômica que também é um problema do sistema do capital posto atualmente à questão ambiental. Muda-se, com isso, o foco e o objetivo das Conferências Internacionais Ambientais, descentralizando-se o óbice e exculpando-se outras maledicências do capitalismo.
No entanto, o que se pondera é que para discutir a miserabilidade poderia ser organizada outra Conferência. Esta, inclusive, não dependeria de tanto esforço, uma vez que a solução da pobreza está baseada essencialmente na melhor distribuição de recursos econômicos. Isto pois, se 1% da humanidade concentra mais riqueza que 99% da humanidade restante (CLACSO, 2018), escancara-se que o problema da carência social se faz no sistema econômico vigente e não fora dele.
A crise ambiental é extremamente grave e profunda, necessitando foco e medidas alternativas que visem à solução. Adentrar em outras maledicências atuais não resolve as perversidades ambientais. Pelo contrário, é preciso ter clareza de que os imbróglios ambientais são causados por grandes empresas transnacionais que planificam suas ações considerando a obtenção de lucros acima ou além das questões do ambiente (assim como também o fazem na seara social).
Neste sentido, advoga-se o total contrassenso de tentar conciliar desenvolvimento, pobreza e ambiente, pois tais mordacidades sociais e ambientais são todas ocasionadas pelo mesmo motivo: a incessante busca do lucro e do capital por parte da classe dominante mundial. Com isso, o próprio conceito de desenvolvimento sustentável é uma falácia, na medida em que não se fala em frear o desenvolvimento ou reduzir números econômicos, mas sim em tentar conciliar o inconciliável. De igual pensamento, Montibeller-Filho (2001) defende que o conceito de desenvolvimento sustentável é um mito.
É claro que o problema da desigualdade social e da pobreza deve ser inexoravelmente superado. Entrementes, o ataque ao verdadeiro problema ambiental, por certo, também acarreta equidade de investimentos. A questão é que, segundo Oliveira (2018), o discurso economicista eleva ao patamar da divindade as leis do mercado e da sua autorregulamentação. No entanto, pode-se dizer que o real problema da desigualdade social e da crise ambiental é o próprio sistema. A questão é que as proposições de uma sociedade mais “justa” que vise ao bem-estar social e ambiental, não são possíveis no sistema atual.
O que se vê, portanto, é um conceito ascendido na fábula de proteger o ambiente, mas que, na prática, somente visa apaziguar as demandas sociais daquele momento (em especial porque o Relatório foi elaborado em 1987 e os maiores desastres ambientais como Chernobyl e Bophal ocorreram em 1986 e 1984, respectivamente). Há de se considerar, também, a tentativa de impor pressupostos neoliberais desenvolvimentistas da CEPAL no Relatório, uma vez que prognostica que o próprio sistema conseguirá contornar a crise ambiental baseado em pressupostos econômicos, (porém sustentáveis?). A tentativa de conciliar a miserabilidade e o ambiente com a economia mostra-se, no mínimo, antagônica.
Para Mészáros (2011, p. 29) um dos maiores fracassos históricos é a autorreprodução do capital que é “estruturalmente incapaz de se dirigir às suas causas”. Apesar das camufladas tentativas de conter alguns sintomas, como é o caso de inúmeras conferências e acordos internacionais em prol do ambiente “por meio dos recursos do Estado ainda a serem inventados, só cumprem o papel de sublinhar as determinações causais antagônicas profundamente enraizadas da destrutividade do sistema capitalista” (Ibid.). O autor ainda afirma que:
Imaginar que dentro da estrutura de tais determinações causais antagônicas possa ser encontrada uma solução harmoniosa permanente para o aprofundamento da crise estrutural de um injusto sistema de produção e de troca – o qual está agora empenhado ativamente em produzir uma crise alimentar global, por cima de todas as suas outras contradições gritantes, incluindo a sempre mais difusa destruição da natureza –, sem mesmo tentar remediar suas miseráveis desigualdades, é a pior espécie de pensamento ilusório e beira à irracionalidade total. Pois, de forma paradoxal, ele quer reter a ordem existente apesar dos seus antagonismos e das suas necessárias injustiças explosivas. E a chamada “integração jurisdicional dos demais Estados” sob o controle de uns poucos autoindicados, ou mesmo apenas um, como defendido por alguns apologistas do capital, pode apenas sugerir a – tão paradoxal quanto – permanência da potencialmente suicida dominação imperialista global (p. 29-30).
Por certo, não há como aliar desenvolvimento e sustentabilidade. A sustentabilidade consiste no conceito com origem no latim sustentare que corresponde ao vivo, à defesa[8]. Logo, num contexto ambiental a palavra sustentabilidade adquire o fundamento de preservação e conservação do ambiente, desvinculado do conceito de desenvolvimento; enquanto preservar significa manter a natureza sem alteração, conservar remete à utilização racional dos recursos natural. A sustentabilidade, deste modo, “afasta a possibilidade da ação humana sobre os bens ambientais e deixa necessariamente de ser entendido como recurso. A natureza, por razões étnicas, que justificam sua tutela, como um bem maior que merece ser protegido, inclusive da própria humanidade” (STEFANIAK, 2016, p. 80).
De tal assunção, a ideia de sustentabilidade deve corresponder, por si só, à demanda de posturas anticapitalistas. Ao passo que a essência do movimento ecológico se baseia na racionalização dos recursos ambientais e, por essa razão, “deve ser anticapitalista” (HARVEY, 2016, p. 234). Por esse ângulo, o movimento ambientalista por essência somente tem sentido como movimento e pleito contrário às demandas conjunturais e desfavoráveis à natureza e ao ecossistema. Isto posto, a crítica ao conceito de desenvolvimento sustentável é oportuna, pois, ambientalmente falando, a insustentabilidade decorre até mesmo na sua própria nomenclatura ao pressupor que é possível crescer nos ditames do capital e, concomitantemente, preservar a natureza.
Neste segmento, ao propor que a economia deve regredir, por óbvio, vai contra o pensamento hegemônico liberal contemporâneo. O truque, portanto, foi a mudança da nomenclatura com o propósito de apaziguar as demandas ambientais. Ou seja, ao invés de regredir, propõe-se avançar “limpamente”, isto é, renovar a produção e impor a contragosto novas artimanhas mercadológicas que visem à expansão do mercado. O marketing ambiental da sustentabilidade, da reutilização e da reciclagem avança no sentido da reificação do capital e não no de avançar positivamente nos indicadores ambientais.
A falácia do desenvolvimento sustentável, na seara ambiental, não passa de uma artimanha adaptada ao discurso conveniente dos países ricos em cumplicidade com a manipulação midiática. O fato é que o caos ambiental é o mais significativo dos entraves capaz de frear, na marra e a contragosto, a frenética reprodução incessante do capital. Isto porque, o sistema na sua abstração econômica não possui forças suficientes para manipular, orquestrar ou sequer reificar a natureza quando os riscos ambientais eclodem.
É por isso que o papel das ciências humanas se faz extremamente importante na luta ambiental e para refletir como a intelectualidade no tocante a sobrevivência da espécie humana. A educação crítica é fundamental para a desalienação humana perante o sistema corrosivo de reprodução do capital. Educar, neste sentido, não pode ficar restrito à transposição de conhecimento ou de uma preparação laboral para garantir uma vaga no mercado de trabalho. Trabalho este que torna o funcionário um número contábil da empresa e com a função de dominação humana. Educar não pode ser uma legitimação dos interesses dominantes e instrumento de dominação estrutural.
A educação deve ser, conforme os preceitos de Mészáros (2008), para além do capital, ou seja, que ela vise despertar o ser humano acerca da lógica do capital e das contradições inerentes à mercadoria (fetichismo) e da lógica usurária. Tal emancipação educacional se faz inexorável para uma mudança. Além disso, a ocupação de cargos públicos e a oposição em face do sistema econômico tal como está posto são a proeza que cabe aos cientistas humanos e sociais.
A educação também tem o importante papel de evidenciar a iminente ruptura metabólico do ser humano versus natureza. Tal constatação destaca-se no consenso científico quanto a esta afirmativa (GIDDENS, 2010). Projeções negativas direcionam a humanidade para o colapso em pouco tempo. Entrementes, contrariando os estudos científicos, a irredutível necessidade de reprodução do capital se fez prevalecer em detrimento do ambiente. A insustentabilidade de políticas preservacionistas no capitalismo contemporâneo é facilmente detectada, o que faltam, no entanto, são mecanismos eficientes de freio ao desenvolvimento econômico, tal como ele está posto.
A pandemia da Covid-19 serve de alerta para demonstrar que o globo não está preparado para uma catástrofe ambiental de grande porte. A visão antropocêntrica que o sistema econômico há de equacionar uma ou qualquer crise não pode ser adotada no século XXI. A concepção de que para driblar uma crise sanitária bastam vacinas, não leva em conta todo o resto da biodiversidade terrestre.
O ser humano é totalmente dependente do ecossistema e não ao contrário. A extinção das espécies e as detrações infecciosas e virais estão relacionadas à forma como o ser humano manipula o sistema do capital em detrimento da natureza. Roga-se, portanto, por outro paradigma, ou melhor, por outra visão de mundo que coloque a natureza como organismo metabólico essencial para as atividades humanas e para a sobrevivência da nossa espécie em condições humanas fidedignas.
Da crise ambiental a um outro paradigma ecológico
Desde já, deixa-se claro que não há como tomar ciência dos dados e enfrentar abordagens ambientais sem enfatizar uma necessária transformação no estilo de vida contemporâneo. Nas palavras de Mészáros (2011, p. 30): “apenas uma mudança sistêmica radical pode proporcionar a esperança historicamente sustentável e a solução para um futuro”. No entanto, uma transformação no estilo de vida contemporâneo e na cultura capitalista baseada no consumismo e na obsolescência programada restam-se necessárias.
O sistema de reprodução do capital funda-se em um modelo expansionista e, segundo Mészáros (2011), em contradições e antagonismos insolúveis. Tal assertiva se dá, em especial, porque o imperialismo cultural e a busca do crescimento econômico para os países periféricos (e outros milagres do período pós-guerras) consistiu-se no denominador comum do “endividamento desastroso e a fraude” (Ibid., p. 131). O autor, a partir deste raciocínio, discorre que “um sistema que opera dessa forma moralmente pobre provavelmente não pode sobreviver porque é incontrolável”. Dessa maneira, conclui que “a solução não é se desesperar, mas controlá-lo em nome da responsabilidade social e de uma radical transformação da sociedade” (Ibid., p. 131).
A profundidade da crise ambiental demonstra que o crescimento “míope do sistema capitalista, obcecados pelos imperativos de crescimento e expansão, pela luta por partes do mercado, pela competividade, pelas margens de lucro e pela rentabilidade” (LÖWY, 2014, p. 8), impõe que se aborde também o modo de produção para se buscar um padrão mais ecológico. Conforme aponta Löwy (2014, p. 9), é preciso uma ruptura com a “civilização capitalista/industrial ocidental moderna”. Se nada for feito, “sob a pressão do crescimento exponencial contínuo, é muito provável que a degradação cancerosa se acelere” (HARVEY, 2016, p. 236).
Na verdade, o capital prospera e evolui por meio da volatilidade dos desastres ambientais localizados, que não só criam novas oportunidades de negócios, como também fornecem um disfarce conveniente para esconder as falhas do capital: “a mãe natureza”, caprichosa, imprevisível e teimosa, é quem leva a culpa pelas desgraças que em boa parte são causadas pelo capital. Em contrapartida, a degradação lenta e cancerígena representa um grande problema, para o qual o capital não está preparado e cuja gestão depende da criação de novas instituições e novos poderes.
Dois apontamentos pertinentes devem ser considerados aqui. O primeiro é que o suposto progresso industrial e reprodutivo do capital ocorre a partir da destruição do ambiente e suas consequências nocivas; o segundo indica que tal crescimento econômico somente é possível com a manutenção da desigualdade socioespacial e dos deslocamentos e transferências dos problemas ambientais que deixam os “pobres e os vulneráveis em situação ainda pior” com base em um “imperialismo extrativo” (HARVEY, 2016, p. 239). É por isso que este artigo aponta a impossibilidade de conciliar desenvolvimento econômico com a questão ambiental.
O relatório “Os Limites do Crescimento”, de 1972, teve novas atualizações como a intitulada “Limites do Crescimento: atualização de 30 anos”, em 2008, até o mais recente estudo de Gaya Herrington, publicado pela universidade de Yale, em 2020, no qual dados ambientais mostram consistência e precisão. De acordo com as projeções científicas a população mundial continua a crescer e, com isso, as demandas de consumo também. Assim, as reservas naturais não renováveis hão de esgotar, a água potável tende a cada vez mais diminuir, a temperatura – em um lapso temporal tão pequeno – somente aumenta de forma sem precedentes na escala geológica planetária e, por fim, os limites terrestres deverão ser sentidos nos próximos anos.
Tais eventualidades também se mantêm nos relatórios do Global Environment Outlook (GEO) e do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC). E mais, os Acordos Internacionais, grosso modo, não levaram a lugar algum, ou seja, fadaram-se ao fracasso. Não há otimismo a se apresentar. A ciência, em tal caso, não pode se basear em expectativas irreais, mas sim em dados e projeções de probabilidade. A questão é: ainda existe algo a ser feito? Possivelmente, o ser humano chegou ao ponto do overshoot, ou conforme outra vertente do pensamento crítico, ao tipping point. O que ambas analisam é que já se alcançou o ponto máximo, o ponto de não retorno (point of no return), em que o dano é irreversível.
O que se analisa, portanto, é uma ruptura sistêmica e metabólica forçada com os padrões impostos atualmente em um curto lapso temporal. Os indícios de escassez obrigarão a uma “ruptura radical com a ideologia do progresso linear e com o paradigma tecnológico e econômico da civilização industrial moderna” (LÖWY, 2014, p. 37). Assim como as crises cíclicas do capital outrora foram superadas com a injeção de dinheiro na economia, a superação das crises ecológicas que deverão ocorrer necessitarão de outra remodelação, para que possam ser superadas.
O preview do caos já pode ser visualizado no século XXI, em que o desenvolvimento econômico, ou mesmo o suposto sustentável, é capaz de conter prontamente pandemias, vírus, infecções. Isso porque o inimigo de 2021 foi “apenas” um vírus altamente infeccioso (Covid-19) e não uma série de nocividades ambientais, tais quais são previstas nos relatórios científicos. Se a vacina, nesse momento, está sendo suficiente para conter o avanço do inimigo “invisível”, as próximas crises cíclicas ambientais (conforme projeções desde 1972), provavelmente não terão a mesma “facilidade” de enfrentamento.
Em virtude disso, este cenário pessimista clama por outra lógica sistêmica que exceda a da comercialização e de reprodução ad infinitum ditada pelo capital. É preciso superar a ideia de desenvolvimento, ainda que sustentável. Segundo Löwy (2014, p. 37), “o desafio é reorientar o progresso de maneira a torná-lo compatível com a preservação do equilíbrio ecológico do planeta”. Para tanto, várias correntes de pensamento e movimentos ambientais subsistem desde a década de 1970, que dimanaram em várias áreas da ciência, sob a perspectiva do pensamento crítico. Ainda que se tenha familiaridade com pensamentos de vertente ecossocialista[9] ou de decrescimento econômico[10], antes de se projetar qualquer outro sistema, se faz necessário considerar as singularidades e o passado colonial dos países periféricos.
De modo efetivo, é necessário superar os déficits do intercâmbio desigual entre os países, assim como combater as transferências dos passivos ambientais que promovem a injustiça ambiental entre os hemisférios. Tais circunstâncias conflitantes, inclusive, em uma dívida ecológica em prol dos explorados (ALIER, 2018). Assim, defende-se o fortalecimento Sul-Sul para potencializar o poder de negociação daqueles que sempre foram vistos como “pobres”.
Conforme pontua Alier (2018, p. 306), “os economistas estavam certos: os pobres são baratos”, porém a verdade é que a sujeição dos pobres ao preço injusto se dá pela exploração e violência secular dos ricos perante eles. A transferência dos problemas ambientais do Norte em relação ao Sul, o uso dos seus recursos naturais e o abuso das situações de riscos, especialmente em casos de descumprimento da lei, do não investimento em itens de segurança e na ausência precaução ambiental (visando maior economia para empresas forasteiras) mostra-se corriqueira nos países periféricos. Diante disso, uma nova forma de contabilização visando um ajuste ecológico e cooperativo, estimando o capital natural, para que seja minimamente compensada as externalidades locais e globais.
O desenvolvimento sustentável, tal como proposto pela visão europeia, não aponta caminhos para a autonomia dos países periféricos, tampouco menciona na quitação dessa dívida que se perpetua secularmente. Na verdade, a falácia do desenvolvimento sustentável dá-se na manutenção dos interesses do capital e na exploração da condição periférica dos países do Sul. A demanda do capital financeiro internacional pela dependência econômica brasileira orquestra a infinita dependência aos países do centro. Segundo Jessé Souza (2017, p. 11) “entre o Brasil, o controle dos ditames do capital sobre a política ‘é muito maior’, ao passo que ele se apropria do orçamento público e, também compromete o acesso a riquezas nacionais que passam a ser geridas como espólio para a rapina internacional”[11].
Para Alier (2018, p. 316) “antes de impor unilateralmente suas condicionalidades, o Norte deve pagar sua dívida ecológica e ajustar sua economia ao seu próprio espaço ambiental”. A desuniformidade da distribuição ambiental não pode ser ignorada na reflexão que se propõe, em especial daqueles países que possuem maior parcela de culpa na degradação ambiental.
Vejamos alguns dados reflexivos: a) segundo Oliveira (2018), enquanto um habitante estadunidense consome em média 120 quilos de carne anualmente, um angolano consome cerca de 24 quilos por ano; b) se atualmente a pegada ecológica beira quase dois planetas, é porque aqueles que permanecem na margem dos padrões impostos balizam a desproporção da demanda estadunidense. Na prática, segundo Latouche (2009), seria necessário seis planetas para que todos possuíssem a demanda “desenvolvimentista” dos Estados Unidos; c) dados trazidos por Löwy (2014) ainda abordam que se o modo de produção e de consumo imposto atualmente se expandisse de maneira equivalente, as reservas de petróleo (conhecidas) mundiais se esgotariam em 19 dias.
Por conseguinte, a desigualdade do sistema é importante para sua manutenção e reprodução. A fábula do desenvolvimento sustentável consiste em projetar um modelo impossível de ser seguido por todos os países. Não existem recursos naturais suficientes para suprir as demandas dos países desenvolvidos nos dias atuais em um mundo com quase 8 bilhões de pessoas ainda mais se todos os países tivessem a mesma desenvoltura. Além disso, os países com excedente de capital só adquiriram tal condição a partir da violência, do roubo e da exploração das riquezas naturais de outros países, colonizando-os de forma exploratória e em situação desigual.
Ademais, a imposição aos países latinos de um modelo industrial a ser seguido ignorou outros custos ambientais envolvidos na relação de troca, os fluxos de energia e os materiais necessários para o produto final. Na prática, tais custos, ao não serem contabilizados, diminuem o valor agregado do produto. Outrossim, também fazem com que, segundo os cânones da CEPAL, perpetue-se a condição periférica destes mesmos países graças ao seu protótipo primário-exportador.
Isso quer dizer que, conforme o pensamento de Alier (2018), ao se exportar uma tonelada de alumínio (matéria-prima utilizada para estruturas e construções, por exemplo), paga-se apenas pelo produto. Tal circunstância, não contabiliza os custos ambientais envolvidos, como o carregamento de bauxita, desde a extração até o transporte, a retirada da cobertura vegetal e a degradação do solo, a eletricidade empregada para fundir o alumínio, a água utilizada e assim por diante. Deste modo, o que se paga no quilo do alumínio não leva em conta todo o impacto ambiental decorrente da atividade de exploração do minério.
Nessa conjuntura, faz-se necessário um paradigma que consiga reparar os estragos deixados pelo mercado capitalista a partir da solidariedade dos países do Norte e do Sul, com base em um comércio justo. Ou seja, é fundamental a superação da desigualdade ambiental contemporânea, que é a distribuição incongruente de um ambiente injustamente dividido e dos recursos ambientais concentrado nas mãos de agentes poderosos[12]:
Não há, por certo, como chamar de progresso e desenvolvimento esse processo de empobrecimento dos que já são pobres. Pois a exploração ambiental das populações mais desprotegidas faz da concentração dos males sobre os mais pobres um meio de extração de uma espécie de “mais-valia ambiental” pelo qual os capitais se acumulam pela apropriação dos benefícios do ambiente e pela imposição do consumo forçado de seus efluentes indesejáveis aos mais pobres. Configura-se assim uma relação lógica entre a acumulação de riqueza e a contaminação do ambiente: certos capitais lucram com a transferência dos males ambientais para os mais desprotegidos (ACSELRAD; MELLO; BEZERRA, 2009, p. 77).
A troca entre países é essencial no mundo contemporâneo até mesmo porque não há um país que seja autossuficiente em todas as suas demandas. Por isso, o ajuste entre os hemisférios também é uma tentativa de amenizar as projeções ambientais negativas, bem como de idealizar um modelo de produção mais ecológico e igualitário entre os países. O capitalismo posto atualmente se articula e se reproduz para poucos, eis que mais da metade dos investimentos globais ocorrem apenas entre 20 países (de quase 200 reconhecidos pela ONU). Assim, uma minoria da população mundial é favorecida enquanto a maioria, presumidamente, permanece penalizada com a distribuição desuniforme do capital (OLIVEIRA, 2018).
A pressuposição de ruptura paradigmática e da necessidade de outro sistema de produção não é mais apontada como uma utopia. Mas tal mudança mostra-se necessária para a sobrevivência da espécie humana em um ambiente capaz de suprir as demandas futuras. Construir um sentido para o futuro baseado na esperança e na totalidade da massa do universo se mostra essencial. Isto porque, nós humanos, somos parte do universo, feitos de reações nucleares e átomos, assim como as estrelas e os cosmos, sob forma de energia e partículas originárias dentro da Via Láctea. Desde as pedras, os animais, os humanos e as galáxias, todos possuímos o mesmo código genético que outros seres vivos (BOFF, 2004).
Portanto, fundamental a retomada do elo de fraternidade, afeição e união que foi rompido na modernidade. O respeito à capacidade da Terra, do seu ritmo de renovação e suporte deve fazer parte dessa outra epistemologia do Sul. O complexo da vida e da dinamicidade do universo deve caminhar ao lado da racionalidade e com a consciência ecológica (BOFF, 2004).
Considerações finais
O caminho ambiental que há de ser trilhado é árduo e se faz na luta contra todo o preceito hegemônico posto. Por certo, aqueles que apontam outro sistema tendem a ser vistos com repulsa pela classe dominante e por aqueles que possuem os aparatos ideológicos do Estado. No entanto, cada divulgação de um novo relatório científico, em que são lançados novos dados, somente aponta para a aproximação de uma ruptura metabólica (mesmo com atitudes sendo tomadas de imediato, a projeção é de que provavelmente o quadro não se reverta). O que deve ser buscado, portanto, é a diminuição dos impactos colossais futuros. Entrementes, de qualquer forma, prevê-se impositivamente um novo sistema.
O preview de como o século XXI não está preparado para as crises cíclicas ambientais futuras (seja por pandemias, infecções, esgotamento de recursos, novos vírus, aguçamento das catástrofes ambientais, aquecimento global e assim por diante) deve ser impreterivelmente balizado por aqueles que podem fazer algo a respeito – no caso, países desenvolvidos e detentores do capital –, porém ignoraram. E tal abstenção de atitudes possivelmente levará ao overshoot num horizonte próximo, tenderá a modificar a população mundial.
O que se pondera também é que num mundo em colapso ambiental, as classes sociais não serão preponderantes para a sobrevivência da espécie. Os detentores do capital devem se preocupar e muito, pois de nada adianta possuir capital sem condições plausíveis de gastar, ou ainda, sem ter com quem e onde gastar. As lições da Covid-19, portanto, deixam considerações profundas, pois até mesmo os ricos não foram poupados dos efeitos alastradores do vírus. A tendência, entretanto, infelizmente, é piorar.
Fontes de financiamento
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
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Bárbara Cristina Kruse Doutora em Ciências Sociais; Mestre em Gestão do Território, Especialista em Direito Aplicado. Advogada, bacharela em geografia e licenciada em história. E-mail: barbara@mkruse.com.br ID Lattes: http://lattes.cnpq.br/9266956948908380 ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3564-5725 Luiz Alexandre Gonçalves Cunha Professor Associado C da UEPG; Diretor do Setor de Ciências Exatas e Naturais-SEXATAS. Doutor em Ciências Sociais, pela UFRRJ/CPDA; Mestre em História Econômica do Brasil; Graduado e licenciado em Geografia. E-mail: cunhageo@uepg.br ID Lattes: http://lattes.cnpq.br/8385609625694317 |
Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 16, 1-24, e022002, jan./dez. 2022 • ISSN 1984-9834
[1]Doutora em Ciências Sociais; Mestre em Gestão do Território, Especialista em Direito Aplicado. Advogada, bacharela em geografia e licenciada em história. Pesquisadora independente, Ponta Grossa-PR, Brasil. Contato: barbara@mkruse.com.br
[2]Doutor em Ciências Sociais pela UFRRJ/CPDA. Mestre em História Econômica pela UFPR. Graduado em Geografia pela UERJ. Professor Associado da Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG, Ponta Grossa-PR, Brasil. Contato: cunhageo@uepg.br
[3] Para mais informações, ver: https://www.unep.org/pt-br/noticias-e-reportagens/press-release/saude-humana-ficara-em-apuros-se-acoes-urgentes-nao-forem. Acesso em 09 de jul. 2021.
[4] Termo definido pelo elevado fluxo de moeda em dólar nos países exportadores de petróleo que aumentou a liquidez deste no mercado. Segundo o Dicionário do site Investir Hoje (2021, s.p): “(...) toda a compra ou venda de petróleo do mundo é feita em dólares. Isso faz com que a moeda ganhe ainda mais posição de hegemonia e super privilegia os Estados Unidos, dando-lhe poder, por exemplo, de impor sanções a países que vão na contramão de seus interesses. Atualmente o dólar possui suporte do petróleo e não mais do ouro, como foi no passado. Não é à toa também que os Estados Unidos, mesmo possuindo tantos débitos, empréstimos a pagar, e altas dívidas, consegue se manter no poder”.
[5] Frisa-se, também, que tal concepção neoliberal é oposta aos preceitos incrustados na Carta Magna brasileira promulgada em 1988, denominada por Ulysses Guimarães de Constituição Cidadã, graças à excelsitude de direitos sociais previstos. O Brasil, “foi um dos últimos países da região a aderir ao regime neoliberal, somente após a formulação do Consenso de Washington”, no ano de 1989 e no governo do ex-presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992).
[6] Nessa linha de pensamento é que Latouche (2009) pondera sobre o decrescimento e a realocação econômica local. O decrescimento, nesse sentido, é uma vertente lógica de pensamento crítica ao desenvolvimento sustentável e que propõe em vez de crescer, diminuir o nível de produção e os níveis de consumo exacerbados atuais. Latouche, assim, pondera a realocação não apenas econômica, mas também política, cultural e que recupere a ancoragem territorial do sentido da vida.
[7] A nomenclatura ecodesenvolvimento é referida na literatura como a sugerida por Maurice Strong, ex diretor da United Nations Environment Programme (UNEP) na época (ROMEIRO, 2012).
[8] A ideia fundamental da ação verbal é “evitar a queda”, “manter o equilíbrio”, “suportar”. Por meio do sustento, evita-se que alguém ou alguma instituição venha a soçobrar. Pelo sustento, encorajamento e conforto se garante a preservação e conservação da natureza. No caso das batalhas, o sustento significa o fortalecimento para que não haja rendição, como aparece em Caes. Gal. Já o sustentus é conecto à ação de sustentar ou manter algo flutuando, assim em Apol. 21 (GLARE, 1982, p. 1891-1892).
[9] Desde a década de 1980, intelectuais marxistas se esforçam para acrescentar a ecologia no viés socialista. Uma corrente denominada ecossocialismo aponta que Marx em O Capital considerou o papel dos limites da natureza na produção e reprodução da vida. A ruptura metabólica, portanto, se daria pela irreparabilidade da reprodução do capital perante a natureza. Para os ecossocialistas, Marx aponta uma luta do ser humano em face dos efeitos nocivos ocasionados à natureza. Logo, o ecossocialismo é uma atualização do socialismo, incluindo a ecologia e uma recalibração do pensamento marxista (FERNANDES, 2019). Porém é oportuno mencionar que tal vertente marxista encontra resistência entre os marxistas mais ortodoxos, haja vista que alguns consideram o pensamento anacrônico.
[10] O trabalho pioneiro de Nicholas Georgescu-Roegen sobre os problemas do crescimento econômico tinha por parâmetro as leis da entropia. Roegen ponderou que os recursos naturais inevitavelmente estariam em degradação pela atividade econômica. Posteriormente, ainda na década de 1970, André Gorz acabou por cunhar a expressão decrescimento. Gorz ponderou que o parâmetro assumido pela economia neoclássica quanto ao crescimento do produto não leva a bom termo precisamente porque os fundamentos do crescimento não sustentam o crescimento ilimitado. Ou seja, o crescimento tem limite, razão pela qual é preciso pensar em decréscimo como forma sustentável da humanidade estar presente. André Gorz é considerado um pensador radical. Na verdade, a questão de fundo é que a reflexão ecológica deságua em inevitáveis agendas políticas. A reflexão ecológica consistente não cabe dentro da matriz de reprodução do capital, e tal fato requer, por parte das sociedades, a reorganização do controle político (CECHIN, VEIGA, 2010; GORZ, 2003).
[11] Apenas no ano de 2019, em uma análise contextual sem a pandemia do Covid-19, 44% do PIB brasileiro foram destinados ao pagamento dos juros da dívida pública.
[12] Essa concepção interliga-se ao Movimento de Justiça Ambiental, que em síntese apertada foi criado anos 1980, nos Estados Unidos, por um grupo de pessoas que articulavam lutas sociais, territoriais, ambientais e de direitos civis. É um movimento que defende a equidade geográfica a partir do pressuposto de que nenhum grupo, destacando suas características éticas, raciais ou de classe, deve suportar parcela desproporcional de nocividades ambientais em decorrência da sua condição. A experiência realizada por Robert D. Bullard, em 1987, pela Comissão de Justiça Racial da United Church of Christ, apontou que os fatores raça e renda influenciavam na distribuição de rejeitos perigosos nos Estados Unidos. A partir desse estudo, Benjamin Chavis cunhou o termo “racismo ambiental” referindo-se à imposição desproporcional de rejeitos tóxicos às comunidades de cor. Um dos fatores considerados por Chavis foi dentre outros, a sub-representação desses grupos, a ocupação de terras mais baratas, bem como a carência de recursos políticos (ACSELRAD; MELLO; BEZERRA, 2009).