Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade
Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 17, 1-21, e023008, jan./dez. 2023 • ISSN 1984-9834
Artigo original • Revisão por pares • Acesso aberto
O Controle Social na Política Nacional de Alimentação Escolar: Perspectivas e Desafios para a Efetividade da Segurança Alimentar
Social Control in the National School Food Policy: Perspectives and Challenges for the Effectiveness of Food Security
Jucilene Magalhães Alves Sousa , Marcos Valério Santos da Silva , Andréa das Graças Ferreira Frazão , Ivanira Amaral Dias
Resumo Este artigo analisa a atuação, os desafios e as potencialidades dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE) atuantes em quatro municípios paraenses das Regiões Geográficas Intermediárias de Belém e Santarém. Para a realização da metodologia, foi utilizado um estudo quali-quantitativo descritivo de delineamento transversal, a partir da análise documental de Relatórios Técnicos municipais de Monitoramento do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) no ano de 2019. As variáveis foram agrupadas em cinco indicadores: Composição do CAE, Organização Documental, Fiscalização dos Recursos, Infraestrutura do CAE e Qualidade dos Cardápios. Os resultados mostram que a maioria dos CAEs está funcionando conforme as legislações do Pnae, com melhores desempenhos nos indicadores Qualidade dos Cardápios e Fiscalização dos Recursos. As dificuldades relatadas referem-se ao indicador Infraestrutura do CAE. Conclui-se que é importante a participação dos conselheiros nas capacitações contínuas sobre a execução do Pnae, bem como do apoio técnico da gestão municipal com a disponibilidade da infraestrutura necessária às demandas do CAE. Palavras-chave: Segurança Alimentar e Nutricional; Participação Social; Políticas Públicas; Alimentação Escolar; Controle Social. Abstract This article analyzes the performance, challenges and potential of the School Feeding Councils (CAE) operating in four Pará municipalities in the Intermediate Geographical Regions of Belém and Santarém. As a methodology, a descriptive quali-quantitative cross-sectional study was carried out, based on the document analysis of municipal Technical Reports for Monitoring the National School Feeding Program (Pnae) in the year 2019. The variables were grouped into five indicators: Composition of the CAE, Document Organization, Inspection of Resources, CAE Infrastructure and Menu Quality. The results show that most CAEs are working according to Pnae legislation, with better performances in the Quality of Menus and Inspection of Resources indicators. The reported difficulties refer to the CAE Infrastructure indicator. It is concluded that the participation of counselors in continuous training on the implementation of the Pnae is important, as well as the technical support of municipal management with the availability of the necessary infrastructure for the demands of the CAE. Keywords: Food and nutrition security; Social Participation; Public policy; School Feeding; Social Control. | Submissão: Aceite: Publicação: |
Citação sugerida SOUSA, Jucilene Magalhães Alves; DA SILVA, Marcos Valério Santos; FRAZÃO, Andréa das Graças Ferreira; DIAS, Ivanira Amaral. O Controle Social na Política Nacional de Alimentação Escolar: Perspectivas e Desafios para a Efetividade da Segurança Alimentar. Revista IDeAS, Rio de Janeiro, v. 17, p. 1-21, e023008, jan./dez. 2022. Licença: Creative Commons - Atribuição/Attribution 4.0 International (CC BY 4.0). |
Introdução
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) destaca-se como uma política pública pioneira, com atendimento universalizado e abrangente na garantia da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) do Brasil, com efetivação do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (Dhana), garantido no art. 6o da Constituição Federal de 1988 (AGUIAR; CALIL, 2016). Um dos objetivos do Pnae é contribuir com o desenvolvimento biopsicossocial, o rendimento escolar e a formação de hábitos alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de Educação Alimentar e Nutricional e oferta de refeições que atendam às suas necessidades nutricionais durante o período letivo (BRASIL, 2020).
Ao percorrer o processo histórico e o marco regulatório do Pnae, percebe-se entre seus principais aspectos que o Programa foi criado no ano de 1950, sob a ótica de programa de combate à fome e à desnutrição para estudantes de baixa renda. Apesar da dimensão da política, este Programa foi marcado por uma gestão administrativa centralizada e burocrática (SILVA; SANTOS; SOARES, 2018). Durante as décadas de 1950 a 1970 ocorreram mudanças e reestruturações com a intenção de promover atendimento em âmbito nacional, e nesse período o programa assumiu algumas nomenclaturas como Campanha de Merenda Escolar (CME), posteriormente denominada de Campanha Nacional de Merenda Escolar (CNME), a qual foi alterada pelo Decreto no 56.886/1965 para Campanha Nacional de Alimentação Escolar (Cnae). Assim, somente em 1979 houve a mudança de nome para Programa Nacional de Alimentação Escolar (BUENO et al., 2019; FNDE, 2021).
Essa fase marcou o início do processo de descentralização da gestão das políticas públicas, movimento reforçado pela Constituição Federal (CF) de 1988, fazendo-se necessário a participação da sociedade civil nas tomadas de decisão e na fiscalização da utilização de recursos públicos. Em 2000, por meio da Medida Provisória no 1979-19, o Governo Federal instituiu a obrigatoriedade para o repasse dos recursos às Entidades Executoras (EEx.), na exigência da institucionalização e composição do Conselho de Alimentação Escolar (CAE) pelos estados, municípios e Distrito Federal (DF) (BUENO et al., 2019; BRASIL, 2017).
A constituição dos Conselhos de Alimentação Escolar caracterizou um grande avanço na operacionalização do Programa, que passou a contar com um instrumento oficial de controle social. O Conselho é um órgão colegiado de caráter fiscalizador, permanente, deliberativo e de assessoramento, responsável por acompanhar e monitorar toda a execução da política de alimentação escolar, na respectiva esfera governamental em que atua (BRASIL, 2017; PINHEIRO; ARAÚJO, 2017).
A Resolução CD/FNDE no 26/2013, que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da rede pública no âmbito do Pnae, no artigo 34, estabelece que o CAE deve ser composto da seguinte forma: um representante do Poder Executivo, dois representantes de entidades de trabalhadores da educação e de discentes, dois representantes de pais de alunos e dois representantes de entidades civis organizadas (BRASIL, 2013).
Os conselheiros que compõem um CAE possuem tempo de mandato de quatro anos, podendo ser reconduzido por igual período, se forem reeleitos de acordo com a indicação dos seus respectivos segmentos. Ressalta-se ainda que a atividade como membro do Conselho é considerada um serviço público não remunerado (BOSQUILIA; PIPITONE, 2019; BRASIL, 2020).
Cabe ao CAE as atribuições específicas de: a) monitorar e fiscalizar a aplicação de recursos e a execução do Pnae; b) analisar a prestação de contas e emitir o Parecer Conclusivo; c) comunicar ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), ao Tribunal de Contas da União (TCU) e a outros órgãos de controle as irregularidades observadas; d) fornecer informações sobre a execução do Pnae sempre que solicitado pelo FNDE; e e) elaborar o Regimento Interno e preparar Plano de Ação Anual (BRASIL, 2009; BRASIL, 2020).
O cumprimento dessas atividades pelos conselheiros torna a missão de acompanhar a execução e avaliar a prestação de contas do Pnae um processo mais simples e eficiente (BRASIL, 2017). Para isso, é necessário que os membros do CAE conheçam suas atribuições e a dimensão do papel relevante que desenvolvem no gerenciamento da oferta de alimentação escolar, gerando benefícios à sociedade (BRASIL, 2020; BUENO et al., 2019).
Diante do exposto, o presente estudo objetivou caracterizar a atuação, os desafios e potencialidades dos Conselhos de Alimentação Escolar no âmbito do Pnae, por meio de indicadores de controle social e análise de conteúdo de conselheiros atuantes em quatro municípios paraenses.
Vale destacar que, com a finalidade de manter o anonimato, os municípios estudados foram identificados como Município A, Município B, Município C e Município D, sendo que os municípios A e B pertencem à Região Geográfica Intermediária de Belém (R. G. I. Belém) e os municípios C e D são da Região Geográfica Intermediária de Santarém (R. G. I. Santarém), ambas pertencentes ao estado do Pará.
Métodos
Trata-se de um estudo descritivo de delineamento transversal, realizado a partir da análise documental de Relatórios Técnicos produzidos a partir de visitas in loco de nutricionistas do Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição Escolar da Universidade Federal do Pará (Cecane/UFPA), referentes às atividades de assessoria e monitoramento do Pnae, realizadas no ano de 2019, em quatro municípios do estado do Pará, adotando uma abordagem quali-quantitativa.
O estudo faz parte do projeto amplo intitulado “Monitoramento e Assessoria às Entidades Executoras do Programa de Alimentação Escolar do Pará”, desenvolvido no ano de 2019 pelo Cecane/UFPA. O Centro é uma unidade de referência que desenvolve ações de apoio técnico e operacional, em parceria com o FNDE, com a finalidade de auxiliar na melhoria da qualidade da gestão e do controle social do Pnae no estado do Pará.
Para o desenvolvimento do projeto, o FNDE encaminhou uma lista contendo 13 municípios paraenses para serem assessorados e monitorados pelo Cecane/UFPA. A seleção dos municípios é feita pelo FNDE a partir de critérios que compõem a matriz estabelecida pela Coordenação Nacional de Monitoramento e Avaliação do Pnae, considerando alguns quesitos como: municípios com pendências relativas a não prestação de contas do CAE, municípios que não adquiriram alimentos da agricultura familiar, municípios com denúncias formalizadas ao FNDE relativas à execução do Pnae, entre outros. Para a seleção dos quatro municípios, do total de 13, foi realizado um levantamento de dados de base secundária, referente ao número de alunos cadastrados no Censo Escolar do ano de 2019, coletado no site do FNDE, objetivando identificar dois municípios com o maior número e dois municípios com o menor número de estudantes atendidos pelo Pnae (SILVA, 2016).
Mantendo o anonimato, os entrevistados foram identificados como conselheiros (as) e enumerados conforme sequências das falas, por cada município.
A R. G. I. Belém é composta por 23 municípios, com população total estimada em 2018 de 3.340,513 habitantes, distribuídos em uma área total de 43.888,935 km². Já a R. G. I. Santarém compreende 19 municípios, possuindo população total estimada em 2018 de 952.434 habitantes, distribuídos em uma área total de 439.666,606 km² (IBGE, 2017; IBGE, 2018).
Os dados foram coletados por meio da análise dos Relatórios Técnicos elaborados pelo Cecane/UFPA, contendo a descrição das atividades de assessoria e monitoramento do Pnae. Os relatórios técnicos são preparados tendo como base as respostas obtidas por meio da aplicação dos protocolos de monitoramento padronizados pelo FNDE e das entrevistas semiestruturadas realizadas com os conselheiros, acerca das possíveis limitações e/ou os avanços vivenciados por eles durante o cumprimento das suas atribuições no âmbito do Pnae.
Na tabulação e análise dos dados quantitativos foram utilizados os Programas Microsoft Excel, versão 2016, e Epi Info, versão 7.2.4. Foi empregada a estatística descritiva, a partir da elaboração de gráficos e tabelas com frequências absolutas e relativas das variáveis referentes ao cumprimento das atribuições dos conselheiros, baseadas na Lei no 11.947/2009 e Resolução CD/FNDE no 26/2013, as quais foram agrupadas em cinco indicadores:
Indicador I: Composição do Conselho – é composto por representantes dos seguimentos, segundo as formalidades; há na sua composição um representante de povos ou comunidades tradicionais; a Presidência e Vice-Presidência são constituídas pelos segmentos previstos; houve substituição de membros, conforme os casos previstos.
Indicador II: Organização documental – possui lei de criação atualizada; dispõe de Regimento Interno; elabora relatórios sobre as ações desenvolvidas; cria Plano de Ação.
Indicador III: Aplicação e transparência dos recursos financeiros – fiscaliza a aplicação dos recursos; analisa o Relatório de Acompanhamento da Gestão; emite Parecer Conclusivo sobre a prestação de contas; realiza reunião para apreciação da prestação de contas.
Indicador IV: Infraestrutura do CAE – possui local apropriado para as reuniões; disponibilidade de equipamento de informática; de transporte para deslocamento; de recursos humanos; de recursos financeiros.
Indicador V: Qualidade e aceitabilidade dos cardápios – as EEx. apresentam os cardápios para conhecimento; supervisionam o serviço de alimentação nas escolas; cuidam da qualidade dos alimentos; zelam pela aceitabilidade dos cardápios oferecidos.
Além do descrito anteriormente, foram estudadas também as seguintes variáveis sociodemográficas (gênero, idade em anos e escolaridade); representatividade e titularidade no Conselho.
No que se refere à análise das entrevistas, foram utilizados os preceitos da Análise de Conteúdo clássica, proposto por Bardin (BARDIN, 2011), e um estudo realizado por Silva (SILVA, 2016), seguindo três polos cronológicos: pré-análise – objetiva a organização, na qual foi realizada uma “leitura flutuante” das informações coletadas; compreende ainda a demarcação da constituição de um corpus; o qual passará pela referenciação dos índices e a elaboração de indicadores, para que se chegue à preparação do material, ou seja, a preparação formal.
A etapa seguinte é a exploração do material, que objetiva identificar o núcleo de compreensão do texto para realizar as operações de codificação e alcançar as categorias temáticas. A última fase é o tratamento e interpretação dos resultados, que se caracteriza pela seleção dos resultados, distribuídos nas categorias temáticas observadas nas falas com sua inferência, interpretação e discussão.
A separação das falas dos entrevistados foi realizada por meio da observação e análise do material transcrito sobre as possíveis limitações e/ou os avanços referentes ao cumprimento das suas atribuições. Elas também foram sistematizadas por cada um dos indicadores, para a triangulação dos métodos qualitativo e quantitativo adotado no estudo.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará (CEP-ICS-UFPA), sob o Parecer no 3.738.979/2019.
Resultados e discussão
Participaram do estudo 21 conselheiros do CAE de quatro municípios do estado do Pará. Os dados sociodemográficos apresentados na Tabela 1 mostram que a maioria eram mulheres (71,4%); estavam na faixa etária de 40 a 49 anos (38,1%), média de 42,2 (± 7,8) e tinham mais de 12 anos de estudo (57,1%).
Quanto aos dados sobre a representatividade do CAE, 33,3% correspondiam ao segmento de pais de alunos, 28,6% representantes de entidades de trabalhadores da educação e discentes, 61,9% dos conselheiros ocupavam cadeiras titulares dentro da composição do Conselho.
Esses resultados apontam para a mesma direção de um estudo que caracterizou as condições de trabalho e atuação de conselheiros do CAE em municípios de Minas Gerais e Espírito Santo, que identificou predominância de mulheres, com elevado nível de escolaridade e as representações que mais participaram da pesquisa pertenciam as categorias de trabalhadores da educação e pais de alunos (SOUZA, 2019).
Tabela 1 – Dados sociodemográficos e representatividade dos conselheiros do CAE dos municípios paraenses, 2019
Variáveis | Município A | Município B | Município C | Município D | Total Geral | |||||
N | % | N | % | N | % | N | % | N | % | |
Sexo | ||||||||||
Feminino | 5 | 83,3 | 3 | 75,0 | 2 | 33,3 | 5 | 100,0 | 15 | 71,4 |
Masculino | 1 | 16,7 | 1 | 25,0 | 4 | 66.7 | - | - | 6 | 28,6 |
Faixa etária (anos) | ||||||||||
30 a 39 | - | - | 1 | 25,0 | 1 | 16,7 | 4 | 80,0 | 6 | 28,6 |
40 a 49 | 4 | 66.7 | 1 | 25,0 | 2 | 33,3 | 1 | 20,0 | 8 | 38,1 |
≥ 50 | 2 | 33,3 | 2 | 50,0 | 3 | 50.0 | - | - | 7 | 33,3 |
Escolaridade (anos de estudo) | ||||||||||
9 a 11 | 2 | 33,3 | 1 | 25,0 | 4 | 66,7 | 1 | 20,0 | 8 | 38,1 |
≥ 12 | 4 | 66,7 | 3 | 75,0 | 1 | 16,7 | 4 | 80,0 | 12 | 57,1 |
Não informado | - | - | - | - | 1 | 16,7 | - | - | 1 | 4,8 |
Representatividade do CAE | ||||||||||
Poder Executivo | 1 | 16,7 | 1 | 25,0 | 1 | 16,7 | - | - | 3 | 14,3 |
Trabalhadores da educação e discentes | 1 | 16,7 | 1 | 25,0 | 1 | 16,7 | 3 | 60,0 | 6 | 28,6 |
Pais de aluno | 1 | 16,7 | 1 | 25,0 | 3 | 50,0 | 2 | 40,0 | 7 | 33,3 |
Sociedade civil | 3 | 50,0 | 1 | 25,0 | 1 | 16,7 | - | - | 5 | 23,8 |
Titularidade do CAE | ||||||||||
Titular | 5 | 83,3 | 3 | 75,0 | 3 | 50,0 | 2 | 40,0 | 13 | 61,9 |
Suplente | 1 | 16,7 | 1 | 25,0 | 3 | 50,0 | 3 | 60,0 | 8 | 38,1 |
Fonte: Cecane/UFPA
A Tabela 2 traz as variáveis agrupadas nos Indicadores I e II referentes à composição e à organização documental do CAE. Observa-se que, de modo geral, os Conselhos estavam compostos devidamente pelos representantes dos segmentos (90,5%), foram eleitos segundo as formalidades exigidas (76,2%), e os cargos de Presidência e Vice-Presidência do CAE estavam conforme previstos nas normativas do Pnae (100%).
A adequação do procedimento eletivo foi mencionada como uma potencialidade pelos entrevistados: “o processo eleitoral para composição do Conselho sempre ocorre de acordo com a legislação” (Conselheira A2).
O processo de composição dos conselhos gestores de políticas públicas, a exemplo do CAE, legitimam a gestão democrática por meio da eleição e participação de diferentes segmentos da sociedade nas discussões das ações prioritárias da administração e na fiscalização dos recursos financeiros (LIMA; ALMENARA; SANTOS, 2018). Segundo Bosquilia e Pipitone (2019), a descentralização do Pnae possibilitou, no que se refere à participação da sociedade, a institucionalização do envolvimento de pais de alunos, docentes e representantes da sociedade civil organizada, no exercício do controle social dentro da esfera pública e governamental.
Por outro lado, observa-se ainda que em todos os Conselhos estudados (100%) houve substituição de membros durante o período de vigência do mandato, e a maioria dessas substituições não ocorreu de acordo com os procedimentos legais (52,4%). Nota-se também que em 52,4% das composições não havia representantes de povos e comunidades tradicionais, apesar do fato de que todos os municípios que participaram deste estudo possuírem, entre os atendidos pelo Pnae, alunos indígenas e/ou quilombolas, conforme apresentado na Tabela 2.
Essa fragilidade na permanência dos membros no mandato do Conselho foi destacada nas falas como um constante movimento. Os depoimentos assemelham-se em ambas as regiões estudadas:
Quatro membros pediram desligamento do CAE por falta de tempo para acompanhar as ações, mas já estamos no processo de eleição para substituição dos mesmos e encaminhamento ao FNDE das documentações (Conselheiro B1).
As substituições de alguns membros, como o presidente e o vice-presidente cadastrados no sistema do FNDE, que pediram renúncia do CAE e, apesar, de já ter ocorrido a nova eleição de substituição desses cargos, as documentações comprobatórias ainda não foram enviadas para atualização (Conselheira D1).
Esse processo frequente de renúncias e substituições dos integrantes do CAE pode estar associado, em parte, a limitações de disponibilidade para exercer as atividades no Conselho, em virtude das suas ocupações profissionais particulares. Tal cenário pode vir a dificultar o desempenho institucional e fragilizar a atuação dos conselheiros (CASTRO, 2020).
Tabela 2 – Composição e organização documental dos Conselhos de Alimentação Escolar dos municípios paraenses, 2019
Variáveis | Região Geográfica Intermediária de Belém | Região Geográfica Intermediária de Santarém | Total Geral | |||
N = 10 | N = 11 | N = 21 | ||||
N | % | N | % | N | % | |
Indicador I: Composição do Conselho de Alimentação Escolar | ||||||
Composto com representantes dos seguimentos | ||||||
Sim | 9 | 90 | 10 | 90,9 | 19 | 90,5 |
Não | 1 | 10 | 1 | 9,1 | 2 | 9,5 |
Composto segundo as formalidades | ||||||
Sim | 10 | 100 | 6 | 54,5 | 16 | 76,2 |
Não | - | - | 5 | 45,5 | 5 | 23,8 |
Representante de povos ou comunidades tradicionais | ||||||
Sim | 10 | 100 | - | - | 10 | 47,6 |
Não | - | - | 11 | 100 | 11 | 52,4 |
Presidência e Vice-Presidência compostas pelos segmentos previstos | ||||||
Sim | 10 | 100 | 11 | 100 | 21 | 100 |
Substituição de membros nos casos previstos | ||||||
Sim | 10 | 100 | 11 | 100 | 21 | 100 |
A substituição foi conforme osprocedimentos presumidos | ||||||
Sim | 10 | 100 | - | - | 10 | 47,6 |
Não | - | - | 11 | 100 | 11 | 52,4 |
Indicador II: Organização documental | ||||||
Possui lei de criação atualizada | ||||||
Sim | 10 | 100 | 5 | 45,5 | 15 | 71,4 |
Não | - | - | 6 | 54,5 | 6 | 28,6 |
Possui Regimento Interno | ||||||
Sim | 10 | 100 | 11 | 100 | 21 | 100 |
Não | - | - | - | - | - | - |
Regimento Interno atualizado | ||||||
Sim | 6 | 60 | 6 | 54,5 | 12 | 57,14 |
Não | 4 | 40 | 5 | 45,5 | 9 | 42,86 |
Elabora Plano de Ação | ||||||
Sim | 4 | 40 | - | - | 4 | 19,1 |
Não | - | - | 11 | 100 | 11 | 52,4 |
Parcialmente | 6 | 60 | - | - | 6 | 28,5 |
Elabora relatórios sobre as ações desenvolvidas | ||||||
Sim | 10 | 100 | 11 | 100 | 21 | 100 |
Não | - | - | - | - | - | - |
Recebe os documentos referentes a execução do Pnae | ||||||
Sim | 10 | 100 | 5 | 45,5 | 15 | 71,4 |
Não | - | - | 6 | 54,5 | 6 | 28,6 |
Fonte: Cecane/UFPA.
Os dados sobre a organização documental mostram que a maioria possuía Lei de Criação atualizada (71,4%), tinha Regimento Interno (100%), fornecia informações e elaborava relatórios acerca do acompanhamento do Pnae (100%) e recebia das EEx, sempre que solicitado, todos os documentos referentes à execução do Programa (71,4%), conforme disposto na Tabela 2.
Entretanto, somente 19,1% informaram que elaboravam o Plano de Ação do ano em curso e/ou subsequente a fim de acompanhar as ações nas escolas e demais estruturas pertencentes ao Programa, contendo a previsão de despesas necessárias para o exercício de suas atribuições. A preparação de documentos de trabalho, como o Plano de Ação e o Regimento Interno, caracteriza-se como um dos aspectos fundamentais para que a participação cidadã possa se concretizar, pois é por meio desses instrumentos que o CAE irá conduzir e normatizar suas ações.
O Regimento Interno é um instrumento legal no qual são estabelecidas as regras de funcionamento do CAE. Nele encontram-se as atribuições do Conselho, sua composição, mandato, critérios para eleição dos representantes, normas próprias, condições de funcionamento e demais disposições legais (BRASIL, 2017). Apesar de todos os Conselhos estudados possuírem essa formalização legal, uma parcela expressiva não havia atualizado o referido documento (42,86%): “fazer a atualização do nosso Regimento Interno, pois o último foi escrito em 2007 e está com artigos errados no que se refere ao período de vigência do Conselho” (Conselheiro C1).
Em relação à elaboração do Plano de Ação, essa é uma das atribuições que compete ao CAE, conforme estabelecido na Resolução CD/FNDE no 26/2013 (BRASIL, 2013). Os conselheiros entrevistados destacaram limitações para documentar e orçar o planejamento das ações prioritárias:
Em relação ao Plano de Ação não estamos aptos a orçar ou prever os custos das atividades (Conselheira A1).
O plano de ação não foi elaborado devido o desconhecimento dos conselheiros de como elaborar (Conselheiro C1).
O discurso dos conselheiros das duas regiões que participaram do estudo apontou desconhecimento sobre aspectos burocráticos e instrumentos legais para a elaboração de documentos que envolve as funções do CAE. Essas limitações reforçam a necessidade de treinamentos e capacitações constantes dos conselheiros, visando ao domínio adequado sobre todo o processo de acompanhamento da execução do Programa.
Tal necessidade também foi identificada no estudo de Castro et al., 2020, em que 92% dos entrevistados afirmaram ser imprescindível o apoio quanto à capacitação para subsidiar o desenvolvimento de suas atividades nos Conselhos e aumentar a possibilidade de um efetivo controle social da política de alimentação escolar.
Pinheiro e Araújo (2017) evidenciam que o controle social deve ser composto por atores que dominem as suas atribuições e competências em atendimento as diretrizes do Pnae, já que a institucionalização dos Conselhos funciona como canal para a inserção do debate de pautas coletivas – como discussões sobre as temáticas de SAN e Dhana – na atmosfera governamental e não governamental.
Com relação às atribuições de acompanhamento e fiscalização da aplicação e transparência dos recursos financeiros, expostas na Tabela 3, os resultados apontam de forma positiva que os conselheiros desenvolveram todas as atividades estabelecidas na Lei no 11.947/2009 e na Resolução CD/FNDE no 26/2013 no que se refere ao monitoramento e à fiscalização da aplicação dos recursos (71,4%), ao monitoramento das diretrizes e objetivos do Programa (71,4%), à emissão do Parecer Conclusivo sobre a execução financeira no Sistema de Gestão dos Conselhos (Sigecon) (76,2%).
Destaca-se ainda que 100% dos Conselhos realizavam reunião específica para apreciação da prestação de contas com a participação de, no mínimo, 2/3 dos conselheiros titulares, e 52,4% dos conselheiros informaram que analisavam o Relatório de Acompanhamento da Gestão do Pnae, emitido pela gestão, antes da elaboração e do envio do parecer conclusivo do CAE.
Tabela 3 – Acompanhamento da aplicação e transparência dos recursos financeiros e infraestrutura dos Conselhos de Alimentação Escolar dos municípios paraenses, 2019
Variáveis | Região Geográfica Intermediária de Belém | Região Geográfica Intermediária de Santarém | Total Geral | |||
N = 10 | N = 11 | N = 21 | ||||
N | % | N | % | N | % | |
Indicador III: Aplicação e transparência dos recursos financeiros | ||||||
Monitora e fiscaliza a aplicação dos recursos | ||||||
Sim | 10 | 100 | 5 | 45,5 | 15 | 71,4 |
Parcialmente | - | - | 6 | 54,5 | 6 | 28,6 |
Monitora e fiscaliza as diretrizes e objetivos do Pnae | ||||||
Sim | 10 | 100 | 5 | 45,5 | 15 | 71,4 |
Não | - | - | 6 | 54,5 | 6 | 28,6 |
Analisa o Relatório de Acompanhamento da Gestão | ||||||
Sim | 6 | 60 | 5 | 45,4 | 11 | 52,4 |
Não | 4 | 40 | 4 | 36,4 | 8 | 38,1 |
Parcialmente | - | - | 2 | 18,2 | 2 | 9,5 |
Emite parecer conclusivo sobre a prestação de contas | ||||||
Sim | 10 | 100 | 6 | 54,5 | 16 | 76,2 |
Não | - | - | 5 | 45,5 | 5 | 23,8 |
Realiza reunião para apreciação da prestação de contas | ||||||
Sim | 10 | 100 | 11 | 100 | 21 | 100 |
Indicador IV: Infraestrutura do CAE | ||||||
Possui local apropriado para as reuniões | ||||||
Sim | 10 | 100 | - | - | 10 | 47,6 |
Não | - | - | 11 | 100 | 11 | 52,4 |
Disponibilidade de equipamento de informática | ||||||
Sim | 10 | 100 | 10 | 47,6 | ||
Não | - | - | 11 | 100 | 11 | 52,4 |
Conta com transporte para deslocamento dos membros | ||||||
Sim | 10 | 100 | 5 | 45,5 | 15 | 71,4 |
Parcialmente | - | - | 6 | 54,5 | 6 | 28,6 |
Disponibilidade de recursos humanos | ||||||
Sim | 10 | 100 | 10 | 47,6 | ||
Não | - | - | 11 | 100 | 11 | 52,4 |
Disponibilidade de recursos financeiros | ||||||
Sim | 8 | 80 | - | - | 8 | 38,1 |
Parcialmente | 2 | 20 | - | - | 2 | 9,5 |
Não se aplica | - | - | 11 | 100 | 11 | 52,4 |
Fonte: Cecane/UFPA.
As ações de acompanhamento da aplicação e transparência dos recursos financeiros pelos CAEs também foram estudadas por Bueno et al. (2019), que encontraram resultados semelhantes aos indicados na Tabela 3, em que a maioria dos membros cumpriam as atividades de fiscalização dos recursos, analisavam os relatórios e emitiam o parecer conclusivo sobre a prestação de contas.
Em ambas as regiões estudadas evidenciaram-se pontos práticos referente a esse mapeamento da utilização orçamentária:
Temos um diálogo aberto e uma relação de parceria com a gestão municipal para os esclarecimentos (Conselheira A2).
Recebemos trimestralmente os documentos para acompanhar os repasses do PNAE (Conselheiro A3).
(Contudo, alguns desafios foram ilustrados nas falas de outros conselheiros)
Realizamos a prestação de contas, porém não tenho conhecimento sobre pregão, tenho dúvidas. Acredito que o trabalho do CAE fica difícil sem conhecimento do processo (Conselheira A1).
Tenho dificuldades de realizar a análise das documentações disponibilizadas pela gestão municipal por não ter domínio de termos financeiro-contábeis e pelo fato de nunca ter participado de treinamentos ou capacitações referentes ao acompanhamento da política (Conselheira D1).
Tais achados refletem a importância de os conselheiros participarem em formações da execução do Pnae, bem como de temas que possuam interfaces com o Programa. O conhecimento dos valores repassados pelo FNDE permite ao Conselho um melhor acompanhamento da sua aplicação e, consequentemente, facilitará a prestação de contas.
De acordo com o disposto no art. 36 da Resolução CD/FNDE no 26/2013, cabe às EEx realizarem, em parceria com o FNDE, a formação dos conselheiros sobre a execução do Pnae e temas afins. Como também compete ao Nutricionista Responsável Técnico (RT) prestar assessoria ao CAE, conforme estabelecido no art. 3o da Resolução do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN) no 465/2010 (CFN, 2010).
Para Ferreira et al. (2019), proporcionar espaços de trocas de experiências, qualificação e formações de aprimoramento aos atores sociais do Pnae caracteriza-se como uma estratégia potente de fortalecimento da atuação do CAE como órgão fiscalizador da alimentação escolar.
Em relação à periodicidade de reuniões do Conselho durante o ano, não há definições nas legislações do Pnae do número mínimo ou máximo de encontros necessários. Entretanto, acredita-se que seja essencial a realização de reuniões mensais ou, pelo menos, encontros a cada dois ou três meses, visando ao adequado exercício de suas atribuições (SOUZA, 2015).
A dificuldade de se reunir periodicamente foi pontuada pelos entrevistados deste estudo: possuímos dificuldades de obter o quórum mínimo para as reuniões e tomadas de decisões, pois alguns membros moram nas ilhas e têm dificuldade de acesso à sede municipal. (Conselheira B2).
Os dados sobre o funcionamento e a infraestrutura do CAE, agrupados no Indicador IV, revelaram que a maior parte dos Conselhos não contava com local apropriado para as reuniões (52,4%), com disponibilidade de equipamentos de informática (52,4%), nem com recursos humanos (52,4%), necessários às atividades inerentes às suas competências e atribuições, para que pudessem desenvolver as ações de forma efetiva, conforme demonstrado na Tabela 3. Esses resultados predominam nos municípios pertencentes a R. G. I. Santarém.
De acordo com o art. 17, da Lei no 11.947/2009, e o art. 36, da Resolução CD/FNDE no 26/2013, é de competência da gestão municipal fornecer toda a infraestrutura necessária à plena execução das atividades de competência do CAE. Entretanto, observa-se nos achados deste estudo que, mesmo com essa previsão legal, as EEx não têm disponibilizado aos Conselhos os recursos necessários ao desenvolvimento de suas funções.
Essas limitações estruturais foram evidenciadas nas entrevistas pelos conselheiros, das duas regiões intermediárias, como um desafio no cumprimento de suas atribuições:
Nosso desafio é orçamento para efetivação das atividades planejadas no Plano de Ação, principalmente falta de recursos financeiros para deslocamento dos membros aos locais das reuniões, já que a maioria reside em áreas distantes da Casa de Conselhos (Conselheira A2).
[...] Nossa limitação é somente com a logística de transporte para visitar as escolas rurais localizadas em áreas ribeirinhas (Conselheira B2).
O conselho não possui um local apropriado, com equipamento de informática para as reuniões. Entretanto, a gestão disponibiliza, quando necessário, uma sala na Secretaria Municipal de Educação (Conselheira D2).
Outra observação desta pesquisa refere-se às funções pertinentes ao CAE para o controle da qualidade e aceitabilidade dos cardápios ofertados na alimentação escolar. Na Tabela 4, os resultados mostram que 100% dos conselheiros recebiam da gestão municipal os cardápios para conhecimento, e a maioria zelava pela aceitabilidade das refeições oferecidas aos estudantes (71,4%).
Constata-se também que 100% dos membros dos CAEs cuidavam da qualidade nutricional e higiênico-sanitária dos alimentos ofertados na alimentação escolar e 71,4% realizavam a supervisão do serviço de alimentação nas escolas.
Tabela 4 – Ações executadas pelos conselheiros de alimentação escolar para o controle da qualidade e aceitabilidade dos cardápios, 2019
Indicador V: Qualidade e aceitabilidade dos cardápios | ||||||
Variáveis | Região Geográfica Intermediária de Belém | Região Geográfica Intermediária de Santarém | Total Geral | |||
N = 10 | N = 11 | N = 21 | ||||
N | % | N | % | N | % | |
Entidade Executora apresenta os cardápios para o CAE | ||||||
Sim | 10 | 100 | 11 | 100 | 21 | 100 |
Supervisiona o serviço de alimentação nas escolas | ||||||
Sim | 10 | 100 | 5 | 45,5 | 15 | 71,4 |
Não | - | - | 6 | 54,5 | 6 | 28,6 |
Zela pela qualidade dos alimentos | ||||||
Sim | 10 | 100 | 11 | 100 | 21 | 100 |
Zela pela aceitabilidade dos cardápios oferecidos | ||||||
Sim | 4 | 40 | 11 | 100 | 15 | 71,4 |
Não | 6 | 60 | - | - | 6 | 28,6 |
Fonte: Cecane/UFPA.
O acompanhamento do CAE na definição dos cardápios facilita o processo de monitoramento da aquisição de alimentos, assim como a verificação da composição em relação à adequação aos hábitos alimentares locais, a utilização de produtos agrícolas regionais e a restrição de produtos ultraprocessados. Tais aspectos são reforçados pelos relatos dos conselheiros de ambas as regiões:
As visitas são importantes para identificar inconformidades no cardápio, como identificado na oferta de doces acima do recomendado na legislação (Conselheira A2).
Zelamos pela aceitabilidade dos cardápios, inclusive o cardápio não contempla mais produtos enlatados, mesmo para as comunidades ribeirinhas (Conselheira B2).
Fazemos o acompanhamento da execução do Pnae nas escolas para verificar a qualidade dos cardápios servidos e já conseguimos verificar melhoras quanto ao fornecimento de alimentos produzidos pela agricultura familiar (Conselheira D1).
Para Pinheiro e Araújo (2017), cabe ao CAE zelar de forma universal pela qualidade da alimentação escolar, desde o processo de aquisição dos gêneros alimentícios, as boas práticas de manipulação dos alimentos, até o fornecimento das preparações aos estudantes.
No Gráfico 1, os dados indicam o percentual de respostas positivas dos conselheiros de alimentação escolar, por região intermediária, em relação ao cumprimento das variáveis agrupadas nos cinco indicadores. Observa-se que os indicadores referentes ao processo de composição do Conselho, à aplicação dos recursos financeiros e à infraestrutura do CAE obtiveram 100% de respostas afirmativas nos Conselhos pertencentes à R. G. I. Belém.
Por outro lado, verifica-se que nos Conselhos que correspondem à R. G. I. Santarém, o cumprimento dessas atribuições apresenta algumas dificuldades em sua totalidade, sendo que as variáveis relacionadas às questões de estrutura física do CAE apresentaram maior fragilidade, alcançando somente 20% das respostas positivas (Gráfico 1).
Destaca-se que os aspectos estruturais, de logística e recursos humanos necessários ao CAE para a realização das suas atribuições são de responsabilidade da gestão municipal (BRASIL, 2013, 2017). Vários autores apontam que a ausência ou a limitada disponibilidade desses recursos contribui de forma significativa para a não execução das atividades que competem aos conselheiros no âmbito do Pnae e enfraquece o monitoramento efetivo e constante das ações do governo na gestão do Programa (SILVA; SANTOS; SOARES, 2018; BUENO et al., 2019; CASTRO et al., 2020; PEDRAZA et al., 2018).
Gráfico 1 – Percentual das respostas positivas dos conselheiros, por região intermediária, em relação às variáveis de cada indicador
Fonte: Cecane/UFPA
No que se refere ao desenvolvimento das atividades para o acompanhamento e controle da qualidade e aceitabilidade dos cardápios ofertados na alimentação escolar, os Conselhos das duas regiões responderam afirmativamente que executavam 75% das ações agrupadas no Indicador V, o que demonstra comprometimento dos conselheiros em garantir o direito dos estudantes de receber uma alimentação saudável e de qualidade, além de exercer a participação cidadã no gerenciamento da Política Pública (Gráfico 1).
A institucionalização de Conselhos atuantes, participativos e decisivos favorece a politização democrática do cidadão no aprimoramento de práticas sociais de interesse coletivo, na defesa das políticas públicas e na garantia de direitos constitucionais (BARDDAL; TORRES, 2020).
Conclusão
Os resultados encontrados neste estudo indicam que a maioria dos Conselhos Municipais de Alimentação Escolar está funcionando conforme determinam as legislações vigentes que regem o Pnae. Destaca-se, nesse sentido, o acompanhamento e a fiscalização dos recursos por parte dos Conselhos.
Os conselheiros cumprem suas atribuições dentro do esperado e possuem conhecimento sobre o papel fundamental que desenvolvem na execução dessa política promotora da SAN no Brasil.
Porém, observou-se alguns entraves para o desenvolvimento e a articulação de algumas atividades que competem aos conselheiros, principalmente no que se refere ao processo de composição, funcionamento e infraestrutura do CAE.
Assim, tomando como base as principais dificuldades relatadas pelo controle social, verificou-se que é de fundamental importância a participação dos conselheiros em ações estratégicas de formações e capacitações continuadas sobre aspectos gerais de execução do Pnae e suas atribuições. É essencial que os membros do Conselho recebam apoio técnico da gestão municipal com a disponibilidade da infraestrutura necessária às suas demandas.
Desse modo, esta pesquisa pode servir como base para o fortalecimento desses Conselhos, contribuindo com a operacionalização e a efetividade do Programa em seus municípios.
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Jucilene Magalhães Alves Sousa Mestre em Saúde na Amazônia. Universidade Federal do Pará, Faculdade de Nutrição, Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição Escolar, Departamento de Nutrição, Av: Generalíssimo Deodoro, 01, Umarizal, Belém – Pará – Brasil, 66050-160, telefone: (91)983371857 - (91)991001923. E-mail: jucilene_lie@hotmail.com (autor de correspondência) ID Lattes: http://lattes.cnpq.br/5112510062144981 ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1481-6353 Marcos Valério Santos da Silva Doutor em Ciências Farmacêuticas. Professor. Universidade Federal do Pará, Faculdade de Farmácia, Centro Universitário-Campos UFPA, Rua Augusto Corrêa, 01, Guamá, Belém – Pará – Brasil, 66075-110. E-mail: marcossilva@ufpa.br ID Lattes: http://lattes.cnpq.br/0379783635000306 ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7824-0042 Andréa das Graças Ferreira Frazão Doutora em Doenças Tropicais. Professora. Universidade Federal do Pará, Faculdade de Nutrição, Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição Escolar, Departamento de Nutrição, Av.: Generalíssimo Deodoro, 01, Umarizal, Belém – Pará – Brasil, 66050-160. E-mail: deabrelaz@gmail.com ID Lattes: http://lattes.cnpq.br/5712188054153873 ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0746-9533 Ivanira Amaral Dias Doutora em Neurociências e Biologia Celular. Professora. Universidade Federal do Pará, Faculdade de Nutrição, Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição Escolar, Departamento de Nutrição, Av.: Generalíssimo Deodoro, 01, Umarizal, Belém – Pará – Brasil, 66050-160. E-mail: ivanira@ufpa.br ID Lattes: http://lattes.cnpq.br/9277043318765721 ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1928-523X |
Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 17, 1-21, e023008, jan./dez. 2023 • ISSN 1984-9834