Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade
Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 19, 1-26, e025011, jan./dez. 2025 • ISSN 1984-9834
Artigo original • Revisão por pares • Acesso aberto
Industrialização verde e a relação Brasil-China: definições, parcerias e assimetrias
Green Industrialization and Brazil-China Relations: definitions, partnerships, and asymmetries
Maria Beatriz Peixoto Mello
Resumo Este artigo tem como objetivo discutir os recentes processos de industrialização verde no Brasil e na China, analisando-os no contexto das relações comerciais entre as duas nações. O trabalho é desenvolvido em três seções principais, além da introdução e das considerações finais. Primeiro, examina-se a relação comercial assimétrica entre Brasil e China, destacando a primarização da economia brasileira em contraste com a robusta industrialização do mercado chinês. Em seguida, explora-se como a ideia de indústrias verdes foi construída no cenário internacional e como Brasil e China estão incorporando esse conceito em suas políticas nacionais. Por fim, o artigo apresenta como a indústria verde já faz parte da relação comercial Brasil-China, além de desenvolver algumas reflexões sobre como a China poderá se inserir no processo brasileiro de industrialização verde e vice-versa. Palavras-chave: Indústria verde. Industrialização verde. Brasil. China. Relações comerciais. Transição energética. Abstract This article aims to discuss the recent processes of green industrialization in Brazil and China, analyzing them within the context of trade relations between the two nations. The study is organized into three main sections, in addition to the introduction and final considerations. First, it examines the asymmetric trade relationship between Brazil and China, highlighting the primary-export-oriented nature of the Brazilian economy in contrast to the strong industrialization of the Chinese market. Next, it explores how the concept of green industries has been constructed in the international arena and how Brazil and China are incorporating this idea into their national policies. Finally, the article presents how the green industry is already part of Brazil-China trade relations and reflects on how China might engage in Brazil's green industrialization process and vice versa. Keywords: Green industry. Green industrialization. Brazil. China. Trade relations. Energy transition. | Submissão: Aceite: Publicação: |
Citação sugerida MELLO, Maria Beatriz Peixoto. Industrialização verde e a relação Brasil-China: definições, parcerias e assimetrias Revista IDeAS, Rio de Janeiro, v. 19, p. 1-26, e025011, jan./dez. 2025. Licença: Creative Commons - Atribuição/Attribution 4.0 International (CC BY 4.0). |
Introdução
Em 2024, se comemorou os 50 anos das relações diplomáticas entre Brasil e China. Nos últimos 20 anos, essa relação se fortaleceu significativamente, com o aumento dos laços comerciais entre os dois países e com a China se tornando principal parceiro econômico do Brasil (Cariello, 2021; ApexBrasil, 2024). No entanto, essa relação é assimétrica, refletindo uma forte dependência da economia primária brasileira em relação ao mercado chinês, que é altamente industrializado (Svampa; Slipak, 2015; Garcia et al., 2023). Este artigo busca analisar essa dinâmica à luz da crescente demanda por indústrias verdes na agenda ambiental e climática global. A industrialização verde, que envolve o desenvolvimento de empreendimentos sustentáveis com impacto ambiental reduzido (UNIDO, 2011), é vista como um caminho crucial para a descarbonização da economia global e também uma solução para a crise climática planetária.
Para tanto, o trabalho está estruturado em três seções, além desta introdução e das considerações finais. Primeiro, é examinada a relação comercial entre Brasil e China, destacando a reprimarização e desindustrialização da economia brasileira em contraste com a industrialização chinesa. Em seguida, é analisada a construção da ideia de indústrias verdes no cenário internacional e como ambos os países estão incorporando esse conceito em suas políticas nacionais, considerando a particularidade das suas economias. Como um terceiro movimento, o artigo realiza uma reflexão sobre o potencial da agenda de industrialização verde para a relação comercial entre China e Brasil, considerando os possíveis impactos práticos desses processos.
A relação comercial Brasil-China
O ano de 2024 marcou os 50 anos das relações diplomáticas entre a República Popular da China e a República Federativa do Brasil. Todavia, o comércio é o pilar das relações entre os dois países, especialmente a partir das últimas duas décadas, com a China sendo o principal parceiro comercial brasileiro desde 2009 (Garcia et al., 2023; ApexBrasil, 2024). Em 2023, por exemplo:
o comércio do Brasil com a China somava US$ 157,5 bilhões e representava 27,1% do comércio externo brasileiro, proporção maior, inclusive, do que o intercâmbio brasileiro com os 27 países da União Europeia, de 15,8% (ApexBrasil, 2024, p. 25, grifo próprio).
No entanto, há uma grande assimetria entre os produtos que o Brasil exporta para a China e os que importa do seu maior parceiro comercial. Muitos pesquisadores apresentam que as relações comerciais com a China se assemelham à divisão tradicional do trabalho: isto é, países que historicamente têm participação na economia internacional com fornecimento de commodities e produtos de baixo valor agregado mantêm essa mesma dinâmica no comércio com a China (Svampa; Slipak, 2015; Jaguaribe, 2018; Garcia et al., 2023).
Esse é o caso do Brasil. O Mapa Bilateral de Comércio e Investimentos Brasil-China da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil, 2024) demonstra que as principais exportações do Brasil para a China são produtos primários, especialmente soja, petróleo bruto, minério de ferro e carne (Figura 1). Já as principais importações brasileiras oriundas da China são uma ampla gama de produtos manufaturados de indústrias mais desenvolvidas, incluindo máquinas e aparelhos elétricos, veículos e equipamentos de telecomunicações (Figura 2).
Figura 1 - Principais exportações do Brasil para a China (2023)
Legenda: CMA = Crescimento Médio Anual. Fonte: ApexBrasil (2024).
Figura 2 - Principais importações do Brasil oriundas da China (2023)
Legenda: CMA = Crescimento Médio Anual. Fonte: ApexBrasil (2024).
A primarização da economia brasileira e a reduzida participação industrial também se refletem nos investimentos chineses no país. De acordo com o Conselho Empresarial Brasil-China (Cariello, 2024), os investimentos da China somaram US$ 1,73 bilhão em 2023 no território brasileiro e os principais setores de projetos foram energia e extração (petróleo, gás natural, minerais etc.). A indústria manufatureira do Brasil correspondeu a apenas 7% dos investimentos chinesas (Figura 3).
Figura 3 - Divisão setorial dos investimentos chineses no Brasil (2007-2023)
Fonte: Cariello (2024).
Nas últimas décadas, a relação comercial entre Brasil e China se fez tão forte que a economia brasileira se tornou altamente dependente do mercado chinês. A China corresponde a 27,1% do comércio externo brasileiro, enquanto o Brasil representa 1,7% das exportações chinesas (ApexBrasil, 2024). Oito dos principais produtos vendidos pelo Brasil para a China dependem do país asiático para mais de 20% de suas exportações (Figura 4). “Alguns casos são ainda mais extremos: em 2023, mais de 60% da soja, do minério de ferro e da carne bovina exportada pelo Brasil teve a China como destino” (ApexBrasil, 2024, p. 27). Essas exportações brasileiras corresponderam a 4,8% da economia chinesa no mesmo ano de 2023.
Figura 4 - Dependência brasileira do mercado chinês (2023)
Fonte: ApexBrasil (2024).
A relação comercial entre os dois países não é assimétrica apenas pela forte dependência da economia brasileira com o mercado chinês, mas também pela cadeia de valor dos produtos que são comercializados entre as nações. Como discutido anteriormente nesta seção, a “divisão de trabalho” nessa relação comercial entre Brasil e China coloca a maior economia sul-americana como especializada na produção e exportação de commodities e outros produtos de baixa complexidade tecnológica, enquanto a maior economia do mundo exporta para o Brasil manufaturados, produtos de maior tecnologia e com maior valor agregado – produtos estes que, em sua maioria, são produzidos com as commodities e matérias-primas exportadas por países como o próprio Brasil.
De modo algum a primarização da economia brasileira é uma novidade oriunda da relação comercial com a China (Svampa; Slipak, 2015). Pelo contrário, o Brasil passou desde o final da década de 1980 por um processo de desindustrialização (Figura 5) e de reprimarização, que se fortaleceu muito durante os anos 2000 com o chamado boom das commodities – quando o preço em dólar do petróleo e de diversos minerais aumentou –, e que também foi marcado por relações comerciais assimétricas com outros países, em especial Estados Unidos e nações europeias. Entretanto, o rápido e expansivo crescimento da relação comercial Brasil-China nas últimas décadas é baseado “na demanda por commodities e na rápida consolidação de um intercâmbio desigual [...], [o que marca] [...] o surgimento de novas relações de dependência [com a China]” (Svampa; Slipak, 2015, p. 50, tradução própria) e intensifica ainda mais o processo de desindustrialização da economia brasileira (Garcia et al., 2023).
Figura 5 - Participação da indústria no PIB brasileiro (1947-2023)
Fonte: CNI (2025).
Importante destacar também que a relação comercial entre Brasil e China é pautada principalmente por uma economia “marrom”, com processos de exploração extensiva e intensiva da natureza: atividades econômicas que são insustentáveis, altamente emissoras de gases de efeito estufa (GEE) – causadores e ampliadores da crise climática planetária – e de outros poluentes, bem como geradoras de grandes conflitos socioambientais nos territórios. Todavia, cresce cada vez mais uma demanda internacional pela construção de uma economia verde, com uma agenda de transição para uma economia de baixo carbono e de geração de energias, indústrias e industrializações “verdes” (Mello, 2024). Para a China, isso implicaria a necessidade de “esverdear” os seus processos industriais, mas também pode apresentar a possibilidade de um novo mercado de exportação. Para o Brasil, essa agenda internacional pode incentivar um processo de reindustrialização do país, de criação de um novo mercado e de diminuição da dependência da sua economia em atividades primárias e exploratórias.
Nessa conjuntura, nos últimos anos, a China vem assumindo a posição de maior investidor em energias renováveis em escala global, sendo responsável por 1/3 dos investimentos no mundo inteiro (IEA, 2024). O Brasil tem sido destino de diversos empreendimentos chineses nessa área, com iniciativas em hidrelétricas, energias solar e eólica, baterias elétricas, painéis fotovoltaicos, veículos elétricos, entre outras (Cariello, 2024) – esses dados serão apresentados com maior detalhe mais adiante.
Mas o que a atual “agenda verde” pode implicar para a relação comercial Brasil-China? O que o processo de industrialização verde pode impactar ou já está impactando nos laços econômicos entre os dois países? Antes de realizar essa reflexão mais a fundo, é preciso apresentar o que cada país entende por “indústria verde”.
O que é uma industrialização verde?
Para tratar da ideia de indústrias verdes (ou de uma industrialização verde), esta seção fará três movimentos: primeiro, a construção dos conceitos no âmbito internacional, em especial pela Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO, United Nations Industrial Development Organization); segundo, a perspectiva de industrialização verde a partir da nova política brasileira de “neoindustrialização” – que será detalhada mais adiante –; e, terceiro, o entendimento do Estado chinês sobre o que seria uma indústria verde.
Uma das primeiras tentativas em âmbito internacional de conceituar o que é uma indústria verde se deu no relatório UNIDO Green Industry: Policies for supporting Green Industry (2011). O documento da UNIDO define indústrias verdes como as que:
promovem padrões sustentáveis de produção e consumo, ou seja, padrões que são eficientes em termos de recursos e energia, com baixa emissão de carbono e baixo desperdício, não poluentes e seguros, e que produzem produtos que são gerenciados de maneira responsável ao longo de seu ciclo de vida (UNIDO, 2011, p. 9, tradução própria, grifos próprios).
Assim, a industrialização verde pode ter duas dimensões (UNIDO, 2011; Luken; Clarence-Smith, 2019). Primeiramente, as indústrias tornam-se “verdes” ao reduzir os impactos ambientais dos processos industriais e produtos – por exemplo, a descarbonização da indústria. A segunda dimensão seria a criação de novas indústrias e empreendimentos “verdes”, isto é, empreendimentos que ofereçam bens e serviços ambientais. Indústrias de produção de equipamentos necessários para a produção de energia renovável (painéis solares, turbinas eólicas etc.) são exemplos de empreendimentos “verdes” e, por conseguinte, de indústrias verdes. Outro exemplo é uma agroindústria produtora de energia de biomassa, bem como certificados/certificadoras ambientais e empreendimentos “verdes” de “esverdeamento” da indústria. Portanto, uma industrialização verde envolve o desenvolvimento industrial e a promoção de empreendimentos que buscam viabilizar a sustentabilidade ambiental do setor.
Porém, com o crescimento da agenda internacional sobre mudanças climáticas nas últimas décadas, se fortalece a preocupação com o papel das indústrias na geração dessa crise planetária (Figura 6). Com isso, as indústrias verdes têm tido cada vez mais um enfoque maior nessa temática, sendo apresentadas como um processo importante para a construção de uma economia de baixo carbono e um caminho para solucionar a crise climática planetária (Mello, 2024).
Figura 6 - Emissões globais de CO2 por setor (2019-2022)
Fonte: IEA (2023a).
Para países emergentes e em desenvolvimento – como ainda se categorizam o Brasil e a China –, o desenvolvimento de indústrias verdes também é visto como um processo capaz de conciliar crescimento econômico com preocupações ambientais e climáticas (Luken; Clarence-Smith, 2019; Mello, 2024). A seguir, será desenvolvido o que o Brasil e a China entendem por um processo de industrialização verde.
O atual “entendimento brasileiro” de uma indústria verde é bastante relacionado a essa preocupação climática, mas unido ao interesse nacional de desenvolver a reindustrialização da sua economia, presente na política nomeada como Nova Indústria Brasil (Mello, 2024; Brasil, 2025a). Portanto, a indústria verde para o Brasil seria a promoção do desenvolvimento nacional com uma industrialização de baixo carbono.
Conforme mencionado anteriormente, a economia brasileira vive um processo de desindustrialização desde o final da década de 1980, o que também traz implicações para o setor industrial no perfil brasileiro de emissões de GEE. Segundo o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG) (TSAI et al., 2023), processos industriais e uso de produtos representaram apenas 3% das emissões totais do país em 2022. Ainda assim, a indústria no Brasil é responsável por 29% das emissões em energia (3º setor mais poluidor do país) e em processos industriais e uso de produtos (PIUP), o que indica que a atividade industrial é um setor poluidor da economia nacional (Figuras 7 e 8).
Figura 7 - Emissões de GEE nos setores de energia e PIUP (1970-2022)
Legenda: vermelho = energia; laranja = PIUP; pontilhado = total (energia + PIUP).
Fonte: TSAI et al. (2023).
Figura 8 - Participação dos setores da economia no total de GEE emitido em 2022
Legenda: laranja = transportes; cinza = indústria; vermelho = edificações; azul = produção de combustíveis; verde-claro = geração de energia; verde-água = agropecuária. Fonte: TSAI et al. (2023).
O relatório da organização Climate Tracker, Industrialização verde no Brasil (Mello, 2024), traz uma entrevista com Lucas Ramalho Maciel, atual diretor do Departamento de Novas Economias da Secretaria de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Nessa entrevista, o diretor destaca que a descarbonização é “a vertente mais importante numa industrialização verde” (Mello, 2024, p. 6). Mas a industrialização verde brasileira também possui outra importante dimensão: a bioeconomia (ou bioindústria), isto é, um modelo de produção industrial baseado no uso de “recursos biológicos em substituição às matérias-primas fósseis” (Mello, 2024, p. 11).
Essa noção de indústria e industrialização verdes faz parte da mais recente política industrial do governo brasileiro: a neoindustrialização, também apresentada como Nova Indústria Brasil (NIB) (Máximo, 2024).
A Nova Indústria Brasil (NIB) é a política de neoindustrialização a ser implementada pelo governo federal nos próximos dez anos. A NIB foi elaborada por meio de um amplo diálogo nos grupos de trabalho do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) e parte de três premissas. Primeiramente, o fortalecimento da indústria brasileira é chave para o desenvolvimento sustentável do Brasil, do ponto de vista social, econômico e ambiental. Em segundo lugar, o Brasil passou a enfrentar um processo de desindustrialização precoce e acelerado a partir dos anos 1980, com primarização da estrutura produtiva e encurtamento e fragilização dos elos das cadeias. Terceiro, as exportações do país estão concentradas em produtos de baixa complexidade tecnológica, limitando os ganhos de comércio do Brasil (Brasil, 2025a, p. 5, grifos próprios).
O programa previa inicialmente um montante de investimentos de R$ 300 bilhões de recursos públicos até 2026. Porém, em janeiro de 2025, a NIB já contou com R$ 506,7 bilhões em investimentos públicos, totalizando R$ 3,4 trilhões em recursos públicos e privados, em diferentes segmentos, incluindo a agroindústria, o setor automotivo, a bioeconomia e as energias renováveis (ABDE, 2025; Brasil, 2025b).
O plano de ação da NIB (2024-2026) apresenta seis missões (Brasil, 2025a). A quinta missão, “Bioeconomia, descarbonização e transição e segurança energéticas para garantir os recursos para as gerações futuras”, traz a centralidade da indústria verde para a neoindustrialização brasileira. Dentre os objetivos específicos da missão, inclui-se a intenção de “adensar” cadeias industriais para a transição energética e de expandir a capacidade produtiva da indústria brasileira, por meio da “produção e adoção de insumos, inclusive materiais e minerais críticos, tecnologias e processos de baixo carbono, com eficiência energética” (Brasil, 2025a, p. 82).
A quinta missão da NIB também traz as seguintes metas: (1) ampliar em 27% a participação de biocombustíveis e elétricos na matriz energética de transportes em 2026 e em 50% em 2033; e (2) aumentar em 10% o uso tecnológico e sustentável da biodiversidade até 2026 e em 30% em 2033 (Brasil, 2025a). Segundo o Balanço Energético Nacional (BEN) de 2024, realizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE, 2024), os combustíveis mais consumidos no setor de transportes brasileiro ainda são óleo diesel (43.4%) e gasolina (27.8%), seguidos do etanol (17.3%) e do biodiesel (5.2%).
Os “instrumentos específicos” definidos para a quinta missão vão desde a implementação de uma estratégia nacional de certificação e avaliação da conformidade socioambiental dos produtos e serviços brasileiros (uma espécie de “selo verde”) até o desenvolvimento de soluções tecnológicas para a diminuição da pegada de carbono da indústria nacional, incluindo tecnologias de captura de carbono. Os instrumentos relacionados no plano de ação da NIB também incluem a adoção de um mercado regulado de carbono – o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa, estabelecido em lei (Brasil, 2024a) –; o estímulo à geração de energias renováveis – especialmente biomassa/biocombustíveis, eólica, solar e hidrogênio de baixa emissão de carbono –; e o “desenvolvimento de tecnologias sustentáveis de exploração e produção de minerais estratégicos” (Brasil, 2025a, p. 83).
Desse modo, o componente de industrialização verde dessa política visa promover a reindustrialização da economia brasileira por meio de estratégias e instrumentos de baixa emissão de carbono, integrando o setor produtivo nas dinâmicas nacional e global de transição energética. Isto é, a NIB pode servir como instrumento doméstico para acelerar a descarbonização industrial e a transição energética, mas também como mecanismo de inserção competitiva do Brasil no mercado global de energias limpas, seja via exportação de commodities, seja através de bens manufaturados e ativos industriais sustentáveis.
O que significa indústria verde para a segunda maior economia do mundo e, atualmente, o maior emissor de GEE? A China corresponde a 31,1% das emissões globais de combustíveis fósseis (IEA, 2023b), e seu setor industrial cumpre um grande papel nessa conjuntura. Os bens manufaturados correspondem a 92% das exportações chinesas e a indústria do gigante asiático representa 35% da produção mundial (Banco Mundial, 2024). Os setores da indústria e da energia (Figura 9) são responsáveis por 84% das emissões chinesas (IEA, 2023b). “A indústria, sozinha, responde por cerca de 35% das emissões totais do setor de energia do país – e 33% da eletricidade e calor gerados a partir do carvão vão para a atividade industrial” (Liu et al., 2023, tradução própria).
Figura 9 - Evolução das emissões chinesas em uso de energia (2000-2021)
Fonte: IEA (2023b).
Ademais, a China também é a “maior exportadora líquida mundial de carbono incorporado” (Liu et al., 2023, tradução própria). O “carbono incorporado” (do inglês embodied carbon) refere-se à quantidade de GEE emitidos durante o ciclo de vida de um produto – desde a extração de matérias-primas, passando pela produção, comercialização até o seu descarte. De acordo com o levantamento de Hongqiao Liu et al. (2023) para o Carbon Brief, as exportações de carbono incorporado, em seu auge (2007), representaram ¼ das emissões da China, mas, atualmente, a sua participação é de 10% do total dos gases lançados na atmosfera pelo país.
Logo, para se alinhar à agenda climática internacional, a atividade industrial da China precisa passar por um extenso, mas imediato, processo de descarbonização e “esverdear-se”. E é possível perceber que uma ideia de industrialização verde já faz parte dos planos econômicos do país (Liu et al., 2023; Interesse, 2024; Carbon Brief, 2024).
O 14º Plano Quinquenal (2021-2025) da China – que indica o modelo de desenvolvimento econômico e social a ser seguido pelo país entre os anos de 2021 e 2025 – menciona a promoção de um “desenvolvimento verde” e o desejo pela construção de uma civilização ecológica, esta última sendo:
uma visão de futuro verde [...], um paradigma de desenvolvimento que inclui [como fundamentos] justiça, eficiência, harmonia e desenvolvimento cultural, bem como a luta por altos níveis de produção a partir de processos limpos [e] uso sustentável dos recursos (Villa, 2022).
Além disso, o planejamento informado pela Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma (NDRC, National Development and Reform Commission) sobre energia renovável apresenta uma meta de que 33% da produção de energia elétrica seja proveniente de fontes renováveis até 2025 e que 18% venha de energias renováveis não hídricas – eólica, solar, biomassa etc. – (Climate Cooperation China, 2022). Para fins de comparação, em 2020, as fontes renováveis representavam 28,8% do total da produção elétrica na China, sendo 11,4% não hídricas (Climate Cooperation China, 2022).
Em 2024, a NDRC publicou o Catálogo de Indústrias para a Transição Verde e de Baixo Carbono, que fornece as diretrizes para facilitar o investimento chinês em projetos “verdes”, além de incentivar o financiamento ambiental no país. O catálogo traz uma visão do que a nação considera ser uma indústria verde em sete categorias: economia de energia e redução de carbono; proteção ambiental; reciclagem; energia limpa; proteção e restauração ecológica; infraestrutura verde; e serviços verdes (Interesse, 2024).
O Catálogo de Indústrias Verdes, como também é chamado, ainda divide as atividades industriais no país em três categorias: incentivadas, restritas e eliminadas.
A categoria ‘restritas’ refere-se a tecnologias, equipamentos e produtos que, entre outras coisas, ‘não são propícios para o cumprimento das metas de pico de carbono e neutralidade líquida de emissões’ [...]. A categoria ‘eliminadas’ contém tecnologias que ‘desperdiçam seriamente recursos, causam poluição... [ou] impedem a realização das metas de pico de carbono e neutralidade de carbono’ [...]. [O] catálogo também traz um incentivo à ‘inovação em tecnologias verdes e o desenvolvimento da indústria de proteção ambiental verde, promoção da economia de energia [...] e [busca] conter o desenvolvimento desenfreado de projetos de alto consumo energético, grandes emissões’ (Carbon Brief, 2024, tradução própria, grifo próprio).
Todavia, é importante destacar o papel da China no investimento e no desenvolvimento em energias renováveis. Ao mesmo tempo que o país é o maior emissor de GEE, o gigante asiático corresponde a 1/3 dos investimentos em energia limpa no mundo inteiro (IEA, 2024), sendo responsável por 80% do investimento global na fabricação de painéis solares fotovoltaicos (Agência Lusa, 2024). A China também é o país com maior crescimento de capacidade de energia solar e eólica (AFP, 2025), investindo US$ 50 bilhões entre 2011 e 2022 – mais do que o resto do mundo combinado. Além disso, sobre o desenvolvimento de “tecnologias verdes”, o país comanda 68% da produção global de veículos elétricos e 74% da fabricação mundial de baterias de lítio (Zhang; Nedopil, 2024). Assim, a China é um ator crucial para transição energética global e para a industrialização verde em nível mundial.
Desse modo, no que se refere à conceitualização, a noção chinesa de industrialização e indústrias verdes se alinha tanto com o entendimento brasileiro quanto com a definição da UNIDO e da atual agenda climática internacional. Observa-se que Brasil e China compreendem seus projetos de industrialização verde como políticas de crescimento e desenvolvimento econômico. Contudo, enquanto o Brasil apresenta um discurso de reindustrialização “esverdeada” – voltada para a superação do caráter primário de sua economia –, a China, que já possui um setor industrial consolidado com produtos de alto valor agregado e tecnologia de ponta, incluindo forte investimento em tecnologias verdes e de transição energética, ainda enfrenta o desafio de descarbonizar seus processos industriais, dado o caráter altamente poluidor e emissor de GEE desse setor.
Como pôde ser visto na seção anterior, os processos de industrialização verde na China e no Brasil são bem recentes. O Brasil ainda está nos estágios iniciais da construção de uma possível reindustrialização (verde), e a indústria chinesa ainda é altamente emissora de GEE, apesar de também ser uma liderança na produção de energias renováveis e tecnologias verdes. Ademais, a relação comercial entre os dois países segue assimétrica e centralizada em atividades “marrons”, na qual o Brasil exporta commodities e produtos de baixa complexidade, que servirão de matéria-prima para a indústria chinesa, e importa mercadorias chinesas de maior tecnologia e alto valor agregado. Porém, os investimentos verdes da China no Brasil se fazem cada vez mais presentes.
Esta seção terá como enfoque uma análise da presença da industrialização verde nas relações comerciais entre os dois países e suas possíveis implicações. Para isso, será apresentada a atual conjuntura dos investimentos verdes da China no Brasil, além dos anúncios de cooperação entre os dois países voltados para a transição energética e o desenvolvimento de tecnologias verdes. Em seguida, será mobilizada uma reflexão sobre as oportunidades que a China pode ter para influenciar o processo de “neoindustrialização verde” que o Brasil busca promover por meio da NIB.
Conforme apresentado anteriormente, os investimentos chineses no Brasil somaram US$ 1,73 bilhão em 2023. No mesmo ano, foram confirmados 29 projetos chineses no Brasil, e 72% são direcionados a energias verdes e setores relacionados (Cariello, 2024). O Brasil tem sido destino de diversos empreendimentos chineses nessa área, em especial no setor hidrelétrico, mas também de iniciativas mais recentes em energias solar e eólica, baterias elétricas, painéis fotovoltaicos, carros elétricos etc. A Figura 10 apresenta a evolução dos investimentos verdes da China no Brasil entre 2010 e 2023.
Figura 10 - Evolução dos investimentos verdes da China no Brasil (2010-2023)
Fonte: Cariello (2024).
Os novos anúncios de cooperação Brasil-China também são voltados para o desenvolvimento da transição energética e de indústrias verdes entre os países. Por exemplo, na declaração conjunta sobre aprofundamento da parceria estratégica global (2023), os países afirmaram seu comprometimento “com o diálogo bilateral para promover a transição energética e a mitigação das emissões de gases de efeito estufa [...] de forma justa e equitativa” (Brasil, M., 2023), além de destacarem que irão “cooperar em pesquisas para desenvolver tecnologias de descarbonização das matrizes energéticas” (Brasil, M., 2023). A 7ª reunião da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (COSBAN), realizada em 2024 – nos 50 anos das relações Brasil-China –, trouxe importantes acordos relacionados ao processo de industrialização verde que os dois países demonstram querer implementar.
Dentre esses acordos, são destaques o memorando de entendimento sobre a recriação do Fundo de Cooperação Brasil-China para a expansão da capacidade produtiva na área de desenvolvimento sustentável e o acordo de cooperação entre os bancos nacionais de financiamento para a sua operacionalização (Brasil, 2024b; 2024c). As instituições que irão operacionalizar o Fundo são o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o China-LAC Industrial Cooperation Investment Fund (CLAIFUND). O Fundo Brasil-China[1] tem como propósito facilitar o investimento financeiro em 11 setores prioritários, com destaque para energia limpa, transição energética, saneamento e bioeconomia (Brasil, 2024c). Até abril de 2025, o montante para o Fundo reformulado ainda não tinha sido anunciado[2].
O encontro da COSBAN também resultou no acordo de empréstimo de US$ 800 milhões para o BNDES pelo Banco de Desenvolvimento da China (CDB) para projetos “verdes” relacionados às áreas de mudança do clima, desenvolvimento verde e economia verde, mas também para atividades “marrons”, como petróleo e gás (Brasil, 2024d). E a Petrobrás e a Agência de Crédito à Exportação da China (Sinosure) assinaram um memorando de cooperação para “avaliar oportunidades de investimentos e cooperação em iniciativas de baixo carbono e finanças verdes” (Brasil, 2024b, p. 3).
Desse modo, percebe-se como a China possui um importante papel na transição energética brasileira e no fornecimento de tecnologias verdes para o país. Porém, o gigante asiático deixará de ser um fator importante no processo de desindustrialização da economia brasileira para se tornar um grande parceiro no projeto de neoindustrialização do país sul-americano?
Considerando que a China é o principal parceiro comercial do Brasil desde 2009, e não parece que essa posição será alterada tão cedo, é importante refletir sobre como a maior economia da América do Sul poderá mobilizar o gigante asiático em seu atual projeto de neoindustrialização. Isso é especialmente relevante no contexto da transição energética e da industrialização verde. Ademais, é necessário pensar em como a China poderá responder a esse projeto de desenvolvimento industrial nacional do Brasil.
De acordo com o Conselho Empresarial Brasil-China (Cariello, 2024), a conjuntura internacional favorável à transição energética, juntamente com o aumento dos investimentos chineses em energias renováveis e tecnologias verdes, cria uma importante janela de oportunidade para o Brasil. O país possui “diversas vantagens comparativas” (Cariello, 2024, p. 31), que incluem matriz energética renovável que representa 49,1% da oferta nacional de energia; ampla disponibilidade de água doce; reservas de minerais críticos; e localização geográfica distante dos principais conflitos contemporâneos, como a guerra entre Rússia e Ucrânia e os conflitos no Oriente Médio. Dessa forma, o Brasil pode assumir um papel de liderança na transição energética global, desenvolver uma industrialização verde e se beneficiar dos investimentos chineses em setores relacionados à transição, especialmente nas áreas em que já há presença consolidada de empresas chinesas no país.
No entanto, isso depende de como o Brasil se posicionará no mercado global de transição energética e indústrias verdes, além de como buscará mobilizar suas relações comerciais com a China. O país continuará a desempenhar seu papel de exportador de commodities, agora oferecendo matérias-primas para a transição energética, ou realmente investirá no desenvolvimento de sua indústria para a produção de bens “verdes” e de maior valor agregado?
Como exemplos para reflexão, o plano de ação da NIB para 2024-2026 visa “aumentar a competitividade da cadeia produtiva do veículo elétrico no Brasil e inserir o país nas cadeias globais de fornecimento” (Brasil, 2025a, p. 89). Todavia, isso entra em conflito com as relações comerciais entre Brasil e China, uma vez que o Brasil é atualmente o maior importador de veículos elétricos chineses. Somente em abril de 2024, o Brasil importou quase 41 mil veículos elétricos e híbridos da China (Ramos, 2024). Ainda assim, o Brasil já vem implementando medidas para estimular a fabricação local de veículos elétricos, o que pode impactar as exportações chinesas. Mas como o Brasil é o oitavo maior produtor mundial de automóveis, as montadoras chinesas de veículos elétricos podem pensar em produzir esses produtos no Brasil (Nunes; Lopes, 2024).
Outro setor em que a indústria verde brasileira pode se inserir na transição energética global é o de aço. O aço chinês no mercado brasileiro tem impactado negativamente a produção nacional, prejudicando a competitividade da indústria siderúrgica. Como maior fabricante mundial de aço, a China exporta a preços até 19% inferiores ao custo de produção. Além disso, o aço chinês é produzido com altos níveis de emissões de GEE, devido ao uso intensivo de carvão mineral, gerando 2,4 toneladas de GEE (Sobrinho, 2025). Em contrapartida, a produção brasileira é considerada mais “limpa”, pois combina o uso de carvão mineral com carvão vegetal, originado de florestas plantadas, emitindo 1,7 tonelada de GEE. E a produção brasileira de aço a partir da reciclagem da sucata ferrosa emite apenas 0,6 tonelada (Instituto E+, 2025).
Ainda assim, a China desempenhará um papel central na construção da industrialização verde no Brasil. É importante ressaltar a relevância da tecnologia chinesa para a geração de energia renovável no país, uma vez que a China se consolidou como o principal fornecedor mundial de painéis solares, baterias de lítio e outros componentes essenciais para a transição energética. Atualmente, a indústria verde brasileira ainda não possui a capacidade produtiva necessária para atender à crescente demanda por essas tecnologias. Portanto, grande parte do desenvolvimento da indústria verde no Brasil dependerá da importação de mercadorias chinesas, incluindo bens manufaturados e inovações em tecnologias verdes.
Também é importante trazer uma reflexão sobre os possíveis impactos na economia brasileira dos processos mundial e chinês de descarbonizar e tornar “verde” a sua indústria. Não só o Brasil, mas a região da América Latina como um todo apresenta uma “interdependência econômica com a China” (Grinsztejn; Rodriguez; Estill, 2021, p. 4), de modo que o curso dessa industrialização verde terá consequências relevantes para o continente e para o Brasil[3].
No entanto, a geração dessas energias limpas depende de uma ampla variedade e quantidade de minerais, como cobre, lítio e terras raras – dimensão e diversidade maiores do que o uso de minerais para geração de energia fóssil (Figura 11). A transição energética da China, a segunda maior economia do mundo, irá aumentar a demanda por esses minerais, resultando em uma elevação dos preços das commodities e promovendo uma exploração mais intensa e extensa da mineração. Assim, o Brasil, junto com outros países da América Latina, corre o risco de permanecer como uma economia primária, enfraquecendo seu projeto de neoindustrialização, tudo em função dos incentivos financeiros destinados à mineração de elementos usados em tecnologias de energia “limpa”. Dessa forma, a transição energética e a industrialização verde da China podem fortalecer a primarização da economia brasileira, a manutenção de uma atividade altamente poluidora e, ainda, perdurar uma relação de dependência com a potência asiática.
Figura 11 - Minerais utilizados em tecnologias associadas às energias limpas
Fonte: EPE; MME, 2023.
Aqui surge um outro ponto para reflexão: o que as políticas de industrialização verde no Brasil e na China irão fazer para assegurar que não sirvam como maquiagem verde para perpetuar práticas poluidoras e violentas da economia de alto carbono?
Esta seção destacou a importância da relação comercial entre Brasil e China para o processo de industrialização verde no Brasil, especialmente no contexto da transição energética. A China se consolidou como o principal fornecedor mundial de tecnologias para a geração de energia renovável, o que significa que a dependência brasileira em relação à economia chinesa continuará a ser uma característica marcante ao longo da neoindustrialização verde no país. No entanto, o Brasil também possui uma janela de oportunidade para se inserir de forma mais ativa na transição energética global, podendo se tornar um ator relevante nesse mercado. Para isso, é fundamental que o país adote medidas que o posicionem estrategicamente no cenário internacional, evitando a armadilha da primarização econômica, que se limita à oferta de commodities e bens de baixo valor agregado. Além disso, é crucial que os processos de transição energética e desenvolvimento de indústrias verdes, tanto no Brasil quanto na China e no mundo, sejam acompanhados de uma reflexão crítica sobre os impactos socioambientais do extrativismo e da mineração, que podem perpetuar práticas poluidoras e violentas.
Considerações finais
A relação comercial entre o Brasil e a China é caracterizada por uma assimetria significativa, na qual a dependência econômica recai mais fortemente sobre o Brasil, que possui uma economia primária voltada para a exportação de commodities para mercados industrializados – como o chinês. Essa dinâmica traz consigo desafios ambientais e climáticos, dado que as transações comerciais entre os dois países são baseadas principalmente em atividades intensamente emissoras: exploração de combustíveis fósseis, mineração, agropecuária etc. A necessidade de alinhar a relação comercial Brasil-China à agenda global de descarbonização da economia mundial impõe grandes mudanças.
Nesse cenário, surge a industrialização verde como uma proposta internacional para enfrentar a crise climática. O presente artigo buscou destacar como Brasil e China estão incorporando essa iniciativa em suas políticas nacionais. Ambos reconhecem o desenvolvimento da indústria verde e de empreendimentos sustentáveis como um caminho não só para o seu crescimento e desenvolvimento econômico, mas também para atender à demanda global pela descarbonização (Interesse, 2024; Mello, 2024). No entanto, cada nação aborda a industrialização verde a partir de suas particularidades.
Para o Brasil, a transição para uma economia “verde” representa não apenas uma resposta às preocupações climáticas, mas também uma oportunidade de se reindustrializar, diminuir sua dependência da exportação de commodities e reposicionar sua economia no cenário global. O governo brasileiro tem sinalizado essa direção por meio da NIB, uma política de neoindustrialização que tem a indústria verde e a bioindústria dentre os seus pilares centrais (Brasil, 2025a).
Por outro lado, a China é líder no mercado global de energias renováveis, mas ainda assim é um dos maiores emissores de GEE e enfrenta o desafio de descarbonizar sua extensa base industrial. Seu 14º Plano Quinquenal demonstra compromisso com o desenvolvimento verde e busca por uma “civilização ecológica” (Villa, 2022; Liu, 2023). Destaca-se também a criação na China do Catálogo de Indústrias para a Transição Verde e de Baixo Carbono (Interesse, 2024), evidenciando um empenho em transformar suas práticas industriais, de forma a restringir e eliminar atividades poluidoras e incentivar a indústria verde no país.
Apesar de ser um processo ainda recente em ambos os países, a industrialização verde já se faz presente na relação comercial Brasil-China, em especial nos investimentos da China no setor elétrico brasileiro e no fornecimento de materiais e tecnologias de energia renovável (solar, eólica etc.). Novas parcerias também já estão sendo estabelecidas, como o memorando de entendimento para a promoção do Fundo de Cooperação Brasil-China e sua operacionalização, que prioriza setores como energia limpa, transição energética e bioeconomia (Brasil, 2024b; 2024c).
O artigo também buscou refletir sobre os potenciais impactos da industrialização verde nessa relação comercial: a China poderia deixar de ser um fator de desindustrialização na economia brasileira para se tornar uma parceira no projeto de neoindustrialização do país sul-americano? E quais seriam os efeitos do processo de descarbonização e da transição verde da China para economia brasileira? Além disso, é crucial considerar o que as políticas de industrialização verde no Brasil e na China farão para garantir que não se tornem apenas uma fachada – ou maquiagem verde – para perpetuar práticas poluidoras e violentas associadas a uma economia de alto carbono.
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Maria Beatriz Peixoto Mello E-mail: mariabiamello@gmail.com Lattes: http://lattes.cnpq.br/9055321874904366 ORCID: https://orcid.org/0009-0009-9073-8052 |
Revista IDeAS, Rio de Janeiro, volume 19, 1-26, e025011, jan./dez. 2025 • ISSN 1984-9834
[1] O Fundo de Cooperação Brasil-China foi anunciado pela primeira vez em 2015, durante a visita ao Brasil do então primeiro-ministro chinês, Li Keqiang. O instrumento foi formalmente criado em 2017, sendo fruto de um memorando de entendimento entre a Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério de Planejamento e Orçamento do Brasil e o CLAIFUND. Em 2024, o Fundo foi reformulado a partir de um novo memorando de entendimento, dessa vez entre o Ministério da Fazenda do Brasil e a Administração Estatal de Reservas Estrangeiras da China.
[2] Em 2015, foi feita a promessa de que o Fundo Brasil-China contaria com um montante de US$ 20 bilhões, sendo que a China seria responsável por US$ 15 bi e o Brasil pelo restante. Todavia, o Fundo não chegou a ser operacionalizado e capitalizado, por isso a sua reformulação em 2024. A expectativa é de que a nova versão tenha um montante menor, mas ainda assim a tendência é de que seja mantida a proporção de três para um na participação dos países (Ninio, 2024).
[3] É crucial destacar que esse risco não é exclusivo da transição energética e da industrialização verde chinesas, mas é uma preocupação inerente aos processos de transição verde como um todo. A mineração, necessária para obter os minerais essenciais para essa transição, é uma atividade historicamente associada a exploração, conflitos e violência – realidades bem conhecidas no Brasil e na América Latina (Acosta, 2016). A questão que se coloca é como tornar “verde” uma atividade que muitas vezes é “marrom” devido a seus impactos ambientais e até “vermelha” devido à violência que gera nos territórios por onde passa. Processos em nome do “verde”, como a industrialização verde e a transição energética, têm o potencial de repetir padrões violentos típicos da economia “marrom” (Moreno, 2016) – seja na China, no Brasil ou em qualquer outro país.